O BAIO e os encantamentos  (dedicado ao Poeta Jacó Filho e outros poetas amigos do Recanto)


Equideocultura: manejo e alimentação


A terra era seca, mas, inusitadamente vingava feliz desabrochando pequenas flores, algum mato, só que nenhum grão brotava. O povo de pés cheios de calosidades, barriga vazia e uma fé imensa no coração já não suportava mais tanta estiagem, tanta seca,  os animais murchavam tal qual os filhos gerados sem controle naquele chão, muitas covas, lágrimas secas e oração eram o sustento daquela gente, pois flores alegravam os olhos, mas, não há perfume que acalme a dor no estômago.
 
Jacó, sua mulher Esther e sua penca de filhos, Luiz, Maria, Martha, Antonio, Fábio e José, uma escadinha que ia de quatorze anos aos seis meses, respectivamente. Ele e a esposa ainda eram muito jovens na faixa dos trinta anos, mas, a força que os unia e mantinha a família unida vinha de Deus. Já haviam passado tanto nesta vida em tão pouco espaço de tempo, que o surreal era considerado felicidade, até o aparecimento de um belo cavalo baio marrom claro. Não sabiam de onde o animal vinha, mas, parecia querer ficar ali. Pobre baio, ele era bem nutrido e logo iria embora, quando se apercebesse de que por ali não havia alimento. Só que o baio não ia embora, ninguém o via comendo alguma coisa ou procurando água, ficara a semana toda rondando o casebre de barro socado, como que observando a família, era um animal muito dócil.

Domingo o dia estava tão quente, as crianças menores reclamavam de fome, os mais velhos apenas oravam. Jacó e Esther além de rezar não tinham mais forças, pois o pouco de conseguiam na terra fustigada ia para os filhos e para os animais restavam o resto de palma ou mandacaru, mas, era pouco demais, todos os ainda viventes definhavam sob aquele Sol inclemente.

Jacó e família estavam na porta de casa se abanando ao final da tarde, quando o Sol não fritava mais o solo, quando perceberam um movimento diferente do baio. Ele batia as patas dianteiras no chão em espaços pequenos, era até engraçado, pois o fazia com uma alegria no olhar, o que fez sorrisos até já esquecidos se abrirem nos rostos emagrecidos.

Poucos minutos depois, nos pontos onde o baio sapateara os seus cascos, começaram a brotar raízes aparentes, caules e folhas. Como por um milagre, um laguinho do tamanho de uma caixa d’água grande surgiu com água cristalina e uma hora além do início da hora das preces noturnas, o que era raiz, caule e folhas se transformada numa pequena plantação, com macaxeira, couve, almeirão, uns pezinhos de abóbora e um pé de maçãs todo carregado.

A rapidez com que os joelhos caíram ao chão até os feriram, mas, nada sentiram porque a benção era muito gratificante. Correram para colocar palma picada com almeirão e algumas maçãs para as poucas cabras, a mula velha e o baio, enchendo também baldes com água para eles. Esther pegou uma maçã para si, rapidamente, colheu algumas couves e um pouco de macaxeira para preparar uma sopa grossa, enquanto Jacó e os meninos comiam maçãs. Fábio de quatro anos se abraçou às pernas do baio chorando copiosamente, foi a sua forma de agradecer ao novo amigo anjo de quatro patas enviado por Deus, para salvar as suas vidas. O terno baio olhou para a família com um jeito doce, se acomodou sob a macieira fitando o céu de quando em vez. Aquela noite a reza foi intensa e depois de muito tempo o sono foi reparador.

O amanhecer chegou com alegrias abençoadas, pois os animais estavam inacreditavelmente parrudos, as cabrinhas tinham crias e estavam amamentando, Esther correu a tirar leite para os filhos, principalmente para o bebê José, ela ria tanto que contagiou os demais. Espalhadas no entorno da casa galinhas ciscavam pelo chão. Ao lado da macieira estava brotado um pequeno milharal todo douradinho, uma beleza! Só que para espanto de todos, atrás da casa tinha um enorme cesto de palha trançada com oito mantas de charque, aquilo era muito mais do que eles entendiam merecer, mas, Deus sabe de tudo, sempre.

Jacó abraçou o baio tão forte e lhe chamou de anjo, pois para eles certamente ele era um. Depois do leite com macaxeira, pegou algumas ripas de madeira, palha seca e umas cordas, para improvisar um galinheiro com chocos para que pudesse colher futuramente os ovos. Já pensava o estirão que iria andar com o peito repleto de alegria, para vender ovos, maçãs, milho e cestos de palha trançados por Esther e as meninas Martha e Maria na feira distante, pelo menos poderia trocar por outras sementes, farinha, óleo, açúcar e sal e algumas coisas para higiene. Os filhos mais velhos e Esther o ajudariam a plantar sementes de abóbora e outras coisas para que não faltasse o sustento da família e o que vender. Não pensaram nem por um segundo, em apenas usufruir das dádivas recebidas. Eram gente de bem e com vigor para o trabalho, não fugiam da luta tampouco imaginavam esbanjar o que veio dos céus de forma abençoada.

Seis meses se passaram e a vida deles havia mudado completamente, havia cor nas faces e visivelmente ganharam mais corpo, a luta diária tinha rotina de fé e trabalho. No Domingo Jacó e a família caminharam muitas léguas para chegar até a Igreja Matriz, mas, Deus precisava deste sacrifício de gratidão. As crianças ganharam um doce cada um e Esther recebeu de Jacó um laço de fita para os cabelos castanhos, para si Jacó apenas comprou uma enxada, pois para ele e o filho Luiz, ela seria muito necessária.

O baio andava passeando cada vez mais distante da casa de Jacó. Num dia de Sol mais ameno, ele olhou a família bem de perto de forma doce, foi se afastando até que de repente desapareceu no ar, deixando um arco íris no céu por mais de uma hora. Sua missão estava cumprida.




* Imagem - Fonte - Google
* cnabrasil.org.br
Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 30/07/2020
Reeditado em 30/07/2020
Código do texto: T7021541
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