Visita a Paris (extraído do livro Álbum de Recordações)

Cheguei a Paris, de ônibus, ao final de uma tarde ensolarada, de pouco calor. Procedia do Porto de Calais, onde embarquei em um "ferry boat" que atravessou o Canal da Mancha.

Eu estava ansioso. Temia a comunicação verbal em língua estrangeira. O idioma, aliás, era preocupação desnecessária. Esqueci que minha filha, nossa intérprete vinte e quatro horas, estava ao lado, se coçando para exercitar seu inglês impecável. Falar inglês na França é quase uma provocação; como não sabíamos francês, fomos salvos pelo inglês, idioma detestado pelos franceses.

Paris me conquistou à primeira vista. Eu era seu apaixonado de longa data. Sofri por todo o tempo em que não lhe declararei esse amor sem limites. Meu sofrimento acabara. Agora, estava prostrado a seus pés, ansioso para conhecer-lhe a intimidade. Paris, cidade luz!, exclamei introspectivamente. ‘Conhecer Paris ou morrer’, dissera o poeta. Escolhi a primeira opção. Naquela hora, ainda embevecido, fiz-lhe uma saudação enamorada: "bonsoir, mon amour"!

Paris é a mais bela cidade do mundo, fundada na principal ilha do rio Sena, remotamente habitada por pescadores da tribo dos Parísios. No tempo do imperador Tibério, Paris chamava-se Lutécia.

Peço vênia ao leitor para contar-lhe esta fascinante etapa da excursão. Ao descrever passeios e visitas, reportar-me-ei às anotações pessoais, às lembranças marcadas por agradáveis acontecimentos e à ajuda de fotografias, vídeos e livros pesquisados.

Eis o meu relato:

A beleza arquitetônica da capital deve muito ao rei Luis XIV. O monarca iniciou a transformação urbanística da cidade alargando ruas, construindo bulevares e demolindo casas para dar lugar a pontes sobre o rio Sena, com o objetivo de revigorar-lhe as artérias, deixando como o conhecemos hoje: exuberante!

Napoleão I achava que a arquitetura não existia sem a urbanização. Portanto, mandou construir novas pontes, mercados, cais, grandes avenidas, igrejas e prédios públicos. Foi assim que nasceu o famoso bairro Saint-Germain.

Durante o city tour panorâmico, o guia mostrava lugares, avenidas, prédios e monumentos, contando-nos histórias de épocas remotas. O ônibus estava lotado de turistas mexicanos, japoneses, alemães e brasileiros. Uma pequena Babel.

Nesse périplo turístico, conhecemos a Casa dos Bispos; as autoridades eclesiásticas de antigamente exerciam grande influência política. Passamos em frente à casa de Victor Hugo, autor de “Os Miseráveis”, obra do século XIX; pela Praça das Execuções, local de sacrifício das bruxas durante a Inquisição; e pela Prisão da Revolução, palco do suplício de Maria Antonieta, a última rainha da França, guilhotinada em 16 de outubro de 1793.

Vimos o prédio da Sorbonne, bastante conhecido do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que ali lecionou durante exílio político, na era da ditadura militar brasileira.

Passamos pelo lugar da filmagem de “O Último Tango em Paris” e pelo túnel onde a princesa Diana morreu em agosto de 1997.

A Conciergerie era uma parte do palácio real, sob as ordens do “concierge” ou porteiro-mor do rei. Assim é conhecido o edifício que exibe a torre do relógio, este, o mais antigo de Paris, instalado em 1370, e a torre Bombec, onde os prisioneiros eram torturados. Ouviam-se gritos e gemidos dos presos a distância.

Durante a revolução, foram prisioneiros na torre Bombec 4.174 pessoas, entre elas a rainha Maria Antonieta. Em passeio pelo rio Sena, vimos o edifício do palácio e ouvimos pelo áudio da embarcação a história de horrores acontecidos no palácio La Conciergerie.

Caminhamos pela Praça da Concórdia, a maior de Paris, construída entre 1754 e 1763. Ali foram executados na guilhotina 1.119 condenados, entre eles o rei Luis XVI. Em 1839, depois de sucessivas mudanças de nome, passou a chamar-se como hoje é conhecida – Praça da Concórdia.

Também conhecemos a Igreja da Madeleine, dedicada por Carlos VIII à Santa Maria Madalena. O templo é em estilo grego, sustentado por cinqüenta e duas colunas em formato coríntio, assemelhando-se ao Panteão, edificado por Vespesiano Agrippa em 27 a.C., em Roma.

