EXECUÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA
Texto escrito em 1996
 
1 Cumprimento da decisão antecipatória
 
No prelúdio desta exposição, o que interessa é o cumprimento da decisão que antecipa a tutela. Considera-se qualquer ato de executoriedade como provisório, o que mantém coerência com a proibição da tutela antecipada de efeitos irreversíveis.[1]
 
Aplica-se, portanto, as normas relativas à execução provisória. A satisfação do direito não pode alcançar caráter irreversível como acontece na execução definitiva. Há apenas atos de execução antecipados, que implicam em não prejudicar que as coisas retornem ao seu status quo ante.
 
Aqui, novamente o legislador arqueia-se ao medo de desafiar as ortodoxias jurídicas vigentes e injeta outra dose de inocuidade na disposição legal. É plena sabença que, em inúmeros casos, a antecipação da tutela tem que ser concedida naquele exato e crucial momento ou perderá a razão de ser invocada, tornando-se inútil ao autor. É o que acontece naquelas situações que reclamam por cirurgia, transfusão de sangue, alimentos, viagem ou exibição de um espetáculo, entre outros. Nestas condições, a irreversibilidade é quase sempre evidente, fugindo aos domínios do controle jurídico. Portanto, não há que se aplicar aqui a execução provisória sob o risco de serem cometidas injustiças ou mesmo prejuízos irreparáveis, como, por exemplo, a morte de uma determinada pessoa.
 
Num caso de situação limite, a técnica mais apropriada a ser aplicada é a duplicidade das ações onde se verifica a tutela antecipada[2], autorizando-se ao juiz recorrer ao instituto da responsabilidade civil, outorgando perdas e danos à parte lesada pela concessão da antecipação da tutela, estornando o que lhe foi tirado, e que deveria estar assegurado através de caução. Contudo, o novel diploma libera a caução, pois o § 3º do art. 273 manifestamente exclui o inc. I do art. 588, o que não traduz isentar o autor vencido da responsabilidade pelos danos gerados pela execução da tutela antecipada. A obrigação de indenizar é congênita ao dever de restabelecimento do status quo ante. Determina a execução provisória nas hipóteses do inc. II e III do art. 588, pelos quais ficam vedados os atos que importem alienação dos domínios do réu, não admitindo, sem caução idônea, o levantamento de depósito em dinheiro, além do que, exige-se o retorno da situação ao status quo ante, se a sentença final vier a modificar ou anular o objeto que originou a antecipação da tutela.
 
2 Obrigações de fazer e não fazer
 
As ações em que a prestação recaia no cumprimento de obrigação de fazer e não fazer, também foram contempladas pelas novas disposições do Código de Processo Civil. É o que se lê no § 3º do art. 461, que ostenta nova redação: "Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo fundado receio de ineficácia do provimento é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser modificada ou revogada a qualquer tempo, em decisão fundamentada."
 
O alcance das restrições referidas anteriormente, tais quais a barreira imposta à concessão da tutela de efeitos irreversíveis ou o requisito da prova inequívoca, não atingirão as obrigações de fazer ou não fazer, a entrega de coisa "[...] além de outras situações que o mundo fático é rico em apontar"[3], cabendo ao Juiz estimar e testificar o que se pode ou não atender.
 
Kasuo Watanabe ensina que é relevante notar que: "[...] ao titular do direito interessa, ‘às vezes’, exclusivamente o ato do próprio devedor (v. g., quando alguém encomenda a um artista de renome a pintura de um quadro) e ‘outras vezes’ o que importa é o resultado prático-jurídico equivalente ao ato do devedor, e não o próprio ato deste."[4]
 
Imprescindível fazer esta distinção, para que se possa entender a tutela específica das obrigações de fazer ou não fazer.
 
No primeiro caso, de "infungibilidade prática", a execução específica da obrigação de fazer somente poderá ser alcançada com a colaboração do devedor, e para induzi-lo à prática do ato, o legislador inseriu meios diversos de coerção e sub-rogação suficientes para que a tutela seja cumprida. Não funcionando os meios oferecidos por lei para forçar o cumprimento da mesma nem os de apoio, acabam por transformar-se em perdas e danos.[5]
 
Na segunda hipótese, a infungibilidade seria apenas aparente, não poderão ser praticados por terceiro (por exemplo, a outorga da escritura definitiva de compra e venda de um imóvel), a lei admitiu a imposição de multa diária ao réu por descumprimento da medida antecipada, até que seja cumprida a obrigação. É a técnica do antigo direito francês, fundada nas "astreintes", que visa ameaçar o patrimônio do devedor até que este reaja à inércia e cumpra a obrigação que lhe é imputada.
 
As obrigações de não fazer, como assim observa José Carlos Barbosa Moreira, podem consistir em não fazer, tolerar, permitir e abster-se.[6] A violação aqui se dará em ato instantâneo ou em atos sucessivos ou ainda em caráter permanente.
 
A lei dispõe apenas sobre a violação por ato instantâneo, cogitando apenas no desfazimento do ato ou em perdas e danos, sem que seja possível desfazer o ato (arts. 642 e 643). Contudo, há casos de violações permanentes que clamam pela tutela específica a fim de que seja cassada a violação. Da mesma forma, quando são sucessivas, a fim de evitar-se as futuras violações concede-se a tutela específica da obrigação de não fazer. Estas situações evidenciam a urgência da concessão de tutela, mesmo porque, em contrário, o provimento judicial tardio poderá trazer efeitos inúteis ao autor.
 
[1] FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência. 246 fls. 1994. Tese (para titularidade da cadeira de Processo Civil) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1994, p. 227.
 
[2] FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência. 246 fls. 1994. Tese (para titularidade da cadeira de Processo Civil) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1994, p. 227.
 
[3] DIAS, Francisco Barros. Processo de conhecimento e acesso à justiça: Tutela antecipatória. In: Ajuris: revista da associação dos juízes do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n. 66, março 1996, p. 231.
 
[4] WATANABE, Kazuo. Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer: arts. 273 e 461 do CPC. Ajuris: revista da associação dos juízes do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n. 66, março 1996, p. 181.
 
[5] ALVIM, Thereza. A tutela específica do art. 461, do Código de Processo Civil. Revista de Processo, São Paulo, n. 80, out-dez-1995, p. 107.
 
[6] MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 261 et seq.
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 24/01/2014
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