Justiça gaúcha, recentemente, autoriza um homem e duas mulheres em uma relação conjugal, o chamado trisal.
Justiça gaúcha, recentemente, autoriza um homem e duas mulheres em uma relação conjugal, o chamado trisal.
Pois então! Em 08/01/2020, publiquei o texto ‘Justiça brasileira autoriza casamento de homem com duas mulheres’, fato ocorrido no Rio de Janeiro.
De lá prá cá, vários outros casos aconteceram com o beneplácido da Justiça brasileira.
Fato mais recente, ocorrido em Novo Hambrurgo RS, o Juiz reconheceu a união estável entre um homem e duas mulheres e, em consequência autorizou que conste os nomes dos três no registro de nascimento de criança.
O juiz da 2ª Vara de Família e Sucessões de Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, Gustavo Borsa Antonello, reconheceu a união estável poliafetiva de um homem e duas mulheres entendendo que, mesmo não sendo uma família composta nos modelos tradicionais, “não deve ficar à mercê da proteção do Estado”. Uma das mulheres está grávida e foi concedido que conste o nome dos três no registro de nascimento da criança.
Legislação: De proêmio, importante lembrarmos que o ordenamento jurídico pátrio, especialmente o § 3º, do artigo 226, da Carta Magna de 1988, a Lei nº 9, 278/ 1996 e o artigo 1.723 do CC, que regulamentam o instituto da união estável, não previram a monogamia como um dos seus requisitos caracterizadores, como ocorre no casamento (STJ, REsp 1916031/ MG).
No caso em questão, o trisal é formado por um homem de 45 anos e duas mulheres, uma de 51 e outra de 32. O homem e a mulher de 51 firmaram casamento em 2006 e iniciaram o relacionamento com a de 32 em 2013.
A busca pela oficialização foi motivada pela espera do primeiro filho do trisal, cujo nascimento está previsto para outubro
“O que se reconhece aqui é uma única união amorosa entre três pessoas, um homem e duas mulheres, revestidas de publicidade, continuidade, afetividade e com o objetivo de constituir uma família e de se buscar a felicidade”, afirmou o magistrado.
Restando comprovada a "affectio maritalis", decorrente da existência de convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com objetivo de constituir família, exigida pelo artigo 1.723, do Código Civil, para caracterizar a união estável.
Na ação, a família poliafetiva narrou que buscava a declaração judicial de união estável desde 2013. A sentença, proferida no fim do mês passado, considerou que a relação afetiva dos três autores é permeada pela afetividade, contínua e duradoura, sendo notoriamente reconhecida por amigos e familiares, incluindo postagens em redes sociais. Para garantir a tutela de união estável, dois autores que eram casados requereram a dissolução do casamento, por meio de divórcio, para imediato reconhecimento, por sentença, da relação poliamorosa entre os três envolvidos.
Ao proferir a decisão, o juiz determinou que fica reconhecida a união poliafetiva, a contar de 1º de outubro de 2013, entre os autores do processo. Após transitada em julgado a decisão, será expedido mandado ao Registro Civil de Pessoas Naturais para a averbação da sentença de divórcio e também do reconhecimento da união poliamorosa. Foi determinado, após nascimento do filho, que no registro deverá constar o nome das duas mães e do pai, além dos ascendentes, valendo como documento hábil ao exercício de direito.
O interessante é que o casal se divorciou para se verem livres e, com isto, poder pleitear o reconhecimento da união estável entre os três.
No texto da decisão, o juiz Gustavo Borsa Antonello cita além de diversas decisões judiciais sobre os modelos de família, a música de LuLu Santos Tempos Modernos, a partir da estrofe “Eu quero crer no amor numa boa e que isso valha pra qualquer pessoa…”.
“Inequívoco que a afetividade permeia a relação jurídica constituída entre os autores, como também pode ser percebido nos relatos em juízo dos três requerentes, chamando a atenção a serenidade, a emoção e o entusiasmo ao se referirem à gestação e à chegada do filho”, afirmou o magistrado. O processo tramita em segredo de Justiça.
