Inviolabilidade de domicílio e outros temas.

Inviolabilidade de domicílio e outros temas.

A CF/88 prevê, em seu art. 5º, a seguinte garantia: “XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; (...)”

A inviolabilidade do domicílio é uma das expressões do direito à intimidade do indivíduo. Entendendo o inciso XI: Só se pode entrar na casa de alguém sem o consentimento do morador nas seguintes hipóteses: 1. Durante o dia: 1¹. Em caso de flagrante delito; 1². em caso de desastre; 1³. para prestar socorro e, 1. Para cumprir determinação judicial (ex. busca e apreensão, cumprimento de prisão preventiva). 2. Durante a noite: 2¹ em caso de flagrante delito, 2² em caso de desastre, 3³ para prestar socorro.

Assim, não se pode invadir a casa de alguém durante a noite para cumprir ordem judicial.

Flagrante delito

Vimos acima que, havendo flagrante delito, é possível ingressar na casa mesmo sem consentimento do morador, seja de dia ou de noite.

Um exemplo comum no cotidiano é o caso do tráfico de drogas. Diversos verbos do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 fazem com que este delito seja permanente: “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:”

Assim, se a casa do traficante funciona como boca-de-fumo, onde ele armazena e vende drogas, a todo momento estará ocorrendo o crime, considerando que ele está praticando os verbos “ter em depósito” e “guardar”.

Diante disso, havendo suspeitas de que existe droga em determinada casa, será possível que os policiais invadam a residência mesmo sem ordem judicial e ainda que contra o consentimento do morador?

Por evidente que sim, uai. No entanto, no caso concreto, devem existir fundadas razões que indiquem que ali está sendo cometido um crime (flagrante delito). Essas razões que motivaram a invasão forçada deverão ser posteriormente expostas pela autoridade, sob pena de ela responder nos âmbitos disciplinar, civil e penal. Além disso, os atos praticados poderão ser anulados.

O STF possui uma tese fixada sobre o tema: “A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas “a posteriori”, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados.” STF. Plenário. RE 603616/RO, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 4 e 5/11/2015 (repercussão geral – Tema 280) (Info 806).

O STJ também possui alguns julgados a respeito do assunto: “O ingresso regular da polícia no domicílio, sem autorização judicial, em caso de flagrante delito, para que seja válido, necessita que haja fundadas razões (justa causa) que sinalizem a ocorrência de crime no interior da residência. A mera intuição acerca de eventual traficância praticada pelo agente, embora pudesse autorizar abordagem policial em via pública para averiguação, não configura, por si só, justa causa a autorizar o ingresso em seu domicílio, sem o seu consentimento e sem determinação judicial. STJ. 6ª Turma. REsp 1574681-RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 20/4/2017 (Info 606).

Assim, para legitimar-se o ingresso em domicílio alheio, é necessário tenha a autoridade policial fundadas razões para acreditar, com lastro em circunstâncias objetivas, no atual ou iminente cometimento de crime no local onde a diligência vai ser cumprida.

Imaginemos a seguinte situação real ocorrida nesta Comarca de Guaxupé: Os policiais estavam fazendo uma ronda de rotina no bairro, quando foram informados por vizinhos e populares que em determinado imóvel existia uma carga roubada escondida, e que já fazia alguns dias.

Então os policiais em uma primeira investigação e permanecendo de campana puderam observar um movimento de entra e sai de pessoas do imóvel.

Então os policiais se dirigiram ao local tocaram a campainha identificando-se, no entanto ninguém apareceu para recebê-los ou atendê-los, permanecendo no local por uns 30 minutos. E nada de nenhum morador abrir a porta para que adentrassem ao imóvel.

As informações de que ali estavam escondendo carga roubada eram fidedignas e, qualquer suspeita se dissipou ante o fato de ninguém atender os policiais. Diante desta situação, um dos policiais fez contato com a sede da corporação solicitando que pedissem ao juiz um mandado de busca e apreensão e/ou um mandado para que pudessem adentrar o interior do local, enquanto eles continuariam vigando o local para que ninguém saísse ou adentrasse a residência.

Aportou em meu gabinete o Cmte da Polícia Militar, era por volta de 15hs, relatou-me o caso e como estava a situação no momento, de modo que requeria um mandado judicial para que os policiais militares adentrassem o local já que as informações eram certas quanto a estar a carga roubada guardada no local.

