A sansão da lei Sansão - republicação
A SANÇÃO DA LEI SANSÃO. (Lei nº 14.064/20)
Foi publicada a Lei 14.064/20, que aumenta a pena daqueles que maltratam ou que praticam abusos contra cães e gatos. Vejamos a novel lei: “LEI Nº 14.064, DE 29 DE SETEMBRO DE 2020. Altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, para aumentar as penas cominadas ao crime de maus-tratos aos animais quando se tratar de cão ou gato. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º Esta Lei altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, para aumentar as penas cominadas ao crime de maus-tratos aos animais quando se tratar de cão ou gato. Art. 2º O art. 32 da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar acrescido do seguinte § 1º-A: “Art. 32. (...) § 1º-A Quando se tratar de cão ou gato, a pena para as condutas descritas no caput deste artigo será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda. (...). Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 29 de setembro de 2020; 199 o da Independência e 132 o da República. JAIR MESSIAS BOLSONARO”
A Lei Federal nº 14.064/2020 (Lei Sansão) sancionada e publicada trouxe uma novidade que impactou positivamente o art. 32, da Lei nº 9.605/1998 (Lei do Meio Ambiente), ou lei dos crimes ambientais, como também é conhecida, que agora passa incluir um capítulo sobre cães e gatos, – ainda que remanesça margens para as críticas de alguns pontos, como sói acontecer com quase todas leis promulgadas, por certo veremos logo adiante.
Antes de tudo é importante destacar que ao contrário do que muita gente pensa, o Brasil não possui uma legislação específica de maus tratos. Estas situações são tratadas pela Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605), uma legislação de 1998, que trazia em seu Art. 32 a previsão de pena de 3 meses a 1 ano para este delito. O que a nova legislação faz é aumentar essa pena anterior para casos de maus tratos contra cães e gatos. Agora a pena para esses crimes passa a ser de 2 a 5 anos.
Deste modo, o art. 32, da Lei nº 9.605/1998 (Lei do Meio Ambiente) passou a vigorar da seguinte forma: “Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. § 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. § 1º-A Quando se tratar de cão ou gato, a pena para as condutas descritas no caput deste artigo será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda. (Incluído pela Lei nº 14.064, de 2020) § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.
Essa Lei foi batizada de Lei Sansão, por causa do cachorro pitbull Sansão, de 2 anos, teve as duas patas traseiras decepadas no bairro Capim Seco, em Confins, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
A título de exemplo, pode ser considerado maus tratos a animais as seguintes situações: a) manter os pets em lugares anti-higiênicos ou em locais que impeçam sua respiração, movimento ou descanso; b) deixar o cão ou gato exposto ao sol por longos períodos de tempo, ou, ao contrário, sem qualquer tipo de iluminação; c) obrigar o pet a trabalhos excessivos, inclusive em competições que possam causar pânico, estresse ou esforço acentuado; d) golpear, mutilar ou ferir voluntariamente qualquer órgão do pet (com exceção do procedimento de castração); e) não providenciar assistência veterinária em casos de acidentes ou de doença; d) não garantir alimento e água para o pet; e) abandono de cães e gatos.
Trata-se de um tipo aberto. O tipo penal é fechado quando descreve por completo a conduta criminosa, sem a necessidade de que o intérprete busque elementos externos para encontrar seu efetivo sentido. O tipo penal aberto, por outro lado, é incompleto, demandando do intérprete um esforço complementar para situar o seu alcance.
A alteração aumentou a pena para maus tratos a esses animais (cão e gato), cuja pena vai de 2 a 5 anos de reclusão, multa e perda da guarda do animal. Certamente que foi um passo importante, pois uma sociedade evoluída deve cuidar bem de seus animais. É claro que a Lei não resolve os problemas, mas de qualquer forma vai levando consciência à conjuntura social que se deve tratar bem os animais.
A Lei nº 14.064/20, foi um grande passo na causa nobre de proteção animal, de modo que ela prevê uma punição maior para aquele sujeito que vier a praticar maus-tratos, caracterizado pela privação de alimentos e cuidados, bem como, castigos imoderados, contra cachorros e gatos.
Ora, antes da Lei Sansão, a pena prevista era apenas de detenção de três meses a um ano, sendo que na prática o autor do crime, apenas assinaria um Termo de Comparecimento e seria liberado da Delegacia, tendo em rogo que, o procedimento pertinente era o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), enquadrando-se no Juizado Especial Criminal (JESCrim), pois a pena era inferior a 02 anos.
