Filósofos em Três Imagens

Gilles Deleuze, adentra o universo filosófico grego, ou talvez, a melhor expressão seja multiverso. Apresentando três momentos em torno do que foi considerada a gênese da chamada Filosofia, bem como do desenvolvimento do denominado pensamento ocidental.

O pensamento platônico, um marco, apresenta características aéreas, elevando-se até o Olimpo, onde pode fixar-se nas alturas, nas barbas de Zeus, explorando o imaginário. O fenômeno aéreo é percebido tanto popularmente, onde encontramos a figura do ser filosófico como edificante, inclusive no âmbito moral, quanto no aspecto científico, onde tem-se a verticalização do inteligível, criando assim um idealismo.

Deleuze aponta a filosofia como doença congênita, baseada no idealismo platônico, com ascensão e queda com forma maníaco depressiva, a mania de Platão, unida a fuga das ideias em uma dialética que culmina um suicídio depressivo socrático. Nietzsche percebera e já apontara Sócrates como início dessa degenerescência.

Nietzsche vislumbrara algo menos aéreo, percebera a caverna dentro da caverna com os pré-socráticos, buscando assim uma profundidade além. Explorando os domínios de Hades. Não mais adotando biografias ou bibliografias, mas sim, buscando um ponto secreto, os mistérios dionisíacos, anedota da vida e aforisma do pensamento.

Os pré-socráticos, em sua busca pelos elementos, demonstraram o desejo pelo profundo, desprezando o auxílio que Platão manifestara em seu modelo de República. Desejavam moldar a realidade à marteladas, conforme as forjas de Hefesto ou mesmo o trabalho dos Ciclopes, retirando as asas das sandálias de Hermes. Menosprezando o fio de Ariadne e dizendo para Teseu enforcar-se com ele. O pré-socratismo fazia-se como modelo esquizofrênico.

Após o platonismo, temos um movimento diferenciado, não mais desejando a profundidade pré-socrática, nem os auspícios aéreos platônicos. Megáricos, Cínicos e Estóicos, basearam-se na superfície, nem alto e nem baixo, mas plano. Não mais a altura com seu universal e particular e nem a profundidade com sua substância e acidente. Preferem o acontecimento. Unem-se aos Titãs mas sem desejarem elevar-se aos céus, querem travar a guerra no solo, com intuito de enamorarem Gaia, além de contarem com a fluidez de Poseidon.

Adotam o modelo de Hércules, conforme exposição de Sêneca, que habitando os três mundos, encontra no abismo infernal algo insatisfatório, na altura celeste uma prostração, sendo célebre na superfície terrena, onde combate, com sua pele de leão e o porrete em mãos, moldando a realidade.

Mas nas superfícies, contempla as misturas, na exaltação da gula, do incesto, do canibalismo, conforme as descrições de Diógenes. A essência fora corrompida. Sendo que Crisipo, alerta para misturas de duas naturezas, as boas que abarcam o todo e as más ou parciais, sendo no processo relacional entre corpos, todas as misturas tornam-se tanto boas quanto más, o que torna a lógica dessa terceira geração de filósofos, — ou terceira imagem, como denomina Deleuze — pervertida, já que altera o sentido em relação as anteriores. O filósofo não mais habitava cavernas profundas, como seres troglóbios, nem alçavam vôos como pássaros platônicos, tornaram-se animais de plano chato, como piolhos, carrapatos, ou seguindo os rasantes sobre a superfície conforme aves de rapina, na mais esplêndida analogia nietzscheana.

Referência Bibliográfica:

DELEUZE, Gilles. Lógica do Sentido. 5ª. ed. Tradução: Luiz Roberto Salinas Fortes. São Paulo: Perspectiva, 2009. (Estudos; 35 / dirigida por J. Guinsburg) p. 131-136.