Disse ao Cmte. da guarnição que não iria deferir o pleito, a uma, tendo em vista que é questão duvidosa e polêmica expedir mandado judicial a policia militar para cumprimento de busca e apreensão, atribuição da Polícia Civil; a duas, considerando que a carga era roubada e tinham certeza deste fato, não havia dúvida de que a carga estava escondida no local informado já por alguns dias, não necessitavam de mandado para adentrar o local, de modo que poderiam arrombar a porta e fazer o serviço policial.

No entanto por uma questão de bom senso diante da situação, e por questão, também, de desencargo de consciência, concedi o mandado à Polícia Militar, nos seguintes termos, embora deesnecessário: “Inobstante a comunicação policial, cabe ressaltar que nos termos dos precedentes fixados pelo Superior Tribunal de Justiça, não há necessidade de expedição de mandado de busca e apreensão de bens em operação policial, quando há situação de flagrância[1], até mesmo porque, “a prática do delito de receptação na modalidade conduzir, caso dos autos, é forma permanente do ilícito[2]”. Ademais, como bem sedimenta o Egrégio Tribunal de Justiça Mineiro: “…Em se tratando de crime permanente, em que patente a situação de flagrância, ressai desnecessária a expedição de mandado de busca e apreensão, contudo, a existência do mesmo corrobora a legalidade do procedimento, na medida em que apresentado ao Poder Judiciário as fundadas suspeitas a legitimar a medida cautelar.” (TJ-MG - APR: 10012150014210001 Aiuruoca, Relator: Marcílio Eustáquio Santos, Data de Julgamento: 19/05/2021, Câmaras Criminais / 7ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 21/05/2021) Cabe afirmar ainda, que embora, a regra inadmitir a expedição de mandado de busca e apreensão provocada por ofício da Polícia Militar, e não pela autoridade constitucional competente (Polícia Judiciária ou Ministério Público), em situações de crime permanente, a referida é relativizada, em termos: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. NULIDADE. BUSCA E APREENSÃO DOMICILIAR REALIZADAS PELA POLÍCIA MILITAR. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. TRÁFICO DE DROGAS. CRIME PERMANENTE. PRESCINDIBILIDADE DO MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A Constituição da Republica diferencia as funções de polícia judiciária e de polícia investigativa, sendo que apenas a primeira foi conferida com exclusividade à polícia federal e à polícia civil, evidenciando a legalidade de investigações realizadas pela polícia militar e da busca e apreensão por aquela corporação realizada, mediante ordem judicial. 2. Em se tratando de crime de tráfico de drogas, considerado de natureza permanente, sequer seria obrigatório o mandado de busca e apreensão para operar-se o flagrante. 3. Recurso a que se nega provimento. (STJ - RHC: 97886 SP 2018/0104018-4, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 07/08/2018, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/08/2018) Por tais razões, considerando a prescindibilidade respectiva e, estando o ofício em ordem, com indícios suficientes de que o material pode estar no local, situação perfeitamente amoldada a previsão normativa (Art. 240, § 1º, ‘a’, ‘b’, ‘e’, e ‘h’, do Código de Processo Penal), com as cautelas contidas nos artigos 243 e 245, ambos do mesmo códex, DEFIRO o pedido respectivo, e determino a expedição de MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO, a ser cumprido no endereço declinado. Dê ciência ao Ministério Público. Remeta-se cópia à Policia Civil.”

Ora, pois! Simples a questão da violabilidade do domicilio, de modo que durante o dia desnecessária a expedição de mandado, podendo adentrar a residência em caso de flagrante delito; em caso de desastre; para prestar socorro e, para cumprir determinação judicial (ex. busca e apreensão, cumprimento de prisão preventiva).

A inviolabilidade do domicílio é uma das expressões do direito à intimidade do indivíduo. Entendendo o inciso XI: Só se pode entrar na casa de alguém sem o consentimento do morador nas seguintes hipóteses: em caso de flagrante delito; em caso de desastre; para prestar socorro e, para cumprir determinação judicial (ex. busca e apreensão, cumprimento de prisão preventiva). Ora, porque a insistência da expedição de mandado no caso relatado, durante o dia? Agora, durante a noite em hipótese alguma, a não ser nas exceções previstas que são em caso de flagrante delito, em caso de desastre, para prestar socorro. Assim difícil entender a razão pela qual os policiais militares, para adentrar o local em que estava escondida a carga roubada.

