SPNOZA E A TRIPLA ILUSÃO DA CONSCIÊNCIA & ETNOGRAFIA
Este texto objetiva discorrer de forma argumentativa associando o texto “Spnoza e a tripla ilusão da consciência” com o conteúdo Etnografia e consciência social.
Após exposto, começo por dizer que “a tripla ilusão da consciência”, de início causa estranhamento. Isso porque, nos choca a ponto de descontruir conceitos que interiorizamos desde o berço até o que somos hoje.
A primeira ilusão da consciência é a do livre arbítrio, que Spnoza coloca como “causas internas e externas” que nos leva a desejar. Isto é, pensamos que somos livres em escolha, mas na verdade, o que há é uma indução externa que aceitamos como “verdade absoluta”, interiorizamos e a partir daí, fazemos nossas escolhas. Estas que nos moldam e influenciam diretamente em nossas ações.
A segunda ilusão é a da finalidade, que é exposta por Spnoza como a ilusão do ser humano em dar uma finalidade, um “propósito a tudo” e, nessa passagem o autor utiliza o exemplo da natureza. Esta que segundo ele não precisa de finalidades, uma vez que sua existência é porque suas energias, forças, corpos dos mais variados tamanhos e natureza estão em incessante interação. Isto é, a natureza existe pela mesma forma que funciona e existir é igual a interagir. Nós, seres humanos agimos com finalidades conscientes, com algum projeto que visamos alcançar.
A terceira ilusão é de certa forma para muitos, chocante, pois bate de frente com que interiorizamos desde de nossa existência. O chamado bem e mal, bom e ruim, céu e inferno, dentre outros. Isto é, esta ilusão traz a questão Teológica. E para exemplificar, Spnoza baseia-se novamente no exemplo da natureza. Pois segundo o autor o ser humano utiliza fenômenos resultantes da ordem natural do universo para classifica-las como “boas” ou “más”. Nessa terceira ilusão, Spnoza explica que o homem utiliza a água, frutos, alimentos, climas amenos, etc. Como sendo coisas boas e os terremotos, furacões, doenças, secas, venenos, etc. Como sendo más. Isto é, o homem já desde a.c. implantou essa concepção dual para limitar o ser humano em suas escolhas. Pois, determinando o que é “bom” ou “mal” conseguem “controlar” um determinado grupo. Exemplifico esse exposto com o início da história do Brasil, principalmente no que se refere ao catolicismo.
Quando os portugueses invadiram o Brasil, por volta de 1500 d.c. trouxeram consigo sua etnia, que tinha sua base principal no catolicismo. Ou seja, a crença do céu e inferno, pureza e pecado, deus e diabo, etc. Mas sucede que os portugueses ao chegarem no Brasil se depararam com uma outra etnia “Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas.” (Biblioteca nacional. A carta de Pero Vaz de caminha . Pag. 2). Segundo Caminha os índios era um “povo que não conheceu o pecado original”. Mas ele estava enganado, pois associava de forma errônea o pecado somente a questão da nudes, que para eles surgiu com Eva e Adão. E quando começaram a observar os rituais antropofágicos dos índios, perceberam o quão estavam enganados. Aliás, índio é o nome dado pelos portugueses. Porque como estes estavam indo em direção à Índia e “toparam” com um povo na Ilha de Vera Cruz, atualmente Porto Seguro, resolveram então chamá-los de índios.
Diante de toda essa diferença étnica entre o índio e o europeu. A solução para que os portugueses dominassem esse povo era força-los de forma brutal a desculturação e a introdução de uma “nova cultura”. Com isso, inicia-se o “genocídio no Brasil”. Pois, aquele que não se rendia a “nova religião” era exterminado e os que aceitavam, tornavam-se escravos. Sem deixar de mencionar as índias, que eram estupradas pelos europeus. Com isso, não é exagero afirmar que o primeiro mestiço nascido em terra brasileira, pode ter sido fruto do estupro de uma índia por um português.
Parto da Etnia para entrar na Etnografia, que segundo antropóloga Mariane Pisani a Etnografia é um método utilizado pela antropologia para a coleta dos dados. Ela se baseia no contato do(a) antropólogo(a) com os grupos que procura estudar, seja este um grupo indígena ou qualquer outro grupo social, no qual o(a) pesquisador desejam se inserir.
A etnografia inicia-se a partir do trabalho de campo. Este é o momento em que o(a) antropólogo(a) se desloca física ou geograficamente para o lugar no qual o grupo que será analisado ou estudado se encontra.
Esse deslocamento pode ser para outro país, outro estado ou mesmo no bairro vizinho.
O trabalho de campo se dá por meio do contato intenso e prolongado que pode durar de meses a anos. Existe casos de antropólogos que realizaram etnografia com o mesmo grupo por mais de 40 anos. E é esse contato prolongado que permite ao(a) antropólogo(a) observar mudanças sociais e estruturais naquele grupo. Assim, a pesquisa fica muito mais consistente. É a partir desse contato intenso e prolongado do pesquisador com a cultura do grupo estudado que ele poderá a começar a compreender como funciona os sistemas de significados culturais do "outro".