Naquela manhã, ainda passeamos pela Avenida Champs Elysées e pelo Arco do Triunfo, dos quais falarei mais adiante, reservadamente, por deferência à exuberância e ao glamour desses inesquecíveis pontos turísticos.

À tarde, fomos a Versalhes, o lindo palácio transformado por Luis XIV em residência oficial. Inicialmente, fora construído para ser modesta residência do rei Luis XIII em suas temporadas de caça.

A corte mudou-se de Paris para distanciar-se do movimento antimonárquico que resultou na Revolução Francesa.

Falar de Versalhes é um raro prazer, mesmo conhecendo apenas seus lindos, maravilhosos e inigualáveis jardins. Fomos impedidos de vê-lo internamente, em face da exigüidade de tempo.

Em julho, a Europa está superlotada de turistas do mundo inteiro. As ruas ficam apinhadas de gente, o trânsito intenso, os hotéis e restaurantes lotados, os museus com filas quilométricas…

Nessa época do ano, pelas ruas de Paris circulam um milhão de turistas por dia, em média. Em Versalhes, a multidão formava fila gigantesca para conhecer a beleza interna do palácio.

Restou-nos a rica visão exterior dos edifícios, esculturas, fontes, árvores, flores e o intenso verde de seu magnífico jardim. Aceitamos o desafio de conhecê-lo em todo seu esplendor.

Fotografamos esculturas, monumentos artísticos, canteiros de flores e fontes de águas cristalinas. Tudo disposto em imenso tapete verde, sob as vistas do deus grego Apolo, símbolo do equilíbrio e da ordem, guardião do que vimos enlevados, maravilhados, arrebatados.

Foi assim que nos sentimos nos Jardins de Versalhes. O cansaço não nos impediu de percorrê-los, animados e satisfeitos.

Apesar de forte chuva caída ao final da tarde, a grande multidão de turistas continuava a passear pelos maravilhosos bosques e gramados.

Ao cair da noite, visitamos a Praça do Tertre, situada em colina de quarenta e cinco metros de altura. Caminhamos por ruas íngremes, até embarcarmos no “funicular”, elevador panorâmico sobre trilhos, sustentado por cabos de aço e acionado por força motriz.

Desembarcamos em frente à basílica do Sacré-Coeur. Do pátio, avistamos Paris fulgurante, em toda sua grandiosidade, convidando-nos para um encontro inesquecível.

Como evitá-lo?

Impossível!

Naquela hora, estávamos em Montmartre, pitoresco lugar freqüentado por Delacroix, Van Gogh e famosos boêmios de uma época pródiga em intelectuais e gênios da mais alta estirpe. Dizem que não conhecerá Paris, aquele que não for a Montmartre para ver obras de artistas contemporâneos expostas nas ruas estreitas, freqüentar restaurantes característicos e deslumbrar-se com a beleza aconchegante de “la butte”. Jantamos ali, em um lugar acolhedor, servidos de lauta refeição, acompanhada de vinho nacional. Sim, vinho “nacional”. Na França, os vinhos nacionais são de qualidade superior.

Em Montmartre, conhecemos o interior da basílica do Sagrado Coração (Sacré-Coeur), concluída em 1889 em pedra de Château-Landon, material que em contato com a água da chuva verte uma substância calcária branca, dando ao edifício um aspecto permanente de alvura. Uma limpeza natural. A basílica mede 85 metros de comprimento, 35 de largura e 83 de altura. No seu interior encontram-se representações do Sagrado Coração, de Santa Joana d’Arc e de São Luis, obras que enriquecem o patrimônio cultural francês.

No segundo dia de excursão, realizamos inesquecível passeio pelo Rio Sena, em confortável embarcação. Pelo rio navegam dezenas de barcos lotados de turistas ávidos por descobrirem Paris, ornamentada por edifícios antigos e paisagem agradável.

Navegamos a bordo do Bateaux-Mouche, embarcação da companhia que adotou o nome dos pequenos transportes de mercadorias do século XVIII. Criada em 1949 por Jean Bruel, os barcos de Les Bateaux-Mouches já transportaram mais de cem milhões de turistas pelo rio Sena.

No percurso, margeamos lugares famosos, impregnados de história. Como disse, o turista vai lentamente conhecendo Paris. Um belo passeio!

Desembarcamos do Bateaux-Mouche, satisfeitos com o agradável trajeto realizado. Aproveitando o tempo, fomos conhecer a magnífica Torre Eiffel, símbolo que evoca Paris. O Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, e a Estátua da Liberdade, em Nova York, rivalizam com a bela Torre.

