ATÉ MESMO UM GUERREIRO VERÁ SEUS LEÕES AO ENTARDECER

ATÉ MESMO UM GUERREIRO VERÁ SEUS LEÕES AO ENTARDECER

Mesmo após o ápice das glórias,
Celebrando mil contendas,
Chegarão as reprimendas,
Que o tempo não perdoa.

Foi-se o tempo de avantes,
Muito mais que um recuar,
Pois não temos mais a força,
Quando o resto é só luar.

Combati muitos leões,
E Neméia me deu forças,
Mas o chá não tem mais louças,
Que se foram com o tempo.

Foram ventos de açoites,
Nos pernoite já tão frios,
Foram sonhos e desvarios,
Que me selaram os caminhos.

Vejo um chão com mil espinhos,
Profusão de estertores,
E as lanças e flechas são vetores,
Que me apontam o entardecer.

Mas agora penso e sonho,
Que terei meus pesadelos,
Onde enfrento os sortilégios,
Pois as cortes são calvários,
De meu crânio num platô.

E o meu dicionário já não fala,
E já me cala os argumentos,
Pois só pareço um jumento,
Em serventia para a sela.

Aí me vejo como os camelos,
Numa cáfila sofrendo a sede,
Dos desertos que enfrentam,
Nas tormentas das areias,
Que são quentes, mas tão frias,
Se me chega um final entardecer.

Aí eu vejo o meu ocaso,
Sem acasos pois me matam,
Já fui rei sem ser didata,
Enfrentando hordas na clareira.

Onde o leão, sem a negra cabeleira,
Vê sua vida alvissareira,
No entardecer de dor e medo,
Logo cedo ser ceifada.

Aí eu espero ante o fogo,
Que ainda queima a pouca lenha,
Dando tempo pra resenha,
Que eu deixo pros vindouros.

Para ser como um exemplo,
De trabalho em lutas vãs,
Pois já não temos mais manhãs,
Num mundo encimado em catacumbas.

E o meu chapéu só serve,
Pra o sereno de uma noite,
Se der tempo pros açoites,
Que o vento traiçoeiro me dará,
Pois eu morro ao Deus dará,
Se a inveja inclemente for meu fim.


Publicada no Facebook em 31/08/2019