CONDENAÇÃO

Ao anoitecer

Comerei meu último jantar!

Último desejo de condenado

Beberei meu último vinho

Junto com a esperança do mundo.

O mundo e suas neuroses atrozes

Horizontes doidos e auroras carbonizadas.

Quando amanhecer o dia

Irão drenar o que me resta

Do sangue maldito

Da cólera suprema

Da dor de uma pena.

Não quero morrer agora,

Agora não!

Ainda há entraves e segredos,

Um látego, uma demencia.

Muitas palavras guardadas

Grudadas dentro da boca.

Palavras que são lavras crescentes

Do meu pensar doente.

O bem e o mal

Duas partes que me adotaram

No compasso, na medida certa,

Fui amado e odiado.

Levo muita dor e muito amor

Que não senti à toa.

Sou convidado a ir embora,

Passageiro da primeira hora.

Carrascos com rostos de madona

E compaixão de gesso

Numa tristeza renascentista.

Nenhum séquito de anjos

Para me guiar no escuro,

Dispenso então a venda

Procurarei estrelas no chão

Para me indicar o nada.

Presentes assistem,

Minha pouca ou muita sorte.

O padre diz:

Onde há inteligência

Existe a beleza universal,

Não a morte! (?)

Preso ao trono bizarro,

Resta o escorregar dos segundos

No relógio da parede.

Um último ajuste no elmo

O prende à cabeça.

Cresce a solidão da espera,

Nada dói em mim.

Olho os olhos que me olham,

São nítidos, e os meus

Avistam metade do que a alma conhece.

Zumbido de corrente elétrica

Estalar de ossos

Não há cortes para drenar o escarro.

Mesclas de claros,

Entrechocam-se no escuro.

A língua esta solta

Desenrolando os novelos da fala.

Nenhum relâmpago impedirá o entendimento.

As mãos do carrasco repousa

Sobre a chave comutadora,

Ainda usará seu anel dourado,

Combinando com sua farda vincada.

Um cortejo breve

Do bem e do mal

Esqueci-me na passagem,

As conquistas e as inglórias.

Nada mais importa...

Vai somar-se às emoções,

Apenas uma pá de cal.

T@CITO/XANADU

Paulo Tácito
Enviado por Paulo Tácito em 08/06/2020
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