Agora, não basta tão somente a mera suspeita de que no interior da residência esteja escondida a carga roubada e/ou da existência de drogas no local. Ad exemplum, suspeita-se da existência de drogas no interior da residência, a polícia entra em seu interior, com permissão ou não durante o dia e encontrou maconha e cocaína, além de uma balança de precisão. O sujeito foi denunciado por tráfico de drogas. Não houve comprovação documental de que ocorreu autorização voluntária para o ingresso no domicílio. O réu foi condenado. A defesa impetrou habeas corpus alegando que todas as provas obtidas foram ilegais porque obtidas mediante ofensa à garantia constitucional de inviolabilidade de domicílio.

O STJ concordou com o pedido da defesa. (situação hipotética). Em um caso semelhante a esse, a 6ª Turma do STJ anulou as provas obtidas mediante busca e apreensão domiciliar, bem como as provas delas decorrentes, e, em consequência, absolveu o réu.

O STJ tem decidido que: “Na hipótese de suspeita de crime em flagrante, exige-se, em termos de standard probatório para ingresso no domicílio do suspeito sem mandado judicial, a existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de modo objetivo e devidamente justificadas, de maneira a indicar que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito. O tráfico ilícito de entorpecentes, em que pese ser classificado como crime de natureza permanente, nem sempre autoriza a entrada sem mandado no domicílio onde supostamente se encontra a droga. Apenas será permitido o ingresso em situações de urgência, quando se concluir que do atraso decorrente da obtenção de mandado judicial se possa objetiva e concretamente inferir que a prova do crime (ou a própria droga) será destruída ou ocultada. O consentimento do morador, para validar o ingresso de agentes estatais em sua casa e a busca e apreensão de objetos relacionados ao crime, precisa ser voluntário e livre de qualquer tipo de constrangimento ou coação. A prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo e preservada tal prova enquanto durar o processo. A violação a essas regras e condições legais e constitucionais para o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas obtidas em decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em relação de causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal do(s) agente(s) público(s) que tenha(m) realizado a diligência. STJ. 5ª Turma. HC 616584/RS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 30/03/2021. STJ. 6ª Turma. HC 598051/SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 02/03/2021 (Info 687).

Nesse mesmo sentido: “Para que os policiais façam o ingresso forçado em domicílio, resultando na apreensão de material apto a configurar o crime de tráfico de drogas, isso deve estar justificado com base em elementos prévios que indiquem que havia um estado de flagrância ocorrendo no local. No caso em tela, a violação de domicílio teve como justificativa o comportamento suspeito do acusado – que empreendeu fuga ao ver a viatura policial –, circunstância fática que não autoriza a dispensa de investigações prévias ou do mandado judicial para a entrada dos agentes públicos na residência, acarretando a nulidade da diligência policial. Além disso, a alegação de que a entrada dos policiais teria sido autorizada pelo agente não merece acolhimento. Isso, porque não há outro elemento probatório no mesmo sentido, salvo o depoimento dos policiais que realizaram o flagrante, tendo tal autorização sido negada em juízo pelo réu. Segundo entende o STJ, é do estado acusador o ônus de comprovar que houve consentimento válido do morador para que os policiais entrem na casa. Assim, o estado acusador é quem deve provar que o morador autorizou a entrada, não sendo suficiente a mera palavra dos policiais. STJ. 6ª Turma. HC 695980-GO, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 22/03/2022 (Info 730).

No caso, não houve comprovação documental de que ocorreu a autorização voluntária e livre de coação para o ingresso no domicílio. Além disso, a palavra dos agentes policiais acerca da suposta autorização não encontrou respaldo em nenhum outro elemento probatório, sendo certo que no depoimento extrajudicial do acusado não houve registro sobre o seu consentimento.

Por tudo que vimos, a entrada de forças policiais na residência do investigado é, provavelmente, um dos momentos de maior tensão entre o interesse público – nesse caso, a pretensão do Estado de manter a ordem, investigar e punir ilícitos – e as garantias individuais, como a intimidade, a privacidade e a inviolabilidade do domicílio.

