Introdução à Filosofia da Educação

Tendo em vista, que Olgária C. F. Matos, apresenta o termo Paidéia como relacionado a uma educação formadora e que a mesma visa formar um ethos, buscando educar a criança para a harmonia, moderação, temperança consigo mesma e a concórdia na cidade, além da interpretação do homem e da cidade, objetivando o desenvolvimento de um caráter virtuoso, o que diferenciaria uma nobreza de sangue (aristocrática) da nobreza de alma dos sofistas e Sócrates seria justamente essa não separação dos cidadãos livres por privilégio de raça. Perdem-se os privilégios de sangue, a antiga areté que se satisfazia em formar cidadãos belos e bons, dispostos a morrer em nome da cidade e de uma estirpe agora está sob os auspícios de um desejo de formar cidadãos atuantes, que participavam da vida pública, fazendo com que a pólis se ressignificasse, superando os privilégios da antiga educação, conforme citado: “a areté política não podia nem devia depender do sangue nobre, mas da admissão do povo (dêmos) no estado [...].”(PAGNI e SILVA apud JAEGER,2001, p.21), a Sophia, a força moral e espiritual do saber destronando o mítico preconceito da consanguinidade.

A palavra torna-se importante no séc. IV a. C., justamente por se tornar o instrumento fundamental para a realização da virtude cívica, adquirindo primazia na pólis sobre as demais ferramentas de poder, saindo da justeza sacerdotal e se fazendo presente no lugar do debate, da contradição e da argumentação. Eis que o interesse comum se sobrepõe ao interesse privado, linguagem e política em reciprocidade, onde a consciência que pensa sobre si consequentemente pensa também sobre a vida social.

Inicialmente podemos destacar como aspectos de identificação dos Sofistas e Sócrates o fato de terem um ideal educativo baseado na retórica, por serem mestres da areté política, buscando seu alcance através da formação espiritual. Os sofistas, visto antes como sábios, mestres na arte da Educação do cidadão e até mesmo fundadores da Pedagogia democrática, passam a exercer a função de especialista em alguma arte, causam espanto, são admirados, justamente por serem professores de técnicas com métodos de ensinar e não filósofos propriamente ditos. Marilena Chauí ressalta a necessidade retórica sofista de convencer os outros de sua opinião, servindo-se da persuasão, que explora o embate para se fazer valer. A argumentação sofista se torna valiosa na democracia ateniense, onde nos tribunais, cada cidadão assumia pessoalmente a defesa de seus direitos, o que favorecia a necessidade de dominar a arte da retórica, para que pudesse ter garantia de vitória em relação ao pleito. Outra característica sofista é do afastamento da antiga cosmologia para uma aproximação de visão antropológica. Sócrates difere dos sofistas por ser contrário à cobrança dos ensinamentos e divergir nos resultados de uma dialética, já que buscava a verdade após acirrada disputa de ideias e não pensar no justo, no verdadeiro, no bom se definindo a partir da escolha dos participantes, fugindo da ideologia sofista de uma disputa pela disputa, onde o bem seria uma questão de convencimento, ameaçando a virtuosidade da pólis.

O sentido da anamnese socrática se refere a seu método, a maiêutica, comparada a profissão da mãe de Sócrates que era parteira, já que o filósofo era tido como um parteiro de ideias. O fato de fazer o próprio opositor dialógico ir expondo aquilo que o levará ao autoconhecimento, como se já existisse um saber, que através da discussão, ressurge, com o interlocutor socrático assumindo o papel de um médico clinicando, onde o próprio paciente fornece informações sobre sua doença e possibilitará posteriormente uma cura.

Diante da revelação feita pelo oráculo de Delfos, Sócrates se vê diante da descoberta de, a ele, ser dado o título de homem mais sábio, e isso se dá justamente por sua postura de jamais ter a pretensão de tudo saber, conforme a expressão “só sei que nada sei”, onde o aumento do conhecimento só faz alargar a ignorância, já que aumenta proporcionalmente a gama de não-saberes em relação a um novo saber. O ‘conhece a ti mesmo” segue essa mesma linha de raciocínio, onde a reflexão faz com que o olhar sobre si demonstre as limitações e a busca incansável, já que o conhecimento se dá de forma processual, exigindo do “homem político” o controle e a moderação, um governo de si.

A importância do diálogo na construção do pensamento é vista em Sócrates, que se mostra como professor que jamais se coloca como detentor de um conhecimento pronto e acabado, ao contrário, o objetivo é buscar a verdade em uma espécie de pedagogia da razão, numa volta ao interior dos interlocutores, que trincará opiniões cristalizadas, a ponto de abalar certezas, sem que jamais possamos esgotar questões em respostas, diferindo dos sofistas em uma separação entre opinião e verdade, aparência e realidade, sensibilidade e inteligibilidade. Sócrates educa na ágora e faz perceberem que o mesmo saber está na faculdade racional, tanto dos governantes quanto dos escravos, fornecendo em seus diálogos a resposta sobre a origem da noção de verdade, proveniente dos juízos que fazemos sobre a coisa, além de como os valores humanos conduzem a vida. O olhar de preconceitos que vem do mundo exterior deve ser deslocado a uma contemplação interior.

O método socrático consiste num primeiro momento, convidar o interlocutor a filosofar sobre um tema de ocasião. A seguir, comentar as respostas ou opiniões dadas sobre a referência temática, colocando, sobre elas, mais perguntas. Isso faz o interlocutor ver seus preconceitos e a ironia de Sócrates refuta e destrói argumentos antes vistos como intransponíveis, sugerindo novos caminhos até que se chegue a definição procurada. O nome do método é maiêutica: “a arte de dar nascimento às ideias”. Tal método não seria uma arte alheia à ciência, mas sim fundado na ciência do belo, do justo e do verdadeiro, fazendo com que o interlocutor saísse da virtude imaginária, se colocando diante da busca por um saber inalcançável, tendo a Filosofia como esse grande desejo pela sabedoria e que essa busca faria com que o homem reorientasse sua conduta, pelo cuidado de si, pelo cultivo da própria alma e pela aspiração à virtude, tentando romper os preconceitos e a escravização pelos apetites, na direção da vida reta e da pólis justa.

A relação que se pode estabelecer entre a filosofia socrática e a educação seria o método filosófico como forma de reeducar o pensar, uma areté de valor espiritual, uma ética como expressão da natureza humana, torna a possibilidade de ethos, um eudemonismo que faz o homem entregar-se a alma, conforme exposto por Jaeger. Virtude e felicidade agora fazem parte do interior do homem refletindo na coletividade, ética e política se articulam culminando em uma ascese de uma abstinência e autodomínio, emancipando a razão dos grilhões da natureza animal, espírito subjugando instintos, tendo como meta uma liberdade interior que se realiza no combate aos apetites externos. A Educação não serve apenas para transmissão de conhecimentos, mas deseja fornecer ao homem condições para alcançar o fim autêntico de sua vida, atingir a consciência do lógos, trazendo para a Filosofia a missão de comandar o Estado, interagindo com a pólis através da razão, na busca das definições universais e necessárias das coisas, fazendo dessa filosofia uma ciência.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 11/04/2021
Código do texto: T7229402
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