Argumentos a favor e contra
a cirurgia de redesignação do sexo
a cirurgia de redesignação do sexo
Texto contido em:
MOTA, Sílvia. Da bioética ao biodireito: a tutela da vida no âmbito do direito civil. 1999. 308 f. Dissertação (Mestrado em Direito Civil)–Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1999. Não publicada. [Aprovada com distinção].
Psiquiatras e cirurgiões justificam as operações transexuais ou de redesignação sexual, assinalando que a cirurgia é a única terapia disponível para ajudar certos transexuais a levarem uma vida ajustada. Opta-se pela cirurgia apenas quando a psiquiatria falha. Ninguém é aceito para a operação de mudança de sexo sem um processo de reflexão completo visando a determinar se uma operação transexual será benéfica ou não.
A grande parte dos moralistas concorda com os psiquiatras que as operações transexuais são uma boa terapia. E um bom exemplo de que estejam corretos são as irmãs gêmeas, Karen e Martine Hewit, nascidas em Reading, cidade a oeste de Londres.[1] A história de Martine, hoje Paul, é uma realidade da qual não se pode e não se deve fugir.
Mas, há um argumento eticamente válido para as operações transexuais? É a cirurgia uma boa terapia para doenças psicológicas? São os pacientes realmente curados com a operação?
Para alguns, a resposta a todas estas questões, parece ser negativa. Diz Thomas Szasz que: “As pessoas que sofreram a operação são apenas mulheres ou homens falsos.”[2] Identifica-se com essa posição, Genival Veloso de França para o qual as cirurgias de mudança de sexo são “desnecessárias, mutiladoras e antiéticas.”[3] Para essa corrente, o sexo cromossômico não é mudado; apenas os genitais são transformados para assemelharem-se aos do sexo oposto. O paciente tem seu sexo mudado apenas na mente, passando a viver num mundo de sonhos que dificilmente pode ser considerado um bom ajustamento psicológico à realidade.
É narração de Andrew C. Varga que o psiquiatra J. K. Meyer, chefe da Unidade de Consulta sobre Comportamento Sexual do Johns Hopkins, publicou, em agosto de 1979, um estudo sobre o assunto, na revista Archives of General Psychiatry. Esse estudo se iniciou com uma coleta de dados sobre cem indivíduos em 1971. O estudioso acompanhou as vidas de cinquenta pessoas, quinze das quais tinham feito cirurgia de troca de sexo e trinta e cinco apenas a terapia do aconselhamento psiquiátrico e, analisando seu ajustamento à vida, descobriu que as pessoas que tinham recebido terapia psiquiátrica tiveram um melhor ajustamento do que as que foram operadas. Muitos dos sérios problemas psicológicos dos pacientes não desapareceram com a operação, o que torna o Dr. Meyer e alguns de seus colegas céticos quanto aos benefícios da operação. A maioria dos pretendentes é de jovens atravessando certas transformações e crises de desenvolvimento e que procuram na mudança de sexo uma saída de seus problemas psicológicos. Outro grupo é constituído por pessoas ao fim da meia-idade. Também essas atravessam uma crise de desenvolvimento, relativa aos problemas da morte, aposentadoria e outras situações de stress, após esse período. Diz Andrew C. Varga que uma cirurgia drástica, que tem apenas valor cosmético, não pode ser moralmente justificada.[4]
Ainda que sejam pessimistas os argumentos contrários à cirurgia de redesignação do sexo, sou contrária à interferência estatal, quando esta ultrapassa sua função de fiscalizar a idoneidade dos profissionais envolvidos, assim como do procedimento utilizado na intervenção cirúrgica. O direito a realizar a cirurgia diz respeito à esfera individual de cada indivíduo. A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, exara no seu art. 3°, inciso IV, que entre os objetivos da República está o de promover o bem de todos sem preconceito ou discriminação de qualquer natureza. É dever do Estado tutelar o ser humano na busca da felicidade, garantindo-lhe a liberdade de assumir decisões, desde que estas não prejudiquem terceiros.
MOTA, Sílvia. Da bioética ao biodireito: a tutela da vida no âmbito do direito civil. 1999. 308 f. Dissertação (Mestrado em Direito Civil)–Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1999. Não publicada. [Aprovada com distinção].
Psiquiatras e cirurgiões justificam as operações transexuais ou de redesignação sexual, assinalando que a cirurgia é a única terapia disponível para ajudar certos transexuais a levarem uma vida ajustada. Opta-se pela cirurgia apenas quando a psiquiatria falha. Ninguém é aceito para a operação de mudança de sexo sem um processo de reflexão completo visando a determinar se uma operação transexual será benéfica ou não.
A grande parte dos moralistas concorda com os psiquiatras que as operações transexuais são uma boa terapia. E um bom exemplo de que estejam corretos são as irmãs gêmeas, Karen e Martine Hewit, nascidas em Reading, cidade a oeste de Londres.[1] A história de Martine, hoje Paul, é uma realidade da qual não se pode e não se deve fugir.
