Ética para meu filho
No que se refere à ordens, costumes e caprichos, Fernando Savater, a exemplo de Aristóteles, em “Ética a Nicômaco”, procura apresentar um guia para que seu filho aprenda sobre o “bem viver”, e que por conseguinte o faça tentar compreender a sociedade e contribuir para o seu desenvolvimento. Já no início do capítulo, apresenta um exemplo aristotélico sobre os temas abordados, onde o capitão da embarcação, diante de uma tempestade, procura chegar a uma justa medida, refletindo sobre o dilema de jogar a carga ao mar e salvar-se junto com a tripulação, ou enfrentar a tormenta e com isso colocar em risco a vida de todos.
Como procedemos diante de situações difíceis? Geralmente as pessoas agem de acordo com a necessidade, ou seja, diante do problema, já que não existe o hábito de prever variáveis antes de eventos trágicos. Uma frase comum é a de que geralmente a desgraça cai na casa do vizinho, uma forma de afastarmos nossos maiores temores. Sem a prevenção, cotidianamente agimos de forma automática, já que é cômodo levantar e executar suas tarefas corriqueiras, como escovar os dentes, sem a preocupação de problematizar antes.
Chegamos então aos motivos, ou seja, o que nos leva a agir dessa ou daquela maneira. Dentre as motivações abordadas, primeiramente o autor se refere às chamadas ordens. As ordens seriam aquelas obrigações que realizamos a partir do medo, onde somos coagidos por uma força que nos submete a seu domínio, mas que também pode surgir do afeto e da confiança, fazendo com aceitemos pela força do afeto, uma busca por recompensa ou punição. Assim como as ordens, os costumes também parecem vir de fora, surgindo da comodidade que a rotina impõe, procurando não contrariar os outros, seguindo também tendências que estão em conformidade com certos tipos de ordens, como é o caso da moda. Por fim, temos os caprichos, que aparentemente brotam espontaneamente e sem a crença de estarmos imitando alguém, eles vêm de dentro.
Claro que existe uma complexidade, que faz com que um simples capricho possa ter emanado de um emaranhado de ordens e costumes, podendo existir muitas varáveis das três perspectivas apresentadas. No caso do capitão do barco, citado por Aristóteles, as ordens podem vir tanto de um patrão quanto da força do mar, já os caprichos poderiam descreditar a ação do barqueiro, já que dentro do que imaginamos ser uma conduta razoável de um navegador, estaria uma conduta em que seus desejos ficariam relegados a último plano. No que se refere aos costumes, é difícil pensar em uma tormenta cotidiana, que seja hábito diário na cultura náutica.
Assim, o autor conclui que o dilema aristotélico é de ordem funcional, onde a conduta do capitão vai variar conforme sua obediência ou não às ordens, sua prática ou não de certos costumes, bem como sua vontade diante de tais ou tais caprichos. A decisão vem acompanhada do peso de todas essas influências, o que não diminui o peso da responsabilidade na escolha.
SAVATER, Fernando. Ética para meu filho. 2. ed. tradução: Monica Stahel. São Paulo: martins Fontes, 2007. cap. 2.