Guerra das rosas

No proscênio sombrio onde a dor impera,

Teu olhar de gélida pirâmide insana:

Mármore que fere, me cala e me venera

Sob véus faísca esta serpente urbana.

Dança em compasso que despedaça:

Açoite ao toque; cada toque é faca...

O corpo que recua, ainda permanece

Na fúria lenta onde o êxtase enlouquece.

Teu manto de orgulho, couraça brumosa,

Velando o caos da carne tenebrosa.

Eu, trono e espada, soberano abismo,

Cordeiro e lobo no mesmo exorcismo.

Rugimos ambos no fragor dos ossos,

Erguemos nós o fardo dos destroços:

Destroços dos espelhos e deste ardil,

Amor de Átropos tece o nosso fio.

Por que lutar, se o prêmio é só espinhal?

Rodas de fogo no moinho eternal,

Tramas da carne torcem em palco exangue.

Negue-me a paz: sou réu da sorte langue!

Guerra infecunda em rubros carmesins

Veste de glória nossos frágeis fins.

Que importa o fim? A queda é nosso ofício:

Violência esculpe em nós o próprio vício.

A sala arde em pira funerária,

Teu desafio: um sopro na calvária.

Último assalto: enlaço e punhalada

Unem num hino a chama e a espada.

Roda o destino, ciclópea engrenagem,

Esmaga pétalas na fera linguagem.

Triunfa o vácuo! Em pórtico sombrio,

Se assina a morte do próprio desafio.

Não há tréguas, ó Dama da Contenda:

Comprei tuas chagas nesta oferenda.

A Lua em eclipse e o Sol em brasa

Forjaram guerras dentro da nossa casa.