COVID-19. PANDEMIA. CORONAVIRUS: Como ficam as mensalidades escolares? Qual teoria a observar? Da imprevisão? CDC? Pagar? Não pagar? Renegociar? Redução?
COVID-19. PANDEMIA. CORONAVIRUS: Como ficam as mensalidades escolares? Qual teoria a observar? Da imprevisão? CDC? Pagar? Não pagar? Renegociar? Redução?
A rápida propagação deste malévolo vírus (corona vírus) desencadeou a contaminação, até o momento, de milhões de pessoas no planeta, ultrapassando os milhares de mortes no Brasil, isso sem levarmos em conta os possíveis casos subnotificados. Neste viés, é imperioso que se empreste o devido destaque aos reflexos econômicos/financeiros causados pela Pandemia. A estagnação da economia provocada pela pandemia do novo coronavírus pode erradicar quase 25 milhões de empregos em todo o mundo, consoante afirmou a OIT (Organização Internacional do Trabalho).
O referido ente internacional também sinalizou para um aumento no subemprego e grandes perdas de renda para os trabalhadores, em até 3,4 trilhões de dólares, já que o impacto econômico da epidemia do novo corona vírus deve causar reduções de jornada de trabalho e salários. Torna-se portanto imprescindível no atravessar dessa tormentosa quadra, a busca pelo devido equilíbrio, evitando-se, desta forma, que uma parte seja demasiadamente onerada em face de outra.
A adoção das necessárias medidas excepcionais adotadas pelos órgãos competentes (com repercussões sociais e econômicas) para contenção da Pandemia, bem como outras, de restrições à liberdade e a propriedade individual, não encontram precedentes na história do Brasil, e estão a gerar os mais variados impactos, sobretudo, no campo da economia e das relações obrigacionais.
A sociedade está em constante mudança em um mundo cada vez mais integrado e conectado. Hoje, é possível ir da China à Itália em pouco menos de dez horas. Através da palma da mão e de potentes celulares, é possível acompanhar em tempo real o que acontecesse em todo o planeta. Com os adventos da globalização, as barreiras e os entraves diminuíram, e vivemos em uma sociedade cada vez mais integrada.
Apesar de todo o progresso, existem fatores externos que são imprevisíveis e que podem alterar por completo a dinâmica da humanidade. Atualmente vivemos em um desses raros momentos já presenciados na história com o surgimento do COVID-19. Com a revolução da informação, tem-se acesso em tempo real ao número de doentes e mortos em torno do planeta, o que gera mais medo e pânico na coletividade.
O COVID-19 fez literalmente o planeta apertar o botão de “pause”. Como jamais visto, fronteiras foram fechadas, assim como empresas, comércio e serviços em geral. Direitos fundamentais como a da liberdade foram restringidos em prol da saúde e da vida da coletividade.
Nesse panorama, há uma alteração radical na realidade posta, alterando profundamente os negócios jurídicos, especialmente os contratos. Com todas as empresas, comércios, prestadores de serviços fechados, há uma profunda alteração na renda das pessoas e das empresas o que gera a necessidade de resolução ou revisão dos contratos.
O mercado de consumo foi um dos mais impactados, inclusive com shoppings e restaurantes fechados, cenário jamais visto no País. Com todos em “quarentena”, o ordenamento jurídico vem buscando alternativas para que decisões equilibradas sejam tomadas de forma a diminuir o impacto que as pessoas e as empresas vêm sofrendo em razão da perda de renda.
No âmbito dos contratos já celebrados, eclodem questões relativas às dificuldades do seu adimplemento, e os possíveis efeitos deletérios que já se avizinham, caso não se busque o seu reequilíbrio. Esse novo cenário desafia e exige respostas, tanto na perspectiva do direito privado geral, quanto nas relações de consumo.
Muitas alternativas já são previstas no ordenamento jurídico. Através do “diálogo das fontes” é possível encontrar soluções na Constituição, no Código Civil, em leis esparsas e até no próprio CDC. Porém, destaca-se que, estando sob regras do direito privado, prevalece a máxima, “pacta sunt servanda” = os pactos/contratos são para serem cumpridos. As partes devem vincular-se ao que se comprometeram em prol da segurança jurídica e da força obrigatória dos contratos.