Registro do bebê: multiparentalidade
Além disso, o bebê que uma das mulheres está gestando terá direito ao registro multiparental, ou seja, vai poder ter os nomes das duas mães e do pai no registro civil.
As mães e o pai, por sua vez, terão direito à licença-maternidade e paternidade.
“Verdadeiro negacionismo jurídico”, reflete especialista
Para Marcos Alves da Silva, vice-presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da Família do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a sentença que reconheceu a união estável do trisal mostra que “as famílias brasileiras, em suas múltiplas configurações concretas, não podem ser invisibilizadas pelo Direito”, ainda que a orientação atual do Conselho Nacional de Justiça – CNJ seja no sentido de não oficializar uniões poliafetivas.
A decisão da Segunda Vara de Família e Sucessões da Comarca de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, reconhecendo a união estável poliafetiva de um trisal é um exemplo de como o Direito de Família está evoluindo para reconhecer e proteger as diversas configurações familiares que existem na sociedade atual. Essa decisão tem implicações significativas tanto do ponto de vista jurídico quanto social
1-Registro do bebê: multiparentalidade
Além disso, o bebê que uma das mulheres está gestando terá direito ao registro multiparental, ou seja, vai poder ter os nomes das duas mães e do pai no registro civil.
As mães e o pai, por sua vez, terão direito à licença-maternidade e paternidade.
A decisão da Comarca de Novo Hamburgo é de 1º grau e cabe recurso por parte do Ministério Público – MP. O prazo para o órgão se manifestar é de 30 dias.
2- O Ministério Público (MP) atuou como fiscal da ordem jurídica no processo (art. 179 do CPC) e deu parecer favorável à decisão.
3- CNJ: Cumpre frisar que, para o reconhecimento de uma união poliafetiva, é necessário entrar com uma ação judicial, não podendo ser feita diretamente em cartório, tendo em vista decisao de 2.018 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ, Processo: 0001459-08.2016.2.00.0000, Rel. João Otávio de Noronha, 48ª Sessão Extraordinária, j. 26/06/2018), data em que já havia sido lavradas pelo menos oito escrituras de união estável desse tipo.
4-Nossa opinião
A decisão da Segunda Vara de Família e Sucessões da Comarca de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, reconhecendo a união estável poliafetiva de um trisal é um exemplo de como o Direito de Família está evoluindo para reconhecer e proteger as diversas configurações familiares que existem na sociedade atual. Essa decisão tem implicações significativas tanto do ponto de vista jurídico quanto social.
Algumas considerações sobre essa decisão e suas implicações incluem:
Reconhecimento da diversidade familiar: A decisão demonstra uma abordagem progressista ao reconhecer que as famílias não se encaixam necessariamente em modelos tradicionais. Ela reconhece que as configurações familiares podem ser diversas e que o Direito deve refletir essa realidade.
Desafios legais: O caso também destaca os desafios legais enfrentados por famílias não convencionais. O fato de que o trisal teve que se divorciar para formalizar sua união estável é uma ilustração dos obstáculos enfrentados por essas famílias para obter reconhecimento legal.
Direitos do filho: A decisão também aborda os direitos do filho do trisal, garantindo o registro multiparental, que permitirá que a criança tenha os nomes das duas mães e do pai em seu registro civil. Isso reflete a preocupação com o bem-estar da criança e seu direito a uma identidade legal completa.
Princípios constitucionais: É de suma importância os princípios constitucionais da pluralidade das entidades familiares e da laicidade do Estado. Esses princípios apoiam a ideia de que o Direito de Família deve ser inclusivo e respeitar as diferentes formas de organização familiar.
Combate ao preconceito: Reconhecer legalmente famílias não convencionais é importante para combater o preconceito e a discriminação que essas famílias muitas vezes enfrentam na sociedade. O reconhecimento jurídico pode ajudar a eliminar barreiras e estigmatizações.
Evolução do Direito de Família: Casos como esse demonstram como o Direito de Família está evoluindo para se adaptar às mudanças sociais e culturais. As decisões judiciais desempenham um papel importante nesse processo, moldando o quadro legal que regula as relações familiares.
Guaxupé, 30/05/24.
Milton Biagioni Furquim