Agora a pena incluída pela na novel Lei Sansão é de reclusão, de dois a cinco anos, além de multa e a proibição da guarda, trazendo assim maior segurança ao animal, bem como, uma punição mais severa e condizente com a conduta praticada. Ademais, nem a Autoridade Policial, o Delegado de Polícia, poderá arbitrar fiança, apenas o Magistrado possui capacidade para tal. Na prática, a lei faz com que o crime contra cães e gatos, especificamente, deixe de ser considerado de menor potencial ofensivo. Crimes com penas de até dois anos têm a condenação normalmente convertida em pena alternativa - como prestação de serviço -, e o agressor não fica preso.
Inegavelmente a Lei é uma vitória para a causa de proteção animal, mas ainda temos um longo caminho a percorrer para a proteção de animais, sejam eles domésticos, silvestres ou utilizados para entretenimento.
Para que haja punição, é fundamental que crimes contra animais sejam denunciados. As autoridades devem ser informadas sobre o caso para que ocorra a investigação. É importante que o denunciante consiga o máximo de informações possíveis para que a polícia chegue ao agressor. O boletim de ocorrência pode ser registrado nas delegacias. Casos mais graves e urgentes, como flagrantes de agressões, devem ser comunicados à Polícia Militar.
Para denunciar quem pratica maus tratos a animais de estimação, sempre produza provas, tire fotos, faça vídeos, chame alguém para presenciar e servir de testemunha, pois alegação sem prova, não surte efeito. De posse dessas provas entregue ao Conselho Regional de Medicina Veterinária: válidas somente para casos de maus-tratos cometidos por profissionais da área. As denúncias podem ser feitas pelos canais de atendimento de cada órgão regional.
O autor dos maus-tratos, com a Lei Sansão, passará a ser investigado e não mais liberado após assinatura de termo circunstanciado, como era o padrão antes da alteração. Além disso, o transgressor passa a ter o crime incluído em sua ficha policial. No entanto, enquanto para alguns a aprovação da norma representa uma efetiva vitória a favor dos animais no Brasil, para outros, se trata de uma mudança “discrepante e desproporcional” que deve beneficiar um tipo específico de animal quanto deixa casos semelhantes de maus-tratos (ou até piores) à margem do interesse público.
Os que criticam a aprovação da Lei Sansão, embora até possa elogiar parcialmente a aprovação da lei um avanço na questão de proteção aos direitos dos animais, no entanto tecem críticas ao falhar e deixar de fora animais não domesticados que, “não tem protetores”.
Conforme o artigo 29 da Lei de Crimes Ambientais, aquele que “matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida” pode pegar punição de 6 meses a 1 ano de reclusão, aumentada até o triplo, se o crime decorrer do exercício de caça profissional. Assim haveria discrepância dessa pena para a definida recentemente, de até 5 anos, para quem maltratar cães e gatos. Aduzem, ainda que além da caça predatória, há problemas envolvendo animais silvestres de igual gravidade em relação a maus-tratos a cães e gatos. Desta feita a Lei deixa os animais silvestres de fora e esses animais são os animais que não têm protetores. Atropelamento, por exemplo, é o que mais mata animais no Brasil. A minha crítica, e talvez nem seja crítica, é mais uma observação.
Veja a distorção existente, quando se analisa esses incêndios ocorrentes a pena é de 4 anos. Nós poderíamos fazer uma revisão, então, da lei de crimes ambientais. É uma discussão muito grande, tem um apelo da mídia mas o justo parece que não está sendo feito.
Outros pontos da Lei Sansão que deveriam ter sido melhor pensados é a restrição da guarda de animais prevista na lei que não esclarece as espécies e o tempo de proibição. A questão leva ainda a outro problema que é um dos maiores: a falta de abrigos para os animais que forem tirados dos donos autores de maus-tratos. E neste caso a quem responsabilizar para a custódia desse animal ferido, debilitado?
Tenho que é inútil a aprovação de mais leis sem que elas sejam acompanhadas do principal fator de proteção aos animais: a conscientização. Leis não resolvem o problema. Leis, para serem eficazes, precisam ter a consciência cívica da população. Pensa-se que criou uma lei e agora resolve o problema, mas sabemos que não é assim.