A Covid-19 trouxe imensos desafios às mais diversas áreas, especialmente às relações de consumo, haja vista que as medidas do Governo para o enfrentamento da pandemia resultaram no impedimento da execução total ou parcial dos contratos, o que fatalmente vem afetando todos os envolvidos na relação consumerista. De modo que é impossível encontrar um tratamento padronizado a ser aplicada ao tema.
A bem da verdade há recomendações de toda ordem para que seja observada pelos consumidores; uns órgãos recomendando que os consumidores evitem cancelar ou pedir descontos em mensalidades de instituições de ensino que tiveram as aulas suspensas em razão do novo corona vírus (covid-19.Essa orientação parte do pressuposto que o sistema educacional funciona por ano letivo, ou seja, o contrato envolve um cronograma de horas/aulas e disciplinas que devem ser cumpridas no ano, sendo um contrato pelo valor total, parcelado em 12x, que resulta na mensalidade. Assim, conforme orientação, diante da possibilidade de recuperação das aulas durante os períodos de férias ainda previstos, além de sábados e feriados, não é recomendada uma discussão do contrato neste momento. No entanto, tal orientação considera a continuidade dos serviços por algum meio, seja com recuperação futura, aumento das atividades no período de férias e atividades remotas, tornando equilibrado o preço. Todavia, deixa de levar em conta os casos de total descontinuidade na prestação dos serviços, a exemplo das creches.
Nos casos de descontinuidade dos serviços educacionais sendo no caso da educação básica, a revisão contratual será cabível quando evidenciado que o objeto contratado não será atingido, como a perda do ano letivo.
No entanto, quando tratamos de creche, por exemplo, em que o serviço prestado não pode ser continuado remotamente nem mesmo recuperado, nestes casos tem-se o enquadramento da impossibilidade superveniente de continuidade do contrato, sendo possível a sua revisão ou mesmo a rescisão, conforme previsão do Código Civil que dispõe que, cf. art. 248 CC "Se a prestação do fato tornar-se impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; (...)."
De toda forma, o bom senso para se buscar um equilíbrio entre as partes deve permear a negociação. Afinal, os efeitos já sentidos da pandemia é que todos serão atingidos de alguma forma, sendo infrutífera a tentativa de levar às últimas instâncias uma tentativa de zerar algum prejuízo.
Certamente um dos pontos mais polêmicos é sobre a qualidade do ensino à distância (EAD) e a sua manutenção do preço.
Se por um lado, as aulas foram contratadas para serem presenciais e passaram a ser disponibilizadas online, havendo uma quebra do contrato; ocorre uma transferência aos pais da responsabilidade pela disciplina dos filhos no acompanhamento das aulas, exigindo-se menos dos professores e mais da família; os cursos online geralmente são mais baratos que os cursos presenciais.
Por outro lado, pela conjuntura, podemos concluir que a simples alteração das aulas presenciais para aulas online não ensejam por si só uma revisão contratual.
No entanto, nos casos em que se comprove a redução da carga horária, queda da qualidade, como a baixa carga horária ou ausência de material didático, por exemplo, pode-se levantar a possibilidade de uma revisional, a depender das provas do real prejuízo e imperícia envolvidos. Ou seja, mais um ponto que deve ser avaliado minuciosamente todos os fatores do caso concreto, com especial atenção à boa fé das partes.
Não é justo se cobrar um valor cheio por um serviço que não foi contratado, e que ainda, vem apresentando GRANDES DEFICIÊNCIAS. Há uma pressão por parte dos pais e responsáveis para que a escola ofereça todo o conteúdo aos alunos, pressão levada até os professores para que produzam aulas, mas alguns sem a mínima estrutura, o que tem gerado excessos.