Mas, há um argumento eticamente válido para as operações transexuais? É a cirurgia uma boa terapia para doenças psicológicas? São os pacientes realmente curados com a operação?
Para alguns, a resposta a todas estas questões, parece ser negativa. Diz Thomas Szasz que: “As pessoas que sofreram a operação são apenas mulheres ou homens falsos.”[2] Identifica-se com essa posição, Genival Veloso de França para o qual as cirurgias de mudança de sexo são “desnecessárias, mutiladoras e antiéticas.”[3] Para essa corrente, o sexo cromossômico não é mudado; apenas os genitais são transformados para assemelharem-se aos do sexo oposto. O paciente tem seu sexo mudado apenas na mente, passando a viver num mundo de sonhos que dificilmente pode ser considerado um bom ajustamento psicológico à realidade.
É narração de Andrew C. Varga que o psiquiatra J. K. Meyer, chefe da Unidade de Consulta sobre Comportamento Sexual do Johns Hopkins, publicou, em agosto de 1979, um estudo sobre o assunto, na revista Archives of General Psychiatry. Esse estudo se iniciou com uma coleta de dados sobre cem indivíduos em 1971. O estudioso acompanhou as vidas de cinquenta pessoas, quinze das quais tinham feito cirurgia de troca de sexo e trinta e cinco apenas a terapia do aconselhamento psiquiátrico e, analisando seu ajustamento à vida, descobriu que as pessoas que tinham recebido terapia psiquiátrica tiveram um melhor ajustamento do que as que foram operadas. Muitos dos sérios problemas psicológicos dos pacientes não desapareceram com a operação, o que torna o Dr. Meyer e alguns de seus colegas céticos quanto aos benefícios da operação. A maioria dos pretendentes é de jovens atravessando certas transformações e crises de desenvolvimento e que procuram na mudança de sexo uma saída de seus problemas psicológicos. Outro grupo é constituído por pessoas ao fim da meia-idade. Também essas atravessam uma crise de desenvolvimento, relativa aos problemas da morte, aposentadoria e outras situações de stress, após esse período. Diz Andrew C. Varga que uma cirurgia drástica, que tem apenas valor cosmético, não pode ser moralmente justificada.[4]
Ainda que sejam pessimistas os argumentos contrários à cirurgia de redesignação do sexo, sou contrária à interferência estatal, quando esta ultrapassa sua função de fiscalizar a idoneidade dos profissionais envolvidos, assim como do procedimento utilizado na intervenção cirúrgica. O direito a realizar a cirurgia diz respeito à esfera individual de cada indivíduo. A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, exara no seu art. 3°, inciso IV, que entre os objetivos da República está o de promover o bem de todos sem preconceito ou discriminação de qualquer natureza. É dever do Estado tutelar o ser humano na busca da felicidade, garantindo-lhe a liberdade de assumir decisões, desde que estas não prejudiquem terceiros.
[1] Cresceram idênticas e até os 25 anos nada as diferenciava, salvo o fato de Martine, que sempre se sentiu um homem, decidir se tornar um, adotando o nome de Paul. Hoje, com 28 anos, diz que está feliz como nunca esteve antes, sente-se um homem de verdade e está apaixonado por uma garota que conheceu em Londres depois que deu uma entrevista em um programa de TV. Sua irmã Karen, entretanto, passou por um período de intensa depressão, pois, em três anos, perdeu uma irmã e ganhou um irmão. Os resultados dos tratamentos hormonais aos quais Paul se submeteu tornaram a vida de Karen difícil, pois em determinados momentos ficava horrorizada com as transformações, mas escondia seus sentimentos, pois ela já estava sofrendo muito para que eu a enchesse com as minhas preocupações e, além disso, os transexuais precisam que a gente diga que estão bonitos. Paul por sua vez diz que se transformou em homem por uma questão de sobrevivência, pois se continuasse com um corpo de mulher, acho que ficaria louco ou teria me matado. O fato de ter uma irmã gêmea aumentava ainda mais o seu sofrimento, pois olhando Karen, via o que eu não era e, ao tentar imitá-la e observá-la, sofria, pois era horrível, ficava ainda mais difícil. Walter, Anne B. Minha irmã gêmea é um homem. Revista Marie Claire, n. 65, p. 50-53, ago. 1996.
[2] SZASZ, Thomas apud VARGA, Andrew C. Problemas de Bioética. Tradução de WENZEL, Guido Edgar, S. J., Rio Grande do Sul: Usininos, 1990, p. 222. Tradução de: The main issues in bioethics.
[3] FRANÇA, Genival Veloso. Visão ético-jurídica da transexualidade. Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, p. 311, nov./dez. 1975.
[4] VARGA, Andrew C. Problemas de Bioética. Tradução de WENZEL, Guido Edgar, S. J., Rio Grande do Sul: Usininos, 1990, p. 223. Tradução de: The main issues in bioethics.