Sintomas

Agora que meu corpo dói, não sinto cheiros, odores e nem sabores, começo a pensar mais sobre a vida. Agora que sinto que estou me afogando sem nada ter em meu nariz, agora que sinto uma leve falta de ar que me deixa por um triz, começo a pensar melhor sobre a morte.

Entre a ferida e a sorte, entre a doença e a dor, é preferível que se seja forte diante deste estupor. A saudade e a mágoa deixam de fazer sentido quando o corpo chora por uma doença maldita que leva o oxigênio, a vida e as esperanças.

Já estive com raiva e pelo governo já senti ódio. Perdi meus cabelos por todos aqueles que não querem ficar em casa. As notícias da televisão me deram medo e pensei com muito pessimismo que seria mais um número nas estatísticas. Agora sinto cansaço, fadiga, tédio, saudade. Tudo que eu faço é tão sem graça e dipirona é o único remédio para essa maldade. O resto é tempo e cuidado. Ficar isolado para não contaminar ninguém.

Já sorri, já chorei. Já me veio depressão e ansiedade e o tempo parece correr lento nesse atroz relento onde o relógio parou e sinto que estou me afogando.

A todas as pessoas que já amei, se morrer, deixo meu glorioso adeus. A todas as pessoas que me machucaram, feriram com ações e palavras terei que reencarnar para poder perdoar porque não estou nem um pouco disposto a livrar vocês da culpa de todo o lixo emocional que produziram. Rancor não ajuda, mas é o que tenho agora. Pela última pessoa que passou pela minha vida deixo meu desprezo pela falsidade e mentira. Se eu sobreviver, provavelmente vou, cuido desses tantos sentimentos tóxicos e desses miseráveis traumas. Até lá, me definho com a doença.

Gabriel Cordeiro Machado
Enviado por Gabriel Cordeiro Machado em 23/05/2020
Reeditado em 13/06/2021
Código do texto: T6955655
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