Nenhuma escola quer ficar para trás, muitas não querem admitir que não possuem recursos tecnológicos e estão empurrando a responsabilidade para os professores, sem capacitação técnica para o trabalho remoto e sem respeito a sua privacidade e seu direito de imagem.
Ressalte-se que as reclamações são mais recorrentes no que toca amodalidade EAD ao ensino infantil. Pais de alunos se insurgem com o não retorno das escolas aos pedidos de negociação, mormente, porquanto a não indicação do ensino a distância a esse público infantil. E aqui não podemos deixar de considerar que é nesta fase que se trabalham os aspectos cognitivos, físico, motor, psicológico, cultural e também social, fatores que se demonstram não producentes na modalidade EAD. Ao ensino infantil, por tais motivos a modalidade EAD não há e ser aplicada ao ensino infantil.
Desta forma, independentemente dos descontos ofertados, há que se garantir, mesmo em momentos de crise, o cumprimento e garantia de princípios constitucionais, entre eles, o da qualidade – mola propulsora para se alcançar o desiderato de um ensino de excelência – consoante preconiza o inciso VII do art. 206 da nossa Carta Magna. In verbis: “Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: (…); VII - garantia de padrão de qualidade”.
Como não respaldar a intervenção no contrato de prestação de serviços para aplicar descontos em um serviço prestado com tantas falhas, consoante acima observado? Apenas ad argumentandum tantum, se o serviço ora prestado fosse de total excelência, ainda assim, comportaria discussões acerca de eventual redução financeira, eis que a forma ora executada não foi a contratada pelas partes na fase pré-negocial.
O direito posto no ordenamento jurídico pátrio agasalha integralmente o direito buscado na presente lide. Seja pela aplicação da teoria da imprevisão, seja pela observância das normas consumeristas.
O nó górdio da ação a ser proposta vai gravitar em torno da discussão acerca dos efeitos dos contratos, notadamente, dos contratos de prestação de serviços educacionais, e a consequente onerosidade excessiva, sem a devida qualidade, decorrente da pandemia de COVID-19, que vem sendo suportada pelos pais e/ou responsáveis no pagamento das mensalidades escolares, mormente em razão da suspensão das aulas presenciais nas Instituições de Ensino (objeto do contrato educacional firmado entre pais de alunos e escolas).
Inolvidável que natureza jurídica do contrato de prestação de serviços educacionais, reveste-se numa avença cujo objeto é o processo de ensino-aprendizagem, tratando se, portanto, de contrato bilateral, oneroso, comutativo e de longa duração cabendo ao aluno, ou seu responsável pagar os valores contratados, e à prestadora do serviço, por meio de seus professores contratados, ministrar conhecimentos, informações ou esclarecimentos indispensáveis à formação do discente ou a um fim determinado.
Consoante se demonstrará a seguir, as escolas demandadas continuam exigindo o cumprimento integral do acordado no contrato, mesmo não estando prestando o serviço na forma originalmente pactuada, inclusive com muitas falhas, fazendo-se mister, a aplicação da Teoria da Imprevisão, para fins de modificação, e/ou intervenção judicial no contrato educacional,enquanto durar a situação de pandemia.
Outra questão que se trava entre os estudiosos é de natureza processual/material, diz respeito sobre qual teoria deve subsidiar uma possível ação na Justiça, isto é, se a teoria da imprevisão e/ou a aplicação das normas consumeristas. Ora, há que se discutir sobre o quê a pandemia representa no mundo jurídico; se ela caracteriza caso fortuito ou força maior, e que tais teorias emanadas do Código Civil pautassem a relação de consumo.
A Teoria da Imprevisão e o Código Civil.
Deveras tanto o Código Civil, como o CDC tiveram inspiração histórico – evolutiva no consagrado e universal princípio rebus sic stantibus (implícito na Teoria da Imprevisão), a qual tem aplicabilidade quando uma situação nova e extraordinária surge no curso do contrato, colocando uma das partes em extrema dificuldade, sendo certo que sua aplicação nos contratos sob a égide do CDC, tem contornos muito mais flexíveis.
Tal dicotomia não significa a exclusão de um comando normativo em detrimento de outro. Com efeito, lançando mão da Teoria do Diálogo das Fontes, importante destacar os comandos insertos nos artigos 478 e 479 do codex substantivo civil, complementam as inserções normativas previstas no CDC, havendo, tão somente como dito acima, uma relativização dos critérios deste último para sua aplicação.
Teoria que tem como fundamento a ideia de que as normas jurídicas não se excluem, porque pertencentes a ramos jurídicos distintos, mas, ao revés, se complementam. A teoria foi desenvolvida por Erik Jayme, na Alemanha, e pela Professora Cláudia Lima Marques, no Brasil.
Hodiernamente, para aplicação do princípio rebus sic stantibus, à luz do CC, deve-se observar, notadamente, a existência dos seguintes requisitos: a) Contrato sinalagmático, oneroso, comutativo e de execução continuada ou diferida; b) Acontecimento extraordinário, geral e superveniente; c) Imprevisibilidade do acontecimento; d) Desproporção, de forma que a prestação do devedor se torna excessivamente onerosa.
Discorrendo sobre o tema, o Professor Silvio de Salvo Venosa, esclarece que: “O princípio da obrigatoriedade dos contratos não pode ser violado perante dificuldades comezinhas de cumprimento, por fatores externos perfeitamente previsíveis. O contrato visa sempre uma situação futura, um porvir. Os contratantes, ao estabelecerem o negócio,têm em mira justamente a previsão de situações futuras. A imprevisão que pode autorizar uma intervenção judicial na vontade contratual é somente a que refoge totalmente às possibilidades de previsibilidade” (grifamos).
A Teoria da Imprevisão e o Código de Defesa do Consumidor
É hialino como a luz solar a afirmação de que o contrato de prestação de serviços educacionais em escolas privadas, ou seja, onde há remuneração pelo serviço prestado,constitui-se em típica relação de consumo, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor.
Nesse diapasão, em razão da ocorrência de fatos supervenientes que tornem excessivamente onerosas, o cumprimento das cláusulas contratuais firmadas anteriormente,o consumidor tem o direito de pugnar pela sua modificação e/ou revisão. Essa é a dicção do art. 6º do CDC. Vejamos: “Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: (…) V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas (g.n.). A exegese emprestada ao tema, por parte dos pretórios brasileiros, é pacífica e extreme de dúvidas, e aponta no sentido da flexibilização do princípio pacta sunt servanda em casos que tais.
Basta passarmos uma rápida vista d´olhos no art. 6ª, V do CDC, para se constatar que o mesmo não previu para a sua incidência o critério da imprevisibilidade, bastando que os fatos supervenientes tornem as prestações excessivamente onerosas ao consumidor. Assim, pelo simples exercício de interpretação literal ou gramatical,podemos concluir que o direito à revisão nos contratos escolares– objetivando seu reequilíbrio – pode ser exercido ainda que o fato seja previsível. Esse é o escólio do Professor Nelson Nery, que preconiza: “não há necessidade de que esses fatos sejam extraordinários nem que sejam imprevisíveis”.
Assim, por qualquer ângulo que se analise o tema, é curial que os contratos firmados pelas instituições de ensino privado com os consumidores pais de alunos, devem ser relativizados, ainda que momentaneamente, na cláusula que diz respeito aos valores pagos pelo serviço. Mais uma vez, é de suma importância a abalizada lição do Professor Nelson Nery: “O direito básico do consumidor, reconhecido no art. 6º, no VI, do Código, não é o de desonerar-se da prestação por meio da resolução do contrato, mas o de modificar a cláusula que estabeleça prestação desproporcional, mantendo-se íntegro o contrato que se encontra em execução, ou de obter a revisão do contrato se sobrevierem fatos que tornem as prestações excessivamente onerosas para o consumidor” (In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto: direito material e processo coletivo: volume único. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, vol. I. p. 550). (grifamos).
Como vimos algures a existência de entendimento de posicionamentos pela aplicação da teoria da imprevisão (Código Civil)e/ou as normas consumeristas (CDC), sem aprofundar no tema, com a vênia dos que pensam que no caso estamos diante de uma imprevisão ou caso fortuito ou força maior, de modo a aconselhar que deve se buscar discutir judicialmente mediante a aplicação da teoria da imprevisão, prevista no Código Civil, ouso defender tese contrária, vez que o art. 393 do Código Civil prevê que não se responsabiliza o devedor pelos prejuízos advindos de caso fortuito ou força maior, quando expressamente não houver por eles responsabilizado. Isso significa que o caso fortuito ou força maior representam uma exclusão de responsabilidades, o que não ocorre com a aplicação das normas consumeristas.
Outro princípio que vem sendo utilizado para defender a tese é o da teoria da imprevisão, previsto no art. 317 do Código Civil em que assim discorre: “quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação”. De acordo com esta teoria, sua aplicação aos contratos seria viável caso o fato extraordinário e imprevisível gerador da desproporcionalidade não esteja afiançado objetivamente pelos riscos inerentes à contratação. Desse modo, a consequência dessa hipótese seria a possibilidade de uma revisão judicial do contrato.
Há ainda outra teoria que usada para respaldar os contratantes, ensejando a rescisão dos contratos, seria a teoria da onerosidade excessiva, amparada pelo art. 478 e seguintes também do Código de Processo Civil que assim determina: “Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato”.
Contudo, quando se trata de contrato educacional, deve-se lembrar que a atividade desempenhada por rede de ensino é caracterizada pela prestação de serviço com previsão no Código de Defesa do Consumidor e o CDC estabelece princípios norteadores das relações de consumo. Estes princípios resguardam o consumidor na condição de hipossuficiência atribuindo ao fornecedor a responsabilidade civil objetiva. Inclusive, prepondera o princípio da boa-fé objetiva, transparência e informação e proibição das cláusulas abusivas.
Não há dificuldade alguma em caso como este alegar que, em virtude da pandemia se encontra em crise financeira – e quem não se encontra?, portanto há uma desproporcionalidade quando da exigência de pagamento integral das prestações mensais do contrato. O julgador irá analisar os fatos e por certo reconhecer a desproporção entre o quatum mensal a que se obrigarão cidadão, quando foi celebrado o contrato de prestações de serviços educacionais e o momento da execução.
Então, pautado pela boa-fé, percebe-se que a ausência na prestação de serviços de acordo com o que foi pactuado por parte das instituições de ensino, somado aos impactos econômicos provocados pela Pandemia aos consumidores, é devido à ambas as partes chegarem a um acordo que beneficie os dois lados. O desconto na mensalidade, portanto, é uma medida que deve ser adotada pelas instituições de ensino.
Bom, em que pese advogar a tese da aplicação das normas do CDC, para casos como o do texto, tenho que se pode valer-se de ambos institutos, isto é, a aplicação da teoria da imprevisão ou as normas do CDC.
Muito comum haver impedimento financeiro no pagamento, em que pais de alunos foram fatalmente afetados com uma demissão ou redução drástica dos rendimentos. Nesse ponto, um elemento a ser considerado é sobre o real impacto da pandemia na situação financeira do contratante, de forma a ter o enquadramento na teoria da imprevisão para fins de motivar uma revisão do contrato.
Trata-se de uma análise estritamente pontual. Ou seja, a simples ocorrência de uma pandemia não torna todos os pais insolventes, devendo ser analisado caso a caso a (im)possibilidade no pagamento, mediante provas. Pela ótica do bom senso, é coerente que as instituições de ensino já viabilizem um parcelamento das mensalidades do período que perdurar a pandemia, para aqueles que se enquadrarem nesta imprevisão.
O Art. 478 do CC: Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Sobre o tema, importante saber ainda que tramita no Senado Federal o Projeto de Lei, n° 1.163/2020, que dispõe sobre a redução de, no mínimo, 30% (trinta por cento) no valor das mensalidades das instituições de ensino da rede privada com funcionamento suspenso, enquanto perdurar o estado de calamidade pública.