A obra lembra ao turista que os monumentos da cidade são legados da genialidade de arquitetos e construtores como Gustave Eiffel, engenheiro ousado e competente que a concebeu e a pôs de pé no distante ano de 1889, para que o Coliseu em Roma e as Pirâmides no Egito não se sentissem isolados.

Dezoito mil peças metálicas, unidas por dois milhões e quinhentos mil rebites, sobre quatro grandes pilares de concreto sustentam a estrutura de dez mil toneladas.

A torre dispõe de três estágios de observação. O primeiro, a cinqüenta e sete metros; o segundo, a cento e cinqüenta e cinco; e o último, a cento e setenta e quatro, cada qual proporcionando uma vista panorâmica sem obstáculos.

Tiramos dezenas de fotos para memória de um acontecimento ímpar em nossas vidas. Todos os companheiros de viagem por certo foram fotografados junto à Torre Eiffel, o maior símbolo turístico de Paris.

Na tarde do dia 05 de julho transpomos os portões de entrada do Museu do Louvre.

O prédio do museu conta com quinze quilômetros de extensão linear. Foi construído pelo rei Filipe Augusto por volta de 1200, objetivando proteger o tesouro e os arquivos do Estado. Duzentos anos depois, Carlos V utilizou a fortaleza, após ampliá-la e transformá-la em residência oficial.

Francisco I demoliu o antigo edifício e ali ergueu um novo palácio, cuja continuação contou com os auspícios do rei Henrique II. Após o falecimento do rei, a rainha Catarina de Médici deu continuidade ao projeto, construindo o palácio Tulherias, anexando-o ao Louvre.

Aos poucos, a majestosa edificação se agigantou para, hoje, ser acessível aos nossos desejos artísticos. A ampliação da obra prosseguiu no reinado de Henrique IV e no dos seus sucessores: os reis Luis XIII e Luis XIV. Finalmente, o edifício do Louvre foi concluído com a face de sua arquitetura atual. Em 10 de agosto de 1793, tornou-se definitivamente um museu. Este que iremos conhecer.

O Louvre, um dos maiores museus do mundo, não pode ser visitado em uma única tarde. Para acessar milhares de obras dispostas em grande área de exposição, seriam necessários alguns dias de árduos esforços. Não era o nosso caso. Conformados com a limitação temporal, partimos para uma visita passageira, atenta e bem orientada.

O entusiasmo nos contagiou logo na entrada, em forma de pirâmide, erguida no pátio Napoleão. Trata-se de área relativamente recente, construída há pouco menos de vinte anos. As pirâmides são em vidro transparente, com seus ápices apontando para o alto, confirmando a grandiosidade do que nos aguardava no interior do magnífico museu.

Vimos arte em profusão. Mesmo conhecendo o Metropolitan Museum de Nova York, mais ou menos semelhante, ainda sentimos forte emoção ao vê-lo.

Descrever as extraordinárias obras que vi, contempladas com admiração e respeito, não é tarefa possível a um mero observador como eu. Todavia, citarei algumas que nos foram mostradas naquela tarde, gravadas na memória em perpétua e agradável lembrança. São elas: O Rapto das Sabinas, de Nicolas Poussin; A Liberdade, manifesto político de Eugène Delacroix; A Virgem das Rochas, de Leonardo da Vinci; e Mona Lisa, La Gioconda, obra consagrada de Leonardo da Vinci e objeto de crítica dos maiores especialistas em arte do mundo.

Da Vinci teria sido inspirado por uma jovem mulher florentina, esposa do nobre Francisco Del Giocondo. Daí o seu nome. Há quem diga que Mona Lisa é autoretrato do autor que seria homossexual. Acredito na primeira hipótese.

Hoje, para ver La Gioconda, o visitante depara-se com forte proteção de vidro blindado. A obra é vista à distância, separada por grade que inibe a aproximação do observador. A segurança é justificada. Em 1911, a tela foi roubada e somente recuperada dois anos depois, em Florença, na Itália.

Não só de pinturas se compõe o Louvre. O gigantesco acervo artístico do museu também contempla esculturas, jóias e objetos do mundo antigo. Exemplares trazidos da Grécia, Egito e Itália, encontram-se em seus pedestais de granito. Parecem dizer a quem os ontempla: “somos o retrato de uma época distante, de grandes mestres das artes!”.

O Museu do Louvre está indelevelmente gravado na memória de quem o conhece. É lamentável que não nos tenha sido permitido usar o potencial de nossas máquinas fotográficas para registrar tamanha beleza. Mesmo assim, algumas fotos foram tiradas sem o uso do flash.

