Resta-nos furtar.

Já que pretos e pobres

são obrigados a se alimentar

porque só alemães filosofam

e política é para os nobres

folgo-me de amor falar.

Se bem que pretos não amam

senão ao tempo que lhes sobre

para pedir comida ou furtar.

O que posso balançar

para cair?

O que podemos realçar

até sugir

quem cante nossa fala

e dê pala para nosso amor?

Quanto ao amor, minha preta,

os pretos por aqui, venderam o seu

ou trocaram por comida, um abrigo.

Aos brancos e seus proxenetas,

velhas desesperadas em camafeu.

Mesmo sendo escondido de amigos.

Então o que há para a poesia falar?

O que há para o preto romantizar?

Qual a poesia o preto tem por sua

se levaram tudo? Resta apenas a rua.

E na rua, o que há é a filosofia dura,

tão concreta sob marquises nuas.

Resta-nos furtá-las na cara dura.

O que posso balançar

para cair?

O que podemos realçar

até sugir

quem cante nossa fala

e dê pala para nosso amor?

A filosofia, poesia, o romance

e até o amor, se por aí dão lance,

já têm donos que vendem caro

todo seu uso porque dizem raro.

Porque dizem seus sucessórios

resta-nos a dor, nossos compulsórios.

Emudecer nossas bocas;

explorar nossos corpos;

esconder-nos em tocas;

Caverna de vãos tortos

é o passado reescrito

é a história do redito.

O que posso balançar

para cair?

O que podemos realçar

até sugir

quem cante nossa fala

e dê pala para nosso amor?