Portanto, uma análise imparcial deve ser lançada em cada caso, de acordo com todos os lados envolvidos, de forma a se encontrar um equilíbrio, especialmente quando a pandemia começa a dar os sinais de que ninguém sairá ileso.
Nesse sentido, importante lição já traçada pelo STJ quando diante de relações negociais que envolvem prejuízos para ambas as partes, exigindo-se bom senso e boa fé na solução do litígio: "Duty to mitigate the loss: o dever de mitigar o próprio prejuízo. Os contratantes devem tomar as medidas necessárias e possíveis para que o dano não seja agravado. A parte a que a perda aproveita não pode permanecer deliberadamente inerte diante do dano. Agravamento do prejuízo, em razão da inércia do credor. Infringência aos deveres de cooperação e lealdade" (REsp 758.518/PR, Rel. Min. Vasco Della Giustina, DJe 28.06.2010).
Vale ressaltar também o alerta dado pela doutrina ao avaliar o assunto: “"Por isso, independentemente da situação de emergência derivada da epidemia, os contratantes devem adotar os cuidados necessários para a redução dos possíveis danos e prejuízos que possam derivar dessa circunstância. Além de adotar essas providências, é recomendável que adotem as medidas necessárias para documentá-las comunicando à contraparte." (JUSTEN FILHO, Marçal. Org. Covid-19 e o Direito Brasileiro. KUKIELA, Marina. VOSGERAU, Isabella Moreira de Andrade. O impacto da COVID-19 nos contratos privados. Edição do Kindle. p. 2456)
Noutras palavras, o serviço vem sendo prestado com deficiências das mais diversas, e aquém do que foi contratado, estando, atualmente, a parte contratante (pais de alunos e alunos) arcando com todo o ônus causado pelas medidas de restrição impostas em razão da Pandemia,
Não é desarrazoado afirmar que nenhum dos pais de alunos firmariam os contratos educacionais, com os valores remuneratórios ora em vigência, se pudessem vaticinar como se operariam as aulas na modalidade EAD praticadas na atualidade.
Não se está a demonizar as entidades de ensino privada, muito pelo contrário, estas também foram alcançadas pela Pandemia. No entanto, é inconcebível que os pais de alunos sejam relegados ao oblívio, como se estes estivessem destinados a atravessar incólumes pelas dificuldades. Ora, quantos pais de alunos, ficaram desempregados? Quantos tiveram salários reduzidos? Quantos também perderam seus clientes e tiveram substancial perda salarial? Quantos tiveram que contratar alguém para auxiliar seus filhos nas aulas e tarefas virtuais, em razão de não disporem de tempo? Quantos tiveram que adquirir computadores para acompanhar as atividades no âmbito domiciliar? Enfim, esses são apenas um dos poucos fatos a angustiar alunos e familiares
É importante registrar que com a substituição das aulas presenciais, por aulas que utilizam meios e tecnologias de informação e comunicação (que não estavam previstas no contrato de prestação de serviços) houve, indubitavelmente, uma substancial redução nas despesas ordinárias por parte dos fornecedores/escolas (geralmente previstas como indicadores componentes para a fixação das mensalidades no início do período escolar), tais como: energia elétrica, água, vale-transporte e salário de professores, sensores, zeladores, material de limpeza e de expediente, valores de lanches, almoço e de aulas de educação física etc., sendo mais que razoável que haja uma redução compensatória no valor das mensalidades.
É política de justiça social, que os efeitos e as repercussões econômicas e financeiras da pandemia sejam repartidas e suportadas entre todos os sujeitos da relação, de sorte a garantir a higidez e equilíbrio contratual; a conservação da avença, e o compromisso no cumprimento das respectivas obrigações.
Por tais razões, é o Judiciário, última trincheira na defesa da justiça e da pacificação dos conflitos e pacificação social.
Todos, de alguma forma, serão obrigados a ceder um pouco a fim de evitar um colapso generalizado nas relações contratuais, inviabilizando o acesso à escola ou até mesmo, inviabilizando a continuidade de instituições de ensino.
Guaxupé, 24/07/2020.
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