Esses cabelos que detesto. Protesto!
Preto, que cabelo é esse?
Quando a polícia passa;
Quando passa no beco
voltando do trabalho
às 22h ou 5 da matina
Teu cabelo fica em pé
quando a polícia vem.
Quando a desgraça é tua,
o "puliça" nem vê.
Mas se faz a merda
teu barraco cai
e não é a chuva que leva.
São os doutores da lei
que te apresentam
a todas as dores, eu sei.
Essa desgraça de cabelo
é de trabalhador?
A desgraça de buzu cheio,
passa sem parar pelo ponto;
A desgraça do ponto pra bater,
precisa de atestado,
pra não descontar
da desgraça de salário
que não dá pra viver,
sem o cansaço de outro trampo
que não lhe deixa dormