Contrato de namoro pode servir a casais que coabitam durante a quarentena;

Contrato de namoro pode servir a casais que coabitam durante a quarentena;

Contrato de namoro pode servir a casais que coabitam durante a quarentena;

Desde o início da pandemia do Coronavírus, muitos casais resolveram cumprir juntos a quarentena. A vivência na mesma casa, ainda que momentaneamente, embaralhou o entendimento de muitos sobre namoro e união estável, bem como a diferenciação entre essas duas condições. Para dirimir tais dúvidas, ganhou enfoque o contrato de namoro, apontado por alguns como uma saída eficaz para deixar claro a intenção das partes nesta forma de relacionamento.

A advogada, mediadora e professora Marília Pedroso Xavier, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, autora do livro “Contratos de Namoro – Amor Líquido e Direito de Família Mínimo”, identifica que, em razão da recente coabitação adotada pelos casais, bem como pela intensificação da convivência, é fundamental que os pares tenham clareza sobre qual o seu tipo de relacionamento.

“Trata-se de um namoro ou de uma verdadeira família, consubstanciada na união estável? A dúvida poderá ocorrer em razão da atual dicção do artigo 1.723, do Código Civil – CC. Segundo o dispositivo, a união estável é caracterizada como uma união pública, contínua e duradoura, com o objetivo de constituir família”, destaca Marília.

A especialista observa que, na contemporaneidade, muitos namoros podem ser entendidos como relacionamentos públicos, contínuos e duradouros. “Porém, o traço distintivo em relação a união estável será a ausência naquele momento da intenção de constituir família. Por isso, é necessário deixar bem delineados os contornos desse elemento subjetivo”, frisa.

“Afinal, se ocorrer o óbito de um dos componentes do casal (ou até mesmo ambos), poderá haver dúvida sobre isso e o provável início de demandas judiciais para discutirem efeitos patrimoniais daquele relacionamento. Normalmente, esses litígios são épicos e, lamentavelmente, é feita uma verdadeira devassa em toda a intimidade do casal para analisar se havia ou não o objetivo de constituir família. Penso que uma estratégia jurídica preventiva pode ser muito mais adequada e proveitosa para todos”, defende Marília.

Eficácia e segurança jurídica dos contratos de namoro

“O contrato de namoro pode ser entabulado pelas partes justamente para aclarar que, apesar do casal viver um relacionamento público, contínuo e duradouro, não reconhecem ali a existência de uma família, de uma união estável. Felizmente, o Poder Judiciário brasileiro tem reconhecido que namoros longos, assim chamado ‘namoros qualificados’, não se confundem com união estável”, explica Marília Xavier.

Ela aponta que esses documentos poderão servir de prova sobre o elemento anímico de cada uma das partes e os rumos patrimoniais escolhidos por elas. “A advocacia revela que, quando o assunto não é enfrentado de forma madura e transparente, surge essa dúvida ao final do relacionamento. Por vezes, essa dúvida é legítima; por outras, as partes se dão conta que valerá a pena aforar uma demanda e, na pior das hipóteses, pactuar um acordo para que a demanda chegue ao fim – ante a lentidão do Judiciário.”

A especialista frisa que o documento deve ser redigido com fidelidade absoluta ao que efetivamente é vivido pelas partes, afinal, não pode se prestar para objetivos escusos e fraudulentos. “Não existe forma especial para sua pactuação, mas sugerimos que seja sempre redigido por um advogado familiarista que possa bem clausular os termos do relacionamento, trazendo segurança para as partes. Também a forma pública pode gerar mais segurança, pois permite a extração futura de cópias e também atesta a veracidade das firmas ali contidas”, destaca Marília.

Tabu sobre contratos de namoro é semelhante ao da esfera sucessória

A advogada observa que existe resistência por parte de namorados em aderir a esses contratos, geralmente por medo de sinalizar desconfiança em relação ao par. “Falar sobre dinheiro e sobre bens, infelizmente, ainda é um grande tabu no nosso país. Isso pode ser visto não só nos relacionamentos amorosos, mas também quando estamos na esfera sucessória. Basta lembrar do quanto as pessoas têm melindres para falar sobre testamentos com seus familiares.”

“Penso que essa resistência precisa ser superada. Sou uma grande entusiasta de que a sociedade brasileira desperte para a necessidade de realizar planejamentos patrimoniais e sucessórios. Tudo de forma idônea, transparente e em observância a autonomia privada das partes”, defende Marília.

Ela salienta que o contrato de namoro não é feito por desconfiança. “Ao contrário, as partes conscientemente manifestam aquilo que intencionam no campo do amor, do afeto e de potenciais efeitos jurídicos que julgam (in)desejados. Se isso for mal recebido por uma das partes do casal e acarretar no fim do relacionamento, penso que apenas significará que ambos não estavam alinhados e que a questão já era ‘crônica de uma morte anunciada’”, conclui a advogada.

Convivência com expectativa de formar família no futuro não configura união estável.

Para que um relacionamento amoroso se caracterize como união estável, não basta ser duradouro e público, ainda que o casal venha, circunstancialmente, a habitar a mesma residência; é fundamental, para essa caracterização, que haja um elemento subjetivo: a vontade ou o compromisso pessoal e mútuo de constituir família. Seguindo esse entendimento exposto pelo relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de um homem que sustentava ter sido namoro – e não união estável – o período de mais de dois anos de relacionamento que antecedeu o casamento entre ele e a ex-mulher. Ela reivindicava a metade de apartamento adquirido pelo então namorado antes de se casarem. Depois de perder em primeira instância, o ex-marido interpôs recurso de apelação, que foi acolhido por maioria no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Como o julgamento da apelação não foi unânime, a ex-mulher interpôs embargos infringentes e obteve direito a um terço do apartamento, em vez da metade, como queria. Inconformado, o homem recorreu ao STJ.

