Monotonia e Sentimentos afins
Dia frio, com céu nebuloso. Normalmente, dia assim, é acompanhado de alta umidade do ar. Narinas escorrendo líquidos. Cachecóis enforcando pescoços. Agasalhos cheirando naftalina abrigam corpos. Onde? Em algum recanto. O mundo é muito maior, que as cercas que delimitam o mundo, em pequenos mundos.
No país de sol, de 7 mil km de praias, ostentação em qualquer lugar, as baixas temperaturas é motivo de praguejamento. Exceto para Raul na contramão Seixas, que desafiou o frio, dizendo: "enquanto praguejam contra o frio, Eu fiz minha cama na varanda". Não é à toa que o sujeito nasceu 10 mil anos antes da civilização.
Lentas, quase parando, as horas vão deslizando pela tarde, lá fora. Uma vez que despertaram tarde, ilusões das mentes; apenas. Em breve as luzes artificiais enviarão um comunicado aos olhos, dizendo que a noite chegou.
Um perfume de desilusão e pessimismo paira no ar. "Vai e volta, nunca em vão". Quem sopra isso nos ouvidos, é o vento.
Por falta de lubrificação, as portas rangem, esganiçadas. Estão gritando por quem? Transparecendo covardes, portas e paredes veem tudo e nada dizem.
Também bisbilhoteiras das intimidades alheias, as janelas são mantidas fechadas. Em uma delas, a namoradeira foi deixada para fora. Provavelmente, tomará sereno madrugada adentro. Com as janelas fechadas, os móveis não serão acometidos pela poeira fina. Quando empoeirados, aparece a inscrição sobre um ou outro. Ao notar, ponho a lupa e leio: "mantenha distância, sempre; e use máscara. Risco iminente de Covid-19".
Lembretes e chamadas instrutivas são sempre bem vindos; ainda mais que não fui vacinado.
E assim, o escritor vai descrevendo a poesia tecida pela Natureza. Todo dia, um capítulo inconcluso, ou seja, com as luzes piscando nos postes, lá fora; e aqui dentro, com o lampião sem querosene, finalizo está. Antes o adendo: boa noite passarada; esperei até agora, nenhum de vós, aparecestes. Espero que todos, desde a pequena e inquieta curuira até o majestoso e desafiador falcão, todos estejam bem. Os alimentadores estão abarrotados de frutas...
Caso apareçam amanhã e se lembro-me bem, nunca sumiram dois dias consecutivos, entoaremos aquela velha canção. Fiquem tranquilos, trancarei com chaves e ferrolhos as portas e fecharei os olhos. O escuro mete medo...; mas nem tanto, pois Curiango, o menestrel e seresteiro noturno, acaba de pousar no galho cascudo do ipê. E certamente, as flores amareladas dançarão, sob a melodia vocalizada por ele.
Tristes ou alegres, com passos ritmados ou não, caindo ou mantendo-se nos galhos, as flores dançarão para não dançar.
Os devaneios e a beleza contida na simplicidade, estão muito além da compreensão e mais longe ainda, da razão; portanto não tente entender por que os pássaros vocalizam, os sinos dobram, os ventos uivam e as flores quando não dançam, caem dos galhos.
O bailado das Borboletas
Entre as facilidades e as dificuldades, preferem as facilidades. E lamentavelmente, perdem a oportunidade de se autoproclamar capaz. Indiscutivelmente, a vitória pertence aos insolentes, destemidos e teimosos conquistadores. Taí a explicação histórica que separou os povos navegadores, de portos, servindo somente de ancoradouros. Quem navega mares procelosos, quer chegar; contrário de quem, feito raízes, apega-se à terra firme, em solo, enganosamente, fértil.
Em tempos duvidosos, corridos, imediatistas, tecnológicos, líquidos e sedentários, louvado seja quem tem pernas para a escalada, olhos para observar, mente para arquivar, mãos para escrever e boca para instruir.
Quem se dedica a tal fim, é homem individualista, preso aos seus princípios, trabalhando em prol do pluralismo cultural; e como sempre, passam semanas e semanas, meses e meses, para revelar o que a Natureza levou muitas centenas de anos para escrever.
Então, leia rápido, o quanto antes puder, porque tudo que é escrito na pedra, caduca, prescreve, acaba, morre. Isso naturalmente, porque se houver interferência humana, as pedras rolam em iminente avalanche.
Raro, poucos, um ou outro tem paciência para esperar o extasiante e expressivo bailado das borboletas, roçando as pétalas de flores.