Quando o ingresso policial é amparado em mandado judicial – apesar de também haver momentânea mitigação do princípio da inviolabilidade domiciliar –, há menos discussão nos tribunais e na esfera doutrinária sobre eventual ilegalidade; a controvérsia principal se dá nas situações em que a entrada dos agentes não é precedida de autorização judicial, como em situações de alegado flagrante.

No caso do ingresso sem mandado, são comuns os pedidos de anulação das provas obtidas na diligência em virtude de aspectos como a falta de consentimento do morador ou a inexistência da comprovação de investigações prévias que embasassem a ação policial.

O relator do HC 435.934, ministro Sebastião Reis Júnior, afirmou que "não é possível a concessão de ordem indiscriminada de busca e apreensão para a entrada da polícia em qualquer residência. A carta branca à polícia é inadmissível, devendo-se respeitar os direitos individuais. A suspeita de que na comunidade existam criminosos e que crimes estejam sendo praticados diariamente, por si só, não autoriza que toda e qualquer residência do local seja objeto de busca e apreensão".

De acordo com o ministro, o mandado de busca e apreensão deve ter objetivo certo e pessoa determinada. A falta de individualização das medidas contrariou vários dispositivos legais, inclusive o artigo 5°, XI, da Constituição Federal, que traz como direito fundamental a inviolabilidade do domicílio. Segundo o magistrado, o crime de tráfico de drogas, na modalidade de guardar ou ter entorpecentes em depósito, possui natureza permanente. Tal fato torna legítima a entrada de policiais em domicílio para fazer cessar a prática do delito, independentemente de mandado judicial, desde que existam elementos suficientes de probabilidade delitiva capazes de demonstrar a ocorrência de situação flagrancial.

Admitir a entrada na residência especificamente para efetuar uma prisão não significa conceder um salvo-conduto para que todo o seu interior seja vasculhado indistintamente, em verdadeira pescaria probatória (fishing expedition), sob pena de nulidade das provas colhidas por desvio de finalidade.

A inviolabilidade do domicílio é uma das vertentes do direito à privacidade, pois a casa, conforme estabelece o inciso XI do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, é asilo inviolável do indivíduo e ninguém nela pode penetrar sem o consentimento do morador, nem mesmo o Estado, exceto nos casos de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro ou, durante o dia, que atualmente é compreendido no período entre 6h e 18h, exigindo-se, neste último caso, determinação judicial.

Eis aqui mais um direito que vem sendo mitigado incansavelmente pelos nossos tribunais, tão somente para conferir um caráter de licitude às provas angariadas no curso das investigações preliminares.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está evoluindo paulatinamente quando o assunto é a imposição de limites à relativização dessa cláusula de proteção constitucional. Apesar das idas e vindas dos entendimentos da corte, alguns avanços são identificados em julgados mais recentes.

Antigamente, esse dispositivo constitucional, que assegura a inviolabilidade do domicílio, não possuía a força normativa que lhe é conferida na atualidade, principalmente quando em conflito com um flagrante delito de tipos penais permanentes, como é o caso do tráfico de drogas. Nessas situações, portanto, não havia necessidade da demonstração de fundadas razões (justa causa) para validar a invasão, nem menos a justificativa a posteriori, indicando que dentro da referida casa ocorria situação de flagrante delito, ainda que a violação domiciliar ocorresse no período noturno, pois o simples fato de o crime ser de natureza permanente era suficiente para justificar a incursão policial.

Volvendo na questão dos policiais que decidiram não entrar no ‘barracão’ onde a carga roubada estava escondida, embora desnecessária a expedição de mandado judicial, a bem da verdade, na atualidade, estamos percebendo uma mudança de atitude da Polícia, tudo em razão de seu sucateamento e do direcionamento da política governamental que tem de forma expressa demonstrado uma posição de repulsa a atuação policial.

Não obstante ocupe um lugar de destaque no texto constitucional, especialmente no que se refere a apuração de infrações penais, a polícia judiciária brasileira nestes quase 23 anos de redemocratização não galgou qualquer avanço significativo no que tange ao exercício do seu poder-dever de investigar.

Poderíamos elencar inúmeras causas para esse inadimplemento constitucional, mas podemos nos fixar em apenas três linhas investigativas. A primeira, diz respeito a ingerência política. A segunda, a usurpação da função. A terceira, a desmotivação dos integrantes da instituição. Analisando objetivamente tais informações chegamos a conclusão de que essas três causas estão ligadas, senão interdependentes.