No exterior

Quando namoravam, ele aceitou oferta de trabalho e mudou-se para o exterior. Meses depois, em janeiro de 2004, tendo concluído curso superior e desejando estudar língua inglesa, a namorada o seguiu e foi morar com ele no mesmo imóvel. Ela acabou permanecendo mais tempo do que o previsto no exterior, pois também cursou mestrado na sua área de atuação profissional. Em outubro de 2004, ainda no exterior – onde permaneceram até agosto do ano seguinte –, ficaram noivos. Ele comprou, com dinheiro próprio, um apartamento no Brasil, para servir de residência a ambos. Em setembro de 2006, casaram-se em comunhão parcial – regime em que somente há partilha dos bens adquiridos por esforço comum e durante o matrimônio. Dois anos mais tarde, veio o divórcio. A mulher, alegando que o período entre sua ida para o exterior, em janeiro de 2004, e o casamento, em setembro de 2006, foi de união estável, e não apenas de namoro, requereu na Justiça, além do reconhecimento daquela união, a divisão do apartamento adquirido pelo então namorado, tendo saído vitoriosa em primeira instância. Queria, ainda, que o réu pagasse aluguel pelo uso exclusivo do imóvel desde o divórcio – o que foi julgado improcedente.

Núcleo familiar

Ao contrário da corte estadual, o ministro Bellizze concluiu que não houve união estável, “mas sim namoro qualificado, em que, em virtude do estreitamento do relacionamento, projetaram, para o futuro – e não para o presente –, o propósito de constituir entidade familiar”. De acordo com o ministro, a formação do núcleo familiar – em que há o “compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material” – tem de ser concretizada, não somente planejada, para que se configure a união estável. “Tampouco a coabitação evidencia a constituição de união estável, visto que as partes, por contingências e interesses particulares (ele, a trabalho; ela, por estudo), foram, em momentos distintos, para o exterior e, como namorados que eram, não hesitaram em residir conjuntamente”, afirmou o ministro no voto. Por fim, o relator considerou que, caso os dois entendessem ter vivido em união estável naquele período anterior, teriam escolhido outro regime de casamento, que abarcasse o único imóvel de que o casal dispunha, ou mesmo convertido em casamento a alegada união estável. O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

10 coisas que você precisa saber sobre contrato de namoro

Para um casal que coabita e pretende exteriorizar o compromisso existente, sem declarar união estável, o contrato de namoro pode ser a alternativa ideal. O contrato representa a manifestação de vontade das partes expressa em um documento que reúne requisitos e cláusulas de cunho obrigatório. Apesar de não ser um entendimento pacífico na doutrina, os casais vêm optando pelo contrato de namoro, principalmente, desde o início da pandemia de Covid-19, quando muitos namorados resolveram passar o isolamento social juntos.

A seguir, o Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM resume em 10 tópicos tudo que você precisa saber sobre contrato de namoro:

1) Não é obrigatório; depende da vontade de ambos

O contrato de namoro somente deve ser realizado caso seja de interesse do casal e ambos estejam de comum acordo com as cláusulas estipuladas.

2) O casal pode estipular cláusulas

Desde que, de comum acordo, o casal pode criar cláusulas específicas, como a posse do animal em caso de término no caso de famílias multiespécies, por exemplo.

3) É uma forma de proteção patrimonial

O contrato de namoro é uma prova jurídica de que a relação entre duas pessoas não se trata de uma união estável, e, portanto, afasta efeitos jurídicos como partilha de bens, fixação de alimentos ou até mesmo direitos sucessórios.

4) Não há distinções entre casais heteroafetivo e homoafetivos

Casais homossexuais e heterossexuais podem aderir ao contrato, desde que estejam em conformidade com as cláusulas acordadas.

5) Não é feito por desconfiança

É uma saída eficaz para esclarecer e comprovar a intenção alinhada das partes nesta forma de relacionamento.

6) Pode servir a casais que coabitam durante a quarentena

A recente coabitação adotada pelos casais em razão do isolamento social como medida de combate ao coronavírus impulsionou a busca pelo contrato de namoro para diferenciar a relação de uma união estável.

7) Comprova a inexistência do affectio maritalis, ou seja, da vontade de se constituir uma família. Afinal, caso haja interesse na constituição de família não se encaixaria em um contrato de namoro.

8) Pode ser invalidado

Caso haja evidências que comprovem a união estável, o contrato se torna inválido e não produz mais os efeitos jurídicos desejados.

9) Não existe forma especial para sua pactuação

Mas um advogado familiarista pode clausular os termos do relacionamento, trazer segurança para as partes e atestar a veracidade das firmas ali contidas.

10) Não é vitalício

O contrato deve conter prazo de validade, mas pode ser renovado caso o casal queira, e ainda esteja em conformidade com as cláusulas.

Fonte: IBDFAM

Guaxupé, 01/07/24.

Milton Biagioni Furquim

Milton Furquim
Enviado por Milton Furquim em 02/07/2024
Código do texto: T8098245
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