Fácil perceber que há uma desproporção da pena determinada, dessa vez, em relação a crimes cometidos contra pessoas. O parágrafo 1-A do artigo 32 da Lei. 9.605 existiu mais para aquele tipo de violência que, muitas das vezes, se vê contra cães e gatos e que normalmente não acontece contra outros animais. Porém, quando pesada na balança junto com penas previstas atualmente para crimes como agressão a um indivíduo, a punição possível de 5 anos de reclusão é discrepante.
O artigo 129 o Código Penal trata da lesão corporal contra humanos. O caput do artigo diz que a pena é de três meses a um ano, se você lesionar alguém. Se for de natureza grave, o parágrafo primeiro diz que é reclusão é de um a cinco anos. Se você bater num cão ou gato, é de dois a cinco anos, não que seja injusta a pena para maus-tratos contra cães e gatos, mas que, “além dela, é preciso reformar todo o Código Penal para que vejamos punição para quem comete todos os tipos de crime.
Vejamos mais um exemplo discrepante: o crime de abandono de incapaz que, mesmo assim, possui pena de reclusão prevista inferior a de maus-tratos contra caninos e felinos. “O crime de abandono de incapaz como crianças, idosos e indivíduos com deficiência está no artigo 133 do Código Penal. A pena é detenção de seis meses a três anos. Olha a discrepância disso. O aumento de pena sancionado pelo presidente da República veio para agregar, melhorar, ao colocar esse parágrafo 1-A. Todavia, além dessa nova norma “muito ainda tem que ser feito”. Tem que fazer uma reforma mais ampla na legislação penal para que as penas dos demais crimes sejam devidamente atualizadas, para diminuir essa impunidade que, infelizmente, nós vemos por aí.
A bem da verdade, a solução para o problema de maus-tratos de animais está na conscientização e na criação de órgãos para a fiscalização do cumprimento das leis que os protegem. Precisamos de uma educação social, para esclarecer para a população que animais não são coisas, são vidas, e elas merecem respeito. Deveria ter uma delegacia especializada em crimes contra animais domésticos, para que os defensores tivessem um apoio efetivo legal de fiscalização à sua disposição
Ainda para os críticos desta lei, pode-se afirmar que a Lei 14.064/20 soluciona parcialmente uma insuficiência protetiva que existia com relação aos maus – tratos a animais, devido à previsão de penas extremamente leves. Não obstante, o avanço é limitado porque reduz o alcance da norma apenas ao que se poderia chamar de uma “casta privilegiada” de animais, quais sejam, os cães e os gatos, embora, particularmente, assim não entendo. A revisão dessa limitação se apresenta como necessária a bem da igualdade e da satisfação, em sua inteireza, da eliminação da insuficiência protetiva que anteriormente imperava de forma absoluta, mas que agora ainda subsiste em parte. Essa subsistência viola a Constituição em seus aspectos de Justiça, Proporcionalidade, Razoabilidade e Igualdade ou Isonomia.
Importante frisar que há se destacar a possibilidade da prisão em flagrante dos infratores. Inicialmente, como a pena máxima prevista era de 1 ano, as partes eram tão somente encaminhadas para a Delegacia onde se realizava a elaboração do chamado Termo Circunstanciado de Infração Penal. Por isso, muitas vezes o criminoso saía pela porta da frente, ainda antes de quem fazia a Denúncia. Com o patamar da pena elevado o criminoso surpreendido em flagrante deve ser preso, só sendo liberado mediante pagamento de fiança.
Altera-se também a competência para processamento e julgamento do crime. Anteriormente, por ser crime de menor potencial ofensivo, o delito era julgado pelo Juizado Especial Criminal, agora passa a ser julgado pelos Juízos Criminais, onde o Autor responderá uma ação penal, com maior formalidade e rigor. Essa alteração de Competência leva a proibição do chamado “Sursis Processual”. O sursis é um mecanismo previsto para delitos com pena mínima de até um ano, no qual o infrator pode se ver livre de um processo criminal desde que cumpra certas exigências. Então agora tal mecanismo não pode mais ser utilizado. Quem comete maus tratos responde penalmente.
A alteração na pena também implica na possibilidade de cumprimento de pena em regime fechado para reincidentes. Além disso, agora é possível a aplicação de Multa cumulada com as demais punições e a proibição de que condenado volte a ter animais de estimação domésticos. Porém, é necessário destacar que mesmo com os avanços da lei é precioso que as acusações sejam provadas.
