Sobre Uma Crítica da Ideologia Alemã
Tratar de uma crítica relacionada a ideologia alemã não é tarefa simples, daí a necessidade em expô-la sob a argumentação de dois célebres pensadores alemães, Karl Marx e Friedrich Engels, que se tornariam marcos do pensamento humano a partir do Século XIX.
O sistema até então dominante, que segundo Marx e Engels, regulava a filosofia até aquele momento, baseava-se na filosofia hegeliana, codificando tudo que existia a uma metafísica dominante, uma consciência religiosa ou teológica, mesmo a crítica dos chamados “jovens hegelianos” era feita a partir de pressupostos conservadores, trocando uma forma de consciência por outra.
Não havia neste caso, discordância entre os “velhos hegelianos” que adotavam a ação universalizante, adotando a tríade – religião, conceitos e Universal – que a nova tradição adotava, apenas alterando o aspecto de relegar a uma consciência humana o papel demiúrgico, criando uma nova anátema de uma hermenêutica aprisionada em um sistema supra-humano.
A falta de compreensão acerca do seu próprio meio material, fez com que a filosofia alemã se distanciasse da realidade alemã em uma crítica limítrofe, faltando o senso de empirismo que corromperia o sentido extra-humano dogmático e demonstraria a evidência do homem enquanto sujeito, sendo o existir humano a primeira condição de toda história da humanidade.
Seguindo uma lógica evolucionista-naturalista, Marx e Engels, contemporâneos de Charles Darwin, e porque não dizer epígonos do pensamento jusnaturalista, claro que com uma complexa sofisticação, mas não se desprendendo dos valores naturais inalienáveis ao homem, agora correspondentes a uma base material que se transformava com o trabalho humano, conforme John Locke já havia mencionado em sua clássica obra, Dois Tratados Sobre o Governo.
Para Marx e Engels, torna-se inegável a condição humana de construir sua própria vida material, além da dependência dos indivíduos em relação as condições materiais da sua produção, diferenciando as diversas nações de acordo com o desenvolvimento das forças produtivas concernentes as mesmas, que serve como alicerce a uma estrutura interna, assim como o grau de desenvolvimento alcançado pela divisão do trabalho.
Atrelado a divisão do trabalho, encontram-se dicotomias como cidade e campo, industrial e comercial, etc., criando subdivisões que irão gerar sistemas de patriarcado, escravatura, ordens e classes, que são consequência de relações mais desenvolvidas entre nações, além de criar diferentes formas de propriedade e de relacionamento humano com a materialidade.
No tocante à propriedade, três formas são apresentadas a priori:
a) uma primeira forma apontada seria a denominada “tribal”, considerada como um estágio rudimentar de produção, tendo um sistema social patriarcal, com uma escravidão associada ao aumento de necessidades do grupo;
b) a segunda forma, a propriedade “comunal” e propriedade do Estado, correspondendo a um aglomerado de tribos – podendo se unir por diversos motivos como: conquista, contrato, etc. – que comporiam uma espécie de “cidade” na dita “Antiguidade”, como foi o caso da pólis grega, com propriedade comunal dominante e propriedade privada, mobiliária e imobiliária em desenvolvimento, com a evidência de um avanço da divisão do trabalho, assim como uma escravidão subsistente;
c) a terceira forma, chamada de “feudal” ou dos diversos estamentos, com expansão territorial por consequência de um desenvolvimento agrícola, com uma ordenação inspirada na organização militar germânica, criando nas cidades uma forma corporativa de agregar a concorrência serviu e distingui-la a partir do ofício, criando três categorias: artesão, companheiro e aprendiz. O marco feudal seria a propriedade fundiária, com divisões acentuadamente estamentais como foi o caso da separação entre reinantes, nobreza, clero e camponeses.
A partir das premissas expostas, percebe-se, ao contrário da tradição hegeliana, um desenvolvimento social alicerçado pelo progresso da produção material, onde os indivíduos constroem não sob um abstractu, mas através das condições reais de existência, tornando-se uma consciência que não extrapola o ser consciente.
Portanto, nosso caráter não é humano não é construído sob uma perspectiva extra-corpórea mas telúrica, findando o que Marx e Engels chamam de especulações e dando início ao que denominaram ciência real, positiva, que analisa a atividade prática, sendo evidenciada a influência de Auguste Comte na argumentação destes dois célebres autores, evidenciando parâmetros de uma construção epistemológica do Século XIX.
Referência Bibliografáfica:
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã. Introdução: Jacob Gorender tradução: Luis Cláudio de Castro e Costa. São Paulo: Martins Fontes, 1998. (Clássicos) p. 7-21.