Marley, eu e todos os sensíveis
“Um cão não precisa de carros modernos, palacetes ou roupas de grife. Símbolos de status não significam nada para ele. Um pedaço de madeira encontrado na praia serve. Um cão não julga os outros por sua cor, credo ou classe, mas por quem são por dentro. Um cão não se importa se você é rico ou pobre, educado ou analfabeto, inteligente ou burro. Se você lhe der seu coração, ele lhe dará o dele.”
O trecho acima foi extraído do livro (que deu origem ao filme de mesmo nome) “Marley & Eu”, do jornalista e escritor estadunidense John Grogan. Com tema cotidiano e absolutamente recorrente, o que fez esta obra autobiográfica virar best-seller e um tremendo sucesso no cinema em 2008 foi a sua leveza e universalidade.
Milhões de pessoas nos quatro cantos do planeta têm em seus lares a prazerosa companhia de cães, gatos e outros animais de estimação. Os que não a têm normalmente fazem uma ideia errônea e preconceituosa sobre estes companheiros ou desconhecem completamente a sua dimensão.
Na versão cinematográfica de “Marley & Eu” John Grogan é vivido pelo ator Owen Wilson, enquanto sua esposa Jenny é interpretada por Jennifer Aniston, a eterna Rachel de Friends. Como sei que a indústria cinematográfica também possui seu elenco de animais adestrados, não poderia deixar de citar a atuação perfeita do verdadeiro protagonista desta belíssima história: o cão labrador que encarna o atrapalhado e inquieto Marley.
Mais do que uma simples resenha, este texto é um convite para que todos que o estejam lendo possam reservar algum tempo para, ao menos, assistir ao filme. Sua história, de tão comum, poderia ser a de qualquer um de nós. Crises na profissão, a formação da família, a incerteza quanto ao futuro e o surpreendente poder do acaso, que faz aparecer em nossas vidas amigos de quatro patas com tanto para nos ensinar (no meu caso, dois irmãos felinos – Thor e Bial – cheios de pureza e vivacidade).
Vendo o filme recentemente pude fazer uma viagem ao meu passado, trazendo de volta todos os animais de estimação com os quais convivi direta ou indiretamente: o gato preto Veludo (meu inseparável amigo da segunda infância); o cão pequinês Kiko (que, dos 12 aos 25 anos, foi tão presente na casa dos meus pais e me fez saber de verdade o que é ter um amigo canino); o pinscher Ulisses Loreley (cãozinho de um grande amigo potiguá que marcou minha passagem por Currais Novos-RN, em 1992, batizado com tal nome em homenagem a dois personagens de Clarice Lispector); o gato Chumbinho (que também é uma referência à minha estada em Araraquara-SP em 1997); o gato Tom Zé (que ganhei quando morei em Ouro Preto, em 1999, e que tive que doar depois que fui embora); os irmãos cocker Lola, Lilica e Pepe Legal (com os quais passei quase três anos após meu retorno a Viçosa-MG, em 2000, no apartamento dividido com os amigos André e Fabiano); Tom (o gato-com-alma-de-gente, pertencente à minha esposa Luciana, e que enche de alegria a casa dos meus sogros Assis e Neuza); e, finalmente, todos os gatos, cachorros e demais bichos de estimação do sítio de tia Zezeca, em Cajuri-MG, com os quais tenho o prazer de conviver de vez em quando.
Essa lista é formada apenas por aqueles com os quais, de forma longa ou breve, pude aprender um pouco mais sobre amor gratuito e dedicação desinteressada. Às vezes também me deparo com cães de rua, que, com um simples olhar que eu ofereça, retribuem com um balançar da cauda, como querendo dizer que estão prontos para dar e receber carinho e atenção.
Deixo, então, a todas as pessoas sensíveis (quisera poder também fazer chegar aos insensíveis...) mais uma frase de John Grogan, inspirada nos treze anos de convívio com seu Marley (a propósito, seu nome é, sim, uma homenagem ao ícone do reggae jamaicano Bob Marley): “(...) É realmente muito simples, mas, mesmo assim, nós, humanos, tão mais sábios e sofisticados, sempre tivemos problemas para descobrir o que realmente importa ou não. (...) Às vezes, é preciso um cachorro com mau hálito, péssimos modos e intenções puras para nos ajudar a ver.”