Por mais que se procure algum fundamento para tratar diversamente cães e gatos, os únicos motivos são de índole discriminatória injustificável, marcados por subjetivismos e sentimentalismos. Essa proteção contra maus – tratos está ligada, não a qualquer subjetivismo ou sentimentalismo, mas ao fato concreto e indiscutível de que os animais, universalmente falando, são passíveis de sofrimento e dor, razão pela qual merecem a consideração de não serem tratados como coisas inanimadas ou mecanismos meramente reativos, conforme já os considerou Descartes e, ainda mais radicalmente, La Mettrie, que expandiu tal conceito mirabolante para abranger também os homens.
O exemplo a seguir é esclarecedor: tratemos de uma situação hipotética de dosimetria de pena, onde um cachorro e um cavalo sofram mutilação. O autor do crime contra o cão estará sujeito, devido à alteração legislativa, a pena variando entre dois a cinco anos de reclusão, multa e perda da guarda do animal, se a tiver. Já com relação ao agressor do cavalo a legislação é bem mais benevolente, sujeitando-o a uma pena de detenção de três meses a um ano e multa.
Ainda há outras consequências a ser consideradas para o agressor de cães e gatos, tais como o afastamento das benesses da Lei 9.099/95, a possibilidade de Prisão em Flagrante e a impossibilidade de arbitramento de fiança criminal pelo Delegado de Polícia, sendo fato que nenhuma dessas consequências mais gravosas se aplica ao violentador de outros animais que não cães e gatos (a infração do artigo 32, “caput”, da Lei 9.605/98 é de menor potencial ofensivo; afiançável pelo Delegado de Polícia e sequer, em regra, se lavrará auto de prisão em flagrante e sim mero Termo Circunstanciado, com liberação do infrator, independentemente de fiança.
De modo contrário aos críticos, no aspecto quanto a não prever a sua aplicação para outros animais que não aos cães e gatos, tenho que é perfeitamente possível sim.
Pemito-me afirmar que a Lei em comento é "abrangente" ou seja, sua aplicação produz efeitos a todos os animais, indistintamente.
Por analogia, a Lei Maria da Penha, não faz distinção entre lésbicas e heterossexualmente mulher. Atestando pela genitália, reconheceu o legislador ser indiferente sua identidade psicológica. Portanto, não devemos nos perder nas conjecturas das cantilenas nos corredores forense para protegermos a aplicação da lei com o apoio da sociedade, goste ou não de animais.
Conforme a Lei 11.340/2006 (art. 5.º), entende-se por violência doméstica e familiar toda a espécie de agressão (ação ou omissão) dirigida contra mulher (vítima certa) num determinado ambiente (doméstico, familiar ou de intimidade) baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. A Lei, portanto, tem por finalidade proteger a mulher vulnerável no ambiente doméstico e familiar, vítima de preconceito e discriminação em razão do seu sexo.
E no caso de vítima homem, ainda que vulnerável (p. Ex: criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência)? A Lei 11.340/06, apesar de criada para a mulher, pode servir aos homens, aplicando-se-lhes as medidas protetivas de urgência quando constatada sua vulnerabilidade, bastando o Magistrado valer-se do seu poder geral de cautela. Esse raciocínio, hoje, parece estar positivado, pois com o advento da Lei 12.403/11, caberá prisão preventiva se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
A novel Lei, portanto, reforça o entendimento de que as medidas protetivas da Lei Maria da Penha não são exclusivas da mulher ofendida, mas de qualquer pessoa vítima dessa espécie de violência (não importando o sexo), desde que vulnerável (como criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência).
Assim, frontalmente coloco-me contrário aos que dizem não se cogitar o emprego de analogia para equiparar as penalidades, ainda que em casos mais gravosos que envolvam animais diversos de cães e gatos, ainda que as distorções animem os críticos em razão da Lei 14.064/2020 prever pena para maus-tratos contra cães e gatos agora ser mais alta do que a de alguns crimes contra as pessoas, como lesão corporal, que vai de três meses a um ano detenção.
Papel de garantidor dos direitos fundamentais atrai ao Judiciário um caráter interpretador cada vez mais substantivo, afastando do ideal democrático procedimentalista. Os princípios de justiça são grande foco do Estado de Direito atual, pois aduz se que não é suficiente o cumprimento do procedimento para alcance efetivo da democracia, tendo em vista a existência de maiorias eventuais. Há necessidade de uma baliza entre os campos substancial e procedimental para que não haja uma interferência de competências, desrespeitando um dos princípios núcleo do Constitucionalismo moderno, a tripartição dos poderes.
