DIVISOR DE ÁGUAS

O melhor lugar do altar foi a nossa solidão.

Dois rios que despedem os navegantes

Eram antes: olhos d'água! coisa que jamais deságua

Na maré sem amplidão.

O pior lugar do mundo é o mar da multidão.

Gente à toa a todo lado, sentimento todo errado

E um buraco lá no fundo! sem alcançar a sua mão.

Como dois baldes errantes

Carregados, delirantes,

Cada qual em sua casa

Respectiva e mal lavada

Na farsa repetitiva

Feito nada, inundando a poça rasa.

Desventura aventureira?

A primeira é cachoeira

A segunda foi faceira

A terceira tão certeira

Que fiquei eira sem beira

Esvaziado de canseira

A buscar o rio errado

Pela foz na cabeceira.

Quem de nós flui tão sozinho? – se na vazão dos descaminhos

o leito é um mar de espinhos

Então o jeito é remar fingindo

Que o coração está sorrindo?

E se a chuva nunca mais inundar?

Seremos dois perdidos cursos d’água

Fossilizados no desamparo do sertão

Esquecidos feito mágoa

De quem nasceu sem chão

Da mão que perdeu a luva

Na hora de se cortar.

Melhor cavar novo percurso pra dois rios que estão sem curso.

Pois, então, deixo amiúde

Se eu puder ser um açude

E você sempre na boa com seu jeito de lagoa

A gente pode se encontrar,

Alagar o nosso tempo

Afogar os vãos lamentos

Com a vastidão do oceano

Com a doçura dos riachos

E aceitar um novo plano, chega dessa divisão!

Se é loucura, então

Eu acho:

O melhor lugar do altar é a nossa comunhão.