Réu 70 anos de idade. Sentença condenatória. Embargos declaratórios. Art. 115 do Código Penal. Redução de pena.
Réu 70 anos de idade. Sentença condenatória. Embargos declaratórios. Art. 115 do Código Penal. Redução de pena.
É cabível a redução do art. 115 do CP se, entre a sentença condenatória e o julgamento dos embargos, o réu atinge idade superior a 70 anos?
Situação a decidir no momento. Análise.
Vejamos o acerto ou não do raciocínio que vai me dar elementos para a decisão.
João foi denunciado pela prática de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A, § 1º, I, do CP) e de sonegação de contribuição previdenciária (art. 337-A, III do CP). Eis os fatos.
A denúncia foi recebida em 20/05/2018. Em 21/05/2023, foi publicada sentença condenando o réu a pena de 3 anos de reclusão para cada crime. Total 6 anos reclusão.
Em 22/05/2025, ou seja, um dia após a condenação, o réu completou 70 anos de idade. Repito 70 anos de idade um dia após a condenação.
O Ministério Público não recorreu, de forma que essa pena tornou-se definitiva para a acusação.
A defesa, por seu turno, em 23/05/2023, opôs embargos de declaração, isto é, no dia seguinte.
Em 24/06/2023, o juiz conheceu dos embargos de declaração, mas negou-lhes provimento.
No dia seguinte, a defesa peticionou nos autos pedindo o reconhecimento da prescrição.
Aqui tenho que, nas circunstâncias em que tais, o pedido da defesa deve ser acolhido, eis que houve a prescrição.
Para a conclusão acima, não podemos esquecer que para calcular a prescrição, deve-se utilizar o total da pena imposta ao réu (6 anos) ou a pena de cada crime isoladamente (3 anos)? Questão importante na análise do caso.
O art. 119 do CP prevê a análise da prescrição de cada crime isoladamente: “Art. 119. No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente”. Desse modo, para calcular a prescrição, deve-se considerar a pena imposta para cada delito (3 anos) e não a soma dos dois (6) anos.
Como a pena foi fixada em 3 anos, qual é o prazo prescricional nesse caso? O prazo prescricional, cf. conforme previsto no art. 109, IV c/c art. 110 do CP, é de 8 anos: “Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (...) IV - em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro; Obs. O óbvio: 03 anos situa-se entre 02 e 04 anos
Outra análise do caso é o fato de que o réu ser maior de 70 anos interfere na prescrição. O Código Penal prevê que a prescrição deve ser contada com o prazo reduzido pela metade no caso de o condenado ter mais do que 70 anos. Veja: “Art. 115. São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos). È o caso dos autos, uai.
Assim, em vez de considerarmos 8 anos que o prazo prescricional para condenados até 04 anos, não esquecer que o réu foi condenado a 03 anos, devemos reduzir esse prazo prescricional de 08 anos para 04 anos.
Seguindo na análise do caso posto para apreciação. Já sabemos que para o caso do condenado João, a prescrição lhe será benéfica, sendo reduzida pela metade em face de completar 70 anos quando da data da sentença.
Outra questão que se deve ter em mente é que o recebimento da denúncia (20/05/2018) interrompe a contagem da prescrição. Interrupção do prazo prescricional significa que ele é zerado e recomeça a ser contado a partir daquela data. Isto é, com o recebimento da denúncia ‘zera’ o prazo prescricional que estava em curso até aquele momento e, partir daí (22/05/2018) tem início nova contagem do prazo prescricional.
O art. 117 do CP traz os momentos em que o prazo da prescrição é interrompido. Uma dessas causas é justamente o recebimento da denúncia, conforme prevê o inciso I: “Art. 117. O curso da prescrição interrompe-se: I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa; (...)”
Tese da defesa.
No caso, a defesa alega que, entre a data de recebimento da denúncia (em 20/05/2018) e a prolação da sentença condenatória (21/05/2023) já havia se passado 5 anos. Logo, estaria prescrita a pena imposta pelos crimes, considerando que o réu teria direito à redução do art. 115 do CP. Assim, 8 anos seria o prazo prescricional normal e 4 anos o prazo reduzido pelo art. 115. Exatamente de acordo com a análise algures feita.
Tese do MP (acusação):
O MP, por sua vez, argumentou que não havia prescrição. Segundo o Parquet, o réu não poderia se beneficiar da redução prevista no art. 115 do CP, considerando que ele completou 70 anos após a data da prolação da sentença condenatória. Desse modo, “na data da sentença”, o condenado não era maior de 70 anos, conforme exige o CP.
Colhe-se da jurisprudência a tese da defesa e não a da acusação. “É cabível a redução do prazo prescricional pela metade (art. 115 do CP) se, entre a sentença condenatória e o julgamento dos embargos de declaração, o réu atinge a idade superior a 70 anos, tendo em vista que a decisão que julga os embargos integra a própria sentença condenatória. STJ. 6ª Turma. EDcl no AgRg no REsp 1.877.388-CE, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 2/5/2023 (Info 773)”
Como foram opostos embargos de declaração contra a sentença condenatória e se entre a sentença condenatória e o julgamento dos embargos o réu atingir idade superior a 70 anos, é possível aplicar o art. 115 do Código Penal, tendo em vista que a decisão que julga os embargos integra a própria sentença condenatória.
Assim tenho que acatar a tese defensiva, eis que consentânea com a legislação e, portanto, reduzir pela metade o prazo prescricional que é de 8 anos para 4 anos e, assim, decidir de forma a absolver o João e, no caso, será absolutória.
Obs. Ao concluir pelo acerto da tese defensiva e absolver o réu veio-me na cabeça uma outra situação interessante de um réu com 69 anos sendo condenado em 1ª instância e com recurso de apelação. Futuramente desenvolverei o tema.
Guaxupé, 09/07/23.
Milton Furquim