No terceiro dia de excursão, visitamos a Catedral de Notre-Dame, construída entre 1163 e 1330. Cento e sessenta e sete anos para concluí-la.

Entre 1841 e 1864, passou por profunda restauração para corrigir danos decorrentes da ação do tempo e por estragos provocados pela Revolução Francesa. Mais vinte e três anos de trabalho.

Na oportunidade de nossa visita, parte das laterais passava por restauração Grandes monumentos são revisados periodicamente para que a bela aparência seja mantida e a história permaneça viva em nossas memórias.

Notre-Dame foi palco da coroação de Napoleão I e chegou a ser utilizada em culto à deusa pagã Razão, por ordem do revolucionário e magistrado francês, Maximilien François Isadore Robespierre, que instituiu a sua veneração. Finalmente, foi reconsagrada à fé cristã em 1802.

Os magníficos portais da catedral são em estilo gótico. A porta principal representa, entre outras gravuras, o Juízo Final. Os portões de Notre-Dame são impressionantemente maravilhosos. Neles podem ser contempladas esculturas de Cristo e imagens representando o vício e as virtudes, o Paraíso e o inferno. Em toda a fachada existem estátuas de santos católicos, reis, anjos e outras figuras celestes.

Impressionam as dimensões da catedral: 130 metros de comprimento, 50 de largura e 35 de altura. O espaço é suficiente para acomodar nove mil pessoas. A igreja é dividida em cinco naves, suportadas por pilares de cinco metros de altura.

As capelas são ricas em obras de arte dos séculos XVII e XVIII. Vejam-se as de Saint-Denis e Saint-Madeleine. Às margens das naves, exuberantes túmulos de personalidades nobres e eclesiásticas estão expostos à visitação pública. No altar-mor, entre as esculturas de Luis XIII e Luis XIV encontra-se a magnífica obra de Nicolas Coustou, La Pietá.

Descrever a arte e a beleza da Catedral de Notre-Dame é trabalho gratificante e árduo. Não sei descrevê-las merecidamente. Desculpe, o leitor.

Na última tarde em Paris, depois de visitarmos bom número de lugares interessantes, fomos passear pela Avenida Champs Elysées, renomado bulevar, largo, arborizado e buliçosamente inquieto, resultado de intenso trânsito de veículos e pedestres, muitos deles turistas como nós, em visitação a elegantes lojas de departamentos, cafés e restaurantes.

A Avenue des Champs Elysées, a mais bela do mundo, estende-se do palácio do Louvre ao Arco do Triunfo, passando pelo jardim das Tulherias e Praça da Concórdia, seguindo pelo bairro de La Défense.

As calçadas são largas e convidativas a boas caminhadas rumo ao prazer de contemplar o Arco do Triunfo, monumento erigido por Napoleão I em 1806, para dedicá-lo à Grande Armada.

O Arco do Triunfo, concluído em 1836, mede cinqüenta metros de altura e quarenta de largura, superando em grandeza o Arco de Constantino, em Roma. Em suas paredes estão registradas importantes vitórias napoleônicas e inscritos os nomes dos 558 generais do glorioso exército do líder militar francês.

Na parte superior, encontra-se o túmulo do Soldado Desconhecido, em homenagem a valorosos combatentes mortos na II Grande Guerra.

Encerramos nossa estada em Paris sem visitar os templos dos grandes espetáculos: Lido e Moulin Rouge, famosos cabarés que apresentam o showbiz, encantando multidões. Prometi-me conhecê-los da próxima vez.

Desfilamos pelas ruas centrais, estivemos nas escadarias da Opéra, o maior teatro lírico do mundo, efetuamos gastos na Galeria Lafaiette, local onde minha esposa e minha filha atiraram-se às compras num frenesi de gastança jamais igualada. Os nossos poucos euros sumiram num passe de mágica.

Aproveitamos sem parcimônia o metrô de Paris. As composições chegam a dezenas de carros lotados de pessoas que fazem ligação de casa para o trabalho, incluindo turistas, como nós, econômicos e aguerridos aventureiros. Sim, andar no metrô, consultar as linhas disponíveis, desconhecendo o idioma local foi agradável aventura. Estivemos em diversas estações: Champs Elysées, Cité, Concorde, Files de Calvaire, Liberté, Louvre e Opéra. Ser transportados em táxis era dispendioso. O metrô nos ajudou bastante: em rapidez e economia.

Despedimo-nos de Paris sem a saudade embargar as nossas vozes. Ainda voltaríamos à Cidade Luz para visita de um dia, antes de retornarmos ao Brasil, procedentes da Itália.