UM BRASIL SEM GONZAGAS SÃO MANDACARÚS SEM FULÔ (Homenagem a Gonzagão e Gonzaguinha)

UM BRASIL SEM GONZAGAS SÃO MANDACARÚS SEM FULÔ (Homenagem a Gonzagão e Gonzaguinha)
 
O incrível correr dum sertanejo não se mede só pelo cavalo adentrar no mato espinhoso, coberto por couro curtido, mas também se fulgura nas chamas que ardem nas fogueiras juninas, ou apenas meninas, a aquecer as noites frias que contrastam o calor seco e cruel do sertão de desertos.

E nos brejos que brotam, como oásis no Saara, só quem tem coragem é que encara a árdua vida do sertão catingueiro, onde o passarinheiro canta mesmo com a solidão, seja do acauã ou da asa branca, pois mesmo olhando a terra ardendo, qual fogueira de São João, canta o questionar de tanta luta e por tanta judiação.

Mas a vida num começo, de agruras e conflitos, nem o choro dos cabritos abrandavam os corações, daqueles que se achavam coronéis da vida dos mais humildes e não queriam seus parentes em misturas pro café. Esse tinha que ser passado, forte e quente e não aguado, que nem Luiz com seu gingado convenceu o Coronel Raimundo, a ter sua Nazarena. Triste sina para quem veio de homenagem a Santa Luzia, que luziu numa estrela cadente sob as vistas de Januário.

E inspirado pela força do sopé do Araripe, Seu Luiz, mesmo sem Jeep, enfrentou o mundo afora. Correu farda nove anos, sem deixar o acordeão, que seria o seu baião num futuro não longínquo.

Marrento que ele era, depois de inventar um breve coito, teve que deixar bastante afoito a sua amada Nazarena. Mas Luzia foi a luz de uma santa que abriu portas, e sem querer morrer na horta, foi pro Rio de Janeiro. Pois até a Asa Branca bateu asas do sertão, levando com Luiz o seu coração. Lá tentou ser outro homem, usando terno e imitação, interpretando outros cantores, em versos sem improvisação.

Mas chega o dia em que se invoca e toca algo de dentro da sua alma, e num Vira e Mexe, perante o famoso Ari Barroso, viu o mundo abrir as portas para o xote e o xaxado nordestino, que no seu baião arretado, lhe trouxe inspiração.
Trouxe chuva e atenção para o nordeste sofredor, pois o mandacaru quando “fulora” lá na seca é o sinal que a chuva chega no sertão, lembrando para todos os cheios de pudores que, toda menina que enjoa da boneca é sinal que o amor já chegou no coração.

Foi em Luiz, que o gozo de um Gonzaga, fez um verso de contraste ao querer enfrentar as correntezas de um riacho do Navio, que adentra no rio Pajeú, vindo do grande São Francisco, só pra matar a saudade do seu brejinho, das caçadas e das vaquejadas, dormindo ao som dos chocalhos e acordando com os galos e as passaradas, sem a sintonia dos rádios e jornais da civilização, que tanto hoje nos assusta.

Mesmo com o perigo moderno e antigo dos balões, vejamos o lúdico de se estar a ver balões subindo, numa noite de fogueiras acesas, de milho assando na brasa, canjica na mesa, dançando quadrilhas, xote e baião nos salões de um período junino, mesmo quando o candeeiro se apagou e o sanfoneiro cochilou, pois a sanfona não parou e o forró continuou até pegar o amanhecer do sol com a mão.

Essa história de contrastes entre tristezas e alegrias, muito típico de quem vem dum nordeste sofrido e agreste, massacrado pela serra da borborema e suas secas inclementes, traz no seu bojo o sofrer de quem nos deu tantas alegrias, simbolizando o ritmo mais brasileiro de todas as músicas, pois foi pai sem ser, ajudou a criar filho sem poder lhe dar carinho, se viu longe de seu velho Januário e sua mãe por longos anos, correndo o Brasil, de norte a sul para nos dar alegrias e conforto, deixando ao mundo, por tão breve período, o seu filho Gonzaguinha.

E esse menino, que honrou seu nome, em suma, o fez com letras tão profundas que nos emocionam também até os dias de hoje, mesmo tendo seguido os caminhos das estrelas que hão de brilhar no firmamento musical brasileiro e no nosso ideário de ufanismo por mentes tão impares e brilhantes que nem mesmo os diamantes podem se comparar.

E, no final, de Seu Lua ou Gonzaguinha, sob as bençãos de Santa Luzia, dos meteoros cadentes ou dos oito baixos de Seu Januário, o sopé do Araripe, de Exú para o mundo, deixou o show da vida e da música bem mais fecundo, com saudade que em horas ou segundos nos trás emoções que faz, num choro sem falsetes, as lagrimas brotar, pela alegria que é muita e de tanto se fartar, mesmo que tenham furado os olhos do assum preto do nosso eterno Luiz Gonzaga, cabra macho no melhor dos seus sentidos, nordestino vencedor que ele foi.

Afinal, todo Luiz respeita Januário, com a beleza de ser um eterno aprendiz!


Homenagem em forma de prosa poética, publicada no Facebook em 06/07/2018