A maconha (2000) - Fernando Gabeira
Há pessoas que afirmam que ela destrói o cérebro e conduz ao crime. Há escritores, como Carl Sagan e Baudelaire, que a consideram maravilhosa. Nos primeiros meses de 2000, cientistas da Califórnia chegaram à conclusão de que maconha dá câncer e cientistas ingleses concluíram que maconha cura câncer.
Enterrada em um velho túmulo chinês, em forma de sementes na tanga dos escravos negros ou de tecidos no corpo de uma garota egípcia, a maconha apareceu em toda parte, mas ainda assim não há acordo sobre ela. Alguns acham que ela surgiu há oito mil anos, a revista espanhola Cañamo garante que foi há cinco mil.
Talvez não seja possível definir precisamente quando a maconha entrou na história da humanidade, mas podemos acreditar que tenha surgido há muitos séculos, embora reconhecendo que em três mil anos de imprecisão fumam-se milhões de baseados.
As teses de que a maconha contribui para desmotivar as pessoas foram contestadas por pesquisas. O Grande livro da Cannabis, de Rowan Robinson, cita um trabalho feito na Jamaica, demonstrando que filhos de mães que fumam maconha têm desempenho melhor em dez das 14 características definidas na pesquisa, tais como vivacidade, robustez e orientação.
Em um livro de defesa da maconha, Marijuana not Guilty as Charged, David Ford cita o caso de um jovem trabalhador que era extremamente produtivo e deixou de sê-lo quando parou de fumar. Gabeira diz que "os efeitos mais comuns - relaxamento, alteração do humor e redução de agressividade, nos autorizam a afirmar que a maconha leva a um estado contemplativo. È uma experiência humana para muitos indispensável".
Obras que traçam a história da planta, localizam a maconha nas principais civilizações antigas. Na Índia por exemplo, a maconha está associada a Shiva, o criador do Yôga (os praticantes do mais antigo estilo -Swásthya- defendem que o Yôga é uma dança). Nietzche costumava dizer: "só creio em um Deus que saiba dançar", ele estava se referindo a Shiva. Jim Morrinson, vocalista do The Doors, também citava com frequência essa frase. A históra diz que Shiva teria brigado com a família e estaria vagando pelos campos quando, para buscar abrigo ao sol, parou sob uma planta de canábis, esmagou suas folhas e comeu. Uma crença hindu afirma que quem bebe canábis, bebe Shiva. "A alma em que o espírito da canábis encontra morada desliza para um oceano livre", diz uma antiga lenda indiana.
Existe um certo consenso de que a maconha retarda o orgasmo. Ela é acusada por seus adversários de reduzir a performance sexual e por seus defensores de ser uma erva afrodísiaca. Em quase todas as imagens em que aparece, Shiva está com o pênis ereto, que significa vitalidade. Alguns praticantes de yôga transformam o sexo em uma relação ritual e longa, que às vezes dura todo um dia. Nesse caso, o orgasmo não é o objetivo final, mas sim aumentar a sensação de unidade e cumplicidade entre os parceiros.
O fato de algumas pessoas que usam cocaína ou heroína terem utilizado maconha em algum momento, não comprova que a erva foi a culpada pelo uso de drogas mais pesadas. "A maioria dos fumantes de maconha se limita apenas a ela e, em alguns casos, apresenta um certo desprezo por drogas manipuladas quimicamente", ressalta Gabeira. È o caso dos Rastafaris na Jamaica, religião conhecida mundialmente por causa de seu mais famoso seguidor: Bob Marley.
Até hoje não foi localizado nenhum teste médico que tenha detectado males no cérebro provocado pelo uso da maconha, mesmo em fumantes mais assíduos. Essa idéia foi estimulada por descrições conservadoras dos fumantes como preguiçosos, apáticos, improdutivos e irracionais. Empregando o método mais atual, usando scanners, pesquisadores não conseguiram encontrar evidências de danos no cérebro de fumantes de maconha, e observe-se que alguns deles fumavam uma média de nove baseados por dia.
Os organizadores do livro Diamba, Sarabamba, Anthony Henman e Osvaldo Pessoa, acham que os usuários de canábis no Brasil, deveriam chamá-la de Diamba, porque não tem a carga negativa que os repressores conseguiram associar a maconha. No início do século vinte, alguns fumadores do Maranhão (Jamaica brasileira), substituíram a palavra "maconha", que já é de origem africana, por "diamba", da mesma origem.
As discussões em torno da maconha, ainda vão proporcionar um longo debate ao longo do milênio. E para encerrar pelo menos essa que começou a partir desse texto, vou encerrar com alguns versos de três poetas paraibanos, Zé Vicente da Paraíba, Braulio Tavares e Passarinho do Norte.
“Tem um verso que fala da maconha/que é uma erva que dá no meio do mato/ Se fumada provoca um tal barato/a maior emoção que agente sonha. A viagem as vezes é medonha/ dá suor/dá vertigem/ dá fraqueza/ mas porém quase sempre é uma beleza/ eu por mim experimento todo dia/ se eu tivesse um agora eu bem queria/pois a coisa é da santa natureza”.