Crítica de Robert Nozick
à Teoria da Justiça de John Rawls
Sílvia Maria Leite Mota
Robert Nozick afirma em seu Anarquia, Estado e Utopia, que os princípios de justiça são de natureza histórica e exemplifica sua fala ao citar o princípio de distribuição segundo o mérito moral.[1] Nenhuma pessoa deve receber uma parcela maior do que outra cujo mérito moral é maior. Essa padronização leva em conta informações não contidas nas matrizes de distribuição. Contudo, não será histórico no sentido de que leve em consideração ações anteriores que criaram direitos diferentes a fim de avaliar uma distribuição.
Todos os princípios sugeridos de justiça distributiva são padronizados, mas, o princípio de direito a alguma coisa, não é padronizado.[2] Exalta-se Robert Nozick ao afirmar que manter um padrão distributivo é “[...] individualismo com violência!”[3] Segundo o autor, os princípios distributivos padronizados não dão às pessoas o que lhes confeririam os princípios de direito a alguma coisa, apenas mais bem distribuídos, porque não concedem o direito de fazer o que se quer com aquilo que se tem. Não admite o direito de escolher um fim que envolva o melhoramento da situação de outra pessoa. Princípios padronizados implicam a apropriação de atos de outras pessoas. Tomar os resultados do trabalho de alguém equivale a tomar-lhe horas a dirigi-lo para que execute diversas atividades.[4]
Robert Nozick, ao referir-se à obra A Theory of Justice, de John Rawls, declara-a como “[...] um trabalho vigoroso, profundo, sutil, amplo, sistemático sobre filosofia política e moral como nunca se viu igual desde as obras de John Stuart Mill.”[5] Os filósofos políticos, continua o autor: “[...] têm agora ou de trabalhar com a teoria de John Rawls ou explicar por que não o fazem.”[6]
Após essa soberba apresentação, Robert Nozick concede crítica às regras da justiça de John Rawls derivadas da posição original, a partir de que beneficiam os pobres à custa dos ricos.[7] Sua objeção é que os povos na posição original não terão razão suficiente para levar adiante a regra segundo a qual os ricos devem fazer sacrifícios em benefício dos pobres. John Rawls mantém o sacrifício do rico no intento de beneficiar os pobres, mas, os ricos recebem também um ganho maior nos termos do benefício, por estarem em uma sociedade de cooperação mútua. Robert Nozick objeta. Os ricos poderiam pender para um princípio da justiça que lhes custasse menos, embora pudessem ter um benefício cooperativo mais restrito. Também, é ultrajante levar adiante um acordo que renda um benefício mais elevado para os ricos, do que um acordo que renda um benefício mais elevado para os pobres. Sendo assim, para o autor, o endosso de John Rawls do princípio da diferença é arbitrário. Não o distingue “[,,,] da contraproposta quase simétrica, que imaginamos os mais bem dotados como apresentando, nem de qualquer outra.”[8] E exara que John Rawls está simplesmente repetindo que a cooperação parece razoável, o que “[...] dificilmente seria uma resposta convincente para quem ela não parece razoável.”[9]
Robert Nozick ataca também John Rawls por negligenciar a maneira com que os recursos naturais são adquiridos. Outra vez, John Rawls mantém que todos os recursos naturais são arbitrários imerecidos: “[...] arbitrários do ponto de vista moral”. Por exemplo, propõe ao leitor uma situação plausível: pessoa muito rica que acabou de receber uma herança. Certamente, não necessita da fortuna recém-adquirida, e, talvez, nem mesmo tenha feito muito esforço para merecê-la. Mesmo assim, apesar da opinião sobre a necessidade ou o mérito da aquisição, somos inclinados a dizer que a herança é sua por direito, isto é, que o herdeiro está autorizado, habilitado a recebê-la. Robert Nozick responde com dois tipos de argumentos: o positivo e o negativo. O primeiro provaria que os efeitos distributivos das diferenças naturais deveriam, por razões morais, serem anulados; o segundo seria destinado a rebater um possível contra-argumento que sustente que os efeitos distributivos de diferenças naturais devem ser, também por razões morais, anulados.[10] John Rawls rejeita a distribuição de acordo com o merecimento moral. Nozick se detém na teoria da titularidade da justiça ao exarar que não são as características da pessoa que devem ser decisivas à justiça das posses, mas como foi obtida tal propriedade, se de modo autorizado, habilitado ou não. A distribuição será válida se os recursos naturais forem adquiridos legitimamente O que quer que surja de uma situação justa, através de etapas justas, é em si justo. Desde o início de sua explanação já afirmava Robert Nozick: “Uma distribuição é justa se, por meios legítimos, surge de outra distribuição justa.”.[11] John Rawls não considera essa opção.
[1] NOZICK, Robert. Anarquia, Estado e utopia. Rio de Janeiro: Zahar, 1991, p. 176.
[2] Ibidem, p. 177.
[3] Ibidem, p. 186.
[4] Ibidem, p, 191.
[5] Ibidem, p. 201-202.
[6] Ibidem, p. 202.
[7] “[...] imagina ele indivíduos racionais, mutuamente desinteressados que se encontram em certa situação, ou abstraídos de suas outras características, não previstas nela. Nessa situação hipotética de opção, que ele denomina de ‘posição inicial’, eles escolhem os primeiros princípios de uma concepção de justiça que deverá regular todas as críticas subsequentes e a reforma de suas instituições. Enquanto faz essa opção, ninguém sabe qual é seu lugar na sociedade, posição de classe ou status social, seus dotes capacidades naturais, força, inteligência, etc.” Ibidem, p. 208.
[8] Ibidem, p. 214.
[9] Idem.
[10] Ibidem, p. 232.
[11] ibidem, p. 172.