A ingerência política por si só é complexa, mas num país onde a ética não existe, ou está em extinção, é preocupante e diretamente responsável pela fraca atuação das polícias, seja ostensiva, seja preventiva ou investigativa.

É comum percebermos que a organização funcional administrativa das policiais favorece a existência de relações políticas no seu âmago. Ora, sabemos que o resultado das investigações e outras ações acaba sendo atrelado politicamente, desta feita o interesse público, que muitas vezes é contrário ao interesse político, acaba sendo vilipendiado.

Assim sendo, em especial, a investigação, acaba tomando um rumo burocrático e controlado. Define-se quem tem que investigar, porque, por incrível que pareça, ao contrário dos juízes e promotores, que contam com o chamado principio natural da competência ou da atribuição, os Delegados de Polícia podem ser mudados de local de atuação e novamente mudados, ao bel prazer administrativo.

No que diz respeito ao objeto da investigação, o foco central é nas camadas de baixa renda ou, de baixa expressão social (sob a ótica capitalista é claro). Dessa forma, a polícia judiciária foca seus parcos meios investigativos nas periferias, nos morros, nas favelas, nos alagados, nas invasões, fazendo as vezes apenas de controlador social oficial do Estado. Nesta seara, podemos dizer que o investigado é escolhido pela polícia judiciária em razão da expressão social que possui e não pelos crimes que comete.

Assim, a falta de aparelhamento, os baixos vencimentos (em razão inversamente proporcional ao risco assumido pelos policiais) e a ausência de investimento no material humano, não são, nem de longe, assuntos que parecem de fato preocupar nossas autoridades. Frequentemente, as propostas se baseiam na criação de soluções aparentemente mágicas, sem levar em consideração problemas acima mencionados. No entanto, para além de simples mudanças legislativas no intuito de melhorar as polícias, ainda que de âmbito constitucional, é preciso combater as causas que estão levando nossos órgãos policiais à falência. Até porque, os maiores lesados com esse descaso à segurança pública são as vítimas de crimes e seus familiares, que são reféns de um sistema ineficiente e que não consegue, por total falta de recursos, elucidar e punir os responsáveis pelos delitos.

A piorar de vez a situação temos, ainda, a posição política do governo ‘socialista1 que, segundo a Presidenta do Partido, Gleiisi Hoffmam, é preciso “desmilitarizar” as forças policiais brasileiras, pois o Estado é responsável pela atual situação de conflitos no país ao orientar as forças policiais “para a guerra” contra “inimigos internos”. A incorporação das regras militares “faz com que os policiais atuem sob a figura da eliminação, não do diálogo, isto segundo a filosofia dos atuais mandatários do País.

A defesa de uma polícia cidadã, contrária a uma polícia de guerra, visão filosófica do partido político dominante hoje no País, cujo viés é de que a sociedade tem que entender da necessidade de superar a militarização da segurança pública para a implantação de uma polícia fora do regramento militar. Acham que o Brasil precisa de uma polícia que seja respeitada e não temida.

O militarismo, segundo a filosofia atual do Governo, tem conteúdos próprios úteis, como defesa da soberania, das fronteiras, contra inimigo externo que, no entanto não serve para o relacionamento interno no âmbito democrático. A incorporação das regras militares faz com que os policiais atuem sob a figura da eliminação, não do diálogo, ou seja, contra o inimigo interno, que hoje são as manifestações, os estudantes, os trabalhadores, as minorias. É assim que pensam e é o que pretendem. Só posso afirmar, se como está a coisa ta feia, então imagine uma policia desmilitarizada e de ‘paz e amor’, que segundo o Ministro da Justiça, “Vamos separar o joio do trigo. Não importa a posição ideológica, se o cidadão gosta ou não do PT. Ele tem de cumprir as regras e agir de acordo com a hierarquia e a disciplina. Isso será feito, é o certo, diferente do que foi feito agora [sob Bolsonaro] com uma partidarização da polícia. Se a política entra na polícia, a polícia deixa de cumprir o seu dever].

God save us!

Guaxupé, 29/06/23 (Viva São Pedro)

Milton Biagioni Furquim

Milton Furquim
Enviado por Milton Furquim em 29/06/2023
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