O valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária
O valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária
O valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária
O que é o Simples Nacional?
O Simples Nacional é um regime unificado de arrecadação, cobrança e fiscalização de tributos, aplicável às microempresas e empresas de pequeno porte, estando previsto na Lei Complementar nº 123/2006.
A empresa que aderir ao Simples desfruta da vantagem de recolher quase todos os tributos (federais, estaduais e municipais) mediante um único pagamento, calculado sobre um percentual de sua receita bruta.
O objetivo do Simples é fazer com que as microempresas e empresas de pequeno porte tenham um regime jurídico simplificado e favorecido, com menos burocracia e menor carga tributária.
O tratamento diferenciado para microempresas e empresas de pequeno porte é um mandamento constitucional, previsto no art. 146, III, “d”, art. 170, IX e art. 179, da CF/88.
A inclusão do contribuinte na sistemática do Simples Nacional exige o preenchimento de determinadas condições listadas no art. 17 da LC 123/2006.
Qual é a base de cálculo do Simples?
O Simples Nacional é calculado com base na receita bruta da empresa. Aplica-se determinada alíquota (ex: 7,30%) sobre a receita bruta da empresa.
O percentual da alíquota aplicável dependerá do setor econômico e da faixa de receita bruta.
Imagine agora a seguinte situação hipotética:
Alfa Pizzaria Ltda é uma empresa de pequeno porte optante do Simples Nacional. Quando os clientes fazem refeição na pizzaria, eles normalmente pagam a gorjeta de 10% sobre o valor total dos produtos consumidos no estabelecimento. A gorjeta também é chamada de taxa de serviço e encontra-se disciplinada no art. 457, § 3º, da CLT: Art. 457 (...) § 3º Considera-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também o valor cobrado pela empresa, como serviço ou adicional, a qualquer título, e destinado à distribuição aos empregados. (Redação dada pela Lei nº 13.419, de 2017)
A pizzaria contabiliza as gorjetas pagas e, no final do mês, redireciona a quantia aos seus empregados.
Suponhamos que os valores pagos pelos clientes para a pizzaria totalizaram o montante fictício de 100. Ocorre que desses 100, 10 foram apenas gorjetas. Isso significa que a pizzaria ficará com 90 e repassará 10 diretamente para os funcionários.
Indaga-se: quando a pizzaria for recolher o Simples, deverá pagar a alíquota sobre 100 ou sobre 90? Para o STJ, as gorjetas integram a base de cálculo do Simples Nacional?
NÃO. De acordo com o art. 18, § 3º, da LC 123/2006, a tributação unificada “Simples Nacional” tem como base de cálculo a receita bruta da microempresa ou empresa de pequeno porte optante (“Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário”).
Já o art. 3º, § 1º, dessa norma traz o conceito de receita bruta e dispõe que se considera “receita bruta, para fins do disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos”.
‘O STJ adotou o entendimento de que o valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária. Nesse sentido: A interpretação do art. 457, § 3º, da CLT nos faz concluir que a gorjeta, compulsória ou inserida na nota de serviço, tem natureza salarial, compondo a remuneração do empregado. Assim, não se trata de renda, lucro ou receita bruta/faturamento da empresa. As gorjetas representam apenas ingresso de caixa ou trânsito contábil a ser repassado ao empregado, não implicando incremento no patrimônio da empresa, razão pela qual deve sofrer a aplicação apenas de tributos e contribuições que incidem sobre o salário.
Por esses motivos, afigura-se ilegítima a exigência do recolhimento do PIS, COFINS, IRPJ e CSLL sobre a referida taxa de serviço. Do mesmo modo e pelas mesmas razões, não há que se falar em inclusão das gorjetas na base de cálculo do regime fiscal denominado “Simples Nacional”, que incide sobre a receita bruta na forma do art. 18, § 3º, da LC 123/2006.
STJ. 2ª Turma. AREsp 2.381.899-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17/10/2023 (Info 794).
Dessa forma, considerando o conceito de receita bruta explicitado na LC 123/2006, não se vislumbra nenhuma possibilidade de considerar a gorjeta como produto de venda, preço de serviço prestado ou resultado nas operações em conta alheia, pois, de acordo com o entendimento do STJ, a gorjeta tem natureza salarial, ou seja, compõe o salário do empregado. Assim, a referida verba não deve integrar a receita bruta para fins de cálculo do Simples Nacional.
Em suma: O valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária.
STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 1.846.725-PI, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 8/4/2024 (Info 811).
Guaxuoé, 18/06/24.
Milton Biagioni Furquim