Açaí com tapioca
AÇAÍ COM FARINHA DE TAPIOCA
Quem sou eu?
"Na Alemanha, eu sou americano. Nos Estados Unidos, eu sou alemão." (Albert Einstein, cientista alemão que foi morar nos Estados Unidos)
NUNCA PARTAS DA TERRA ONDE NASCESTES.
Amanhece na terra onde nasci. Fugi para me encontrar, e me perdi. Volto ao ponto de partida para me reencontrar.
Eu não sou mais aquele menino que partiu com uma mala cheia de sonhos. Fui ficando pelo caminho em cada sonho que quebrava.
NUNCA PARTAS DA TERRA ONDE NASCESTE.
Você pertence a terra onde nasceu.
Nenhum lugar te compreenderá.
Teu sotaque será sempre estranho.
Serás sempre um estrangeiro.
Pertences ao povo da terra em que nascestes. Eles tem a tua face. Eles falam a tua língua materna. Eles entendem o teu sotaque.
Algumas palavras não tem o mesmo sentido. Alguns gestos não transmitem a mesma ideia.
Na terra onde nasceste, eles compreenderão o teu sorriso largo, a tua voz estridente, os teus abraços amigáveis.
A comida da terra onde nasceste tem u m sabor diferente, tem um tempero singular.
Houve uma época da minha vida quando fui estudar nos Estados Unidos, em Minessota. Eu levei na mala uma lata de feijoada. Depois de dois meses, eu comi aquele feijão com arroz. Não lembro de ter comido uma comida tão saborosa. Aquele alimento enlatado tinha um sabor especial, queria que nunca acabasse. Hoje, trinta e cinco anos depois, ainda sinto o sabor na minha boca.
Uma terra estrangeira está cheia de mal-entendido, de solidão, de colegas (e poucos amigos), de comidas estranhas, de um sotaque que não podemos imitar.
A música da terra onde nasceste é mais bonita quando escutamos fora do nosso lugar. Ela tem um ritmo que acelera o coração, que mexe profundamente com as nossas emoções que traz saudades da infância, da juventude. Lembro da música "Garota de Ipanema" que escutei numa cidade pequena de Minessota. Por alguns instantes perdi o senso de onde eu estava. Demorei a me reencontrar.
Os cheiros da terra onde nasceste ficam impregnados no nosso corpo. Eles sequestram tua mente, te levam embora para lugares que ficaram na lembrança, despertam sentimentos que acreditávamos adormecidos.
Andar pelas ruas da cidade onde nasceste está cheia de doces memórias, de pedaços nossos que foram ficando acumulados durante os anos. Memória dos anos de escola, do trajeto que caminhávamos, das tardes e encontro com os amigos, completamente inesquecíveis. Memórias dos passeios em família, que fazíamos despretenciosamente e que ficaram guardados eternamente no baú da nossa mente. Nas ruas da cidade onde nasceste tem os cinemas por onde passaste belos momentos com os colegas da juventude - aqueles que serão parte da tua vida para sempre. As ruas têm as árvores com frutas que não acharás em nenhum outro lugar.
Lembro da manga verde que eu comia com sal. Já tentei fazer isso depois. Mangas verdes para serem comidas com sal somente na terra onde nasceste. Na frente da minha casa tinha uma mangueira, de onde nós tirávamos as frutas com as mãos, e comíamos sentados no chão, com os pés descalços, a cabeça nas estrelas, e um sensação de lar que nunca mais será possível viver longe da terra onde nasceste.
NUNCA PARTAS DA TERRA ONDE NASCESTE.
Sempre guardei a lembrança de um açaí com farinha de tapioca que eu bebia na infância. Tomei açaí em todos os lugares imagináveis a procura daquele sabor especial. Tomei açaí com tudo - com banana e mel, com guaraná, com grabola, com proteinato de cálcio. Tomei açaí em louças finas, em lugares especiais. Nunca tomei um açaí com farinha de tapioca com um sabor parecido com o da terra onde nasci. NUNCA encontrei. Levei muitos anos para entender o porquê.
Na terra onde nasceste enterraste o teu umbigo, plantaste o teu coração, cultivaste teus primeiros e inesquecíveis amigos. A terra onde nasceste tem o melhor sabor na tua boca.
Açaí é "a fruta que chora".
“Eu vivia em um vilarejo, e o meu mundo se tornara uma espécie de vilarejo”. (Gertrude Stein sobre Ezra Pound)