Nova versão primitiva
Se tomarmos como base a teoria evolutiva defendida pela ciência, boa parte dos nossos instintos ainda em uso podem ser perfeitamente identificáveis em nossos ancestrais da linhagem primata. Uma análise das nossas origens é sempre válida, principalmente se quisermos realmente encontrar explicações para dúvidas que continuam a intrigar a humanidade.
A segunda versão do filme “Planeta dos Macacos” é uma boa oportunidade para pensarmos um pouco sobre a origem da nossa espécie e os rumos que a levaram a ser a mais cruel e violenta entre todas as demais. Na ficção, que se passa por volta do ano 2030, o ser humano já se encontra em um estágio avançado em sua conquista fora da Terra, com experiências que incluem treinamentos de macacos para pilotagem de naves de reconhecimento do espaço.
Uma viagem forçada de um militar norte-americano à procura de um dos macacos da missão da qual participava o faz cair em um planeta aparentemente primitivo, mas com uma característica absolutamente estranha para a sua lógica: lá os macacos falam, pensam e comandam. Os humanos é que são considerados sub-raça e, por isso, tidos como animais irracionais e tratados como escravos.
Ao perceberem que aquele humano é diferente dos demais exatamente por sua força proveniente da razão, os governantes do Planeta dos Macacos o consideram perigoso e um risco à sua segurança. Para os humanos cativos ele é uma espécie de salvador, de ser evoluído, de guia para sua libertação. Questionado por uma macaca simpática à causa humana sobre o seu planeta de origem, o militar a surpreende o descrevendo como um lugar devastado pelo próprio homem, pela crueldade e sede de poder – frutos de sua evolução racional. Disse ainda que lá os macacos viviam em jaulas e eram os seres inferiores.
O filme traz, em linhas gerais, os rumos trilhados pela humanidade ao longo dos milhares de anos no posto de comando. Nele é possível entendermos que todas as formas de violência que ainda testemunhamos neste novo milênio nada mais são do que versões sofisticadas da nossa natureza primitiva.
Um outro filme – apontado como um clássico do gênero ficção científica – conseguiu com simplicidade e perfeição explicar esse lado de nossa história. Em “2001: uma Odisséia no Espaço”, uma cena sutil consegue traduzir com maestria a evolução do poder na sociedade humana. Macacos reunidos em um pequeno grupo tomam conta de uma área recém-encontrada, com água e comida. Eis que aparece um outro grupo disposto a ocupar o mesmo lugar. Os supostos líderes de cada um entram em confronto para decidir quem deveria ficar e quem deveria sair. A força física de ambos torna a luta equilibrada e com ares de que será longa e sem vencedor. No entanto, um pequeno detalhe faz a diferença: num lapso de “razão” um dos macacos vê num grande osso jogado ao chão um diferencial naquela disputa. Ele o apanha, empunha como uma arma e desfere na cabeça do adversário um golpe mortal. O osso, então, é lançado para o alto, vindo a “se transformar” numa nave espacial, numa cena que sugere um salto no tempo.
Subentende-se que todas as conquistas tecnológicas do homem entre um momento e o outro são apenas evoluções de suas armas. Neste sentido, qual a diferença entre o osso na mão do macaco e as armas nucleares nas mãos dos mandatários de nosso tempo? Inventamos explicações racionais mirabolantes para justificar nossas atitudes violentas e cruéis; todas elas com o claro objetivo de alcançarmos algum tipo de poder sobre o outro. Continuamos como versões primitivas de nós mesmos.