Foi o antropólogo Bronislaw Malinowski em seu livro Os argonautas do pacífico ocidental, publicado em 1922 que marcou a história da antropologia moderna ao propor uma nova forma de etnografia, envolvendo detalhada e atenta observação participante. Apesar disso, o Malinowski nunca utilizou o termo "observação participante". Que é uma ferramenta da etnografia onde o pesquisador participa da vida, dos hábitos e costumes do grupo estudado. Um antropólogo, portanto, não pode fazer uma etnografia de longe ou de fora. Ele tem que fazer uma pesquisa de perto e de dentro. Isto é, se o pesquisador for estudar uma tribo indígena no alto Xingu , por exemplo. Ele precisará caçar junto com os índios, plantar, colher, comer, dormir, participar de atividades cotidianas e rituais religiosos. Pois na antropologia o conhecimento é produzido através da observação e da participação do(a) antropólogo(a). O(a) etnógrafo(a) observa as diferenças da sociedade, desde o modo de andar e usar seu próprio corpo até a celebração de um casamento ou de um funeral, por exemplo.
Cabe aos antropólogos descrever e analisar a vida social de um povo e de um lugar, observar principalmente o que esse povo diz de si mesmo e o modo como identifica as outras pessoas daquele conjunto.
Além da antropologia, métodos de pesquisa etnográfica são utilizados por diferentes áreas, como a sociologia, a psicologia e até mesmo designer. Mais recentemente, grandes empresas ao tentar entender melhor seus clientes e consumidores começaram a utilizar pesquisa etnográfica como modo de avaliar o mercado.
Dessa forma, podemos dividir em quatro momentos o fazer etnográfico:
A preparação: É preciso entender o contexto político e se familiarizar com o sistema e a história do grupo a ser estudado; estabelecer objetivos iniciais de pesquisa e elaborar as perguntas. por fim, obter acesso e permissões para realizar entrevistas e observações.
O estudo: É o principal momento da etnografia, é onde o antropólogo realiza o contato direto com o grupo que será estudado e tem-se os seguintes objetivos nesse momento: realizar observações e
entrevistas; recolher dados objetivos e subjetivos de modo quantitativo e qualitativo; seguir todas as pistas que surgirem durante a etnografia. Por fim, registrar as observações em um caderno de campo.
A análise: Permite ao antropólogo extrair conclusões do estudo que foi realizado, das observações, do que fora registrado no caderno. Algumas dessa etapa são: organização dos dados, filtrar e interpretar os dados; redefinir, se necessário, os objetivos da pesquisa.
A especificação: É o momento que o(a) antropólogo(a) irá produzir o material que foi observado e esse material pode ser um artigo, uma monografia de conclusão de curso, uma dissertação ou até mesmo uma tese.
Portanto, a etnografia é um dos mais importantes recursos contra o racismo e a hegemonia cultural , na medida que se estabelece meios de se realizar uma crítica ao etnocentrismo. E traçando uma relação do texto de Spnoza com a Etnografia, vimos o quão somos resultados de um processo de desconstrução cultural e a todo instante o meio externo nos induz a escolhas que acreditamos serem de livre arbítrio. Também procuramos uma finalidade em tudo para que nos confortemos com que nos é dado. Por fim, temos a ilusão Teológica e esta refere-se principalmente as nossas crenças e religiões. O problema é quando essa ilusão faz com que o homem acredite que sua crença e/ ou religião é superior as demais e passa de étnico a etnocêntrico. Um exemplo claro dessa incorporação etnocêntrica é o caso televisionado constantemente em que pastor quebra imagem de santa. Ou seja, incorporam sua religião como sendo única e verdadeira e tentam desconstruir as que são diferentes da sua, assim como aconteceu no início da invasão ao Brasil.
Contudo, mesmo diante dessas consciências de ilusões é de suma importância que pensemos na etnografia como consciência social. Respeitando as diferenças e escolhas de outrem.
REFERÊNCIAS
FERREIRA, Amauri. Espinosa, filosofia prática. Tradução: Tomaz Tadeu. Editora. Autêntica. Ed. brasileira, 2007.
Biblioteca virtual de Direitos Humanos. Declaração dos Direitos da Criança - 1959. Disponível em: https://www.amauriferreira.com/. Acesso em 09 de Mai. 2018.
Hegemonia cultural é um conceito formulado por Antonio Gramsci para descrever o tipo de dominação ideológica de uma classe social sobre outra, particularmente da burguesia sobre o proletariado, o que se manifesta, por exemplo, quando os interesses da alta burguesia de um país são identificados aos interesses de toda sociedade do país ou quando a historiografia se concentra apenas em grupos ou indivíduos de elite. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Hegemonia_cultural
O Parque Indígena do Xingu engloba, em sua porção sul, a área cultural conhecida como alto Xingu, formada pelos povos Aweti, Kalapalo, Kamaiurá, Kuikuro, Matipu, Mehinako, Nahukuá, Naruvotu, Trumai, Wauja e Yawalapiti. Povos Indígenas no Brasil. Xingu. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Xingu
PISANI. Mariane. YouTube. O que é Etnografia e como fazer? – Antropológica. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?reload=9&v=H-pAVymWhYo.
Busca Escolar. Bronislaw Malinowski. Disponível em: http://www.buscaescolar.com/sociologia/bronislaw-kasper-malinowski/