As atribuições ao Judiciário, em foco a Corte Constitucional, revelam novas vertentes, como o poder de declarar uma normal inconstitucional, ou seja, contrária ao que preceitua a Carta Magna, perfazendo uma relação mais estreita entre juiz e norma.
Altera-se a natureza da função jurisdicional e a relação entre o juiz e a lei, que já não é, como no paradigma juspositivista, sujeição à letra da lei qualquer que seja o seu significado, senão que é uma sujeição, sobremodo, à Constituição que impõe ao juiz a crítica das leis inválidas através de sua reinterpretação em sentido constitucional e sua declaração de inconstitucionalidade. O Juiz Constitucional ganha um atributo criativo, auferindo se a ele uma interpretação construtiva para suprimento das lacunas e antinomias legislativas, assim alterando o olhar democrático para uma concepção cada vez mais substancialista.
Se a judicialização do Direito refere-se à abertura para a atividade do judiciário na interpretação normativa, o ativismo judicial refere-se, mormente, a essa conduta ativa do judiciário em criar normas. A principal diferença, portanto, consiste na atividade criativa dos tribunais. No processo de judicialização, o juiz atua além das atribuições de aplicação da lei. No entanto, fá-lo conforme princípios e regras anteriores. Enquanto isso, pelo ativismo judicial, o juiz cria novas entendimentos, ampliando as formas legais
Conforme o art. 4º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (LINDB): Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. E, nesse sentido, também dispõe o art. 140 do Novo CPC: Art. 140. O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico. Parágrafo único. O juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei.
No entanto, há uma grande dúvida acerca do papel do judiciário na decisão de casos em que a lei brasileira é omissa. E este questionamento se intensifica na medida em que os precedentes e a jurisiprudência ganham relevância no cenário jurídico brasileiro. Uma vez que as decisões emitidas pelo judiciário tenham peso sobre aquelas seguintes, como evitar que este assuma o papel de legislador nos casos em que a lei for omissa? Em casos emblemáticos, portanto, não deveria o legislador ser acionado para que suprisse, então, a omissão, de modo a perseguir o princípio da seguranças jurídica? Contudo, ao mesmo tempo em que a segurança jurídica em consonância à democracia é colocada em pauta, também se discute o direito de todos de terem suas demandas atendidas pelo judiciário.
Diante do exposto, pode-se dizer que a própria lei admite a existência das lacunas, trazendo em si, os meios próprios para o preenchimento destas, quais sejam, a analogia, os costumes, os princípios gerais de direito e a eqüidade. A doutrina dominante entende que os meios de preenchimento das lacunas são apresentados de forma hierárquica, não podendo o aplicador do direito utilizar-se de forma indiscriminada de um dos meios, mas devendo-se valer deles na ordem descrita pela lei.
Nós temos todo o direito penal construído para proteger o ser humano. E nós temos apenas o artigo 32 da lei de crimes ambientais para proteger a dignidade animal. A Constituição Federal proíbe a crueldade contra os animais [artigo 225]. Um crime contra a dignidade animal não pode ser considerado, como era, uma infração penal de menor potencial ofensiva.
Na minha visão a majoração da pena para maus-tratos contra cães e gatos prevista na lei de 2020 precisa ser comemorada, mas é só o primeiro passo. As penas para os crimes ambientais são muito baixas na Lei 9.605/1998. Para muitos, é mais fácil pagar a multa do que corrigir a conduta lesiva ao meio ambiente. O dano ambiental no Brasil ainda vale a pena.
Mas celeuma e discussões à parte, o certo é que está em tramitação no Congresso outro - PLC 134/2018 -, que é mais interessante, do nosso ponto de vista, porque aumenta pena para maus-tratos contra todos os animais. Mas consideramos que esse já foi um avanço. É preciso que as leis sejam mais rigorosas também para combater o tráfico de animais. Um projeto de lei (4.400/2020) que cria os tipos penais de tráfico de animais silvestres e de associação criminosa contra a fauna foi protocolado na Câmara dos Deputados em 31 de agosto.
Por fim é inegável que o animal (irracional), qualquer que seja ele, recebe da Lei, ou melhor do Direito, importante e substancial proteção o que não faz com o homem (quase racional).
Extrema, 02/05/21.
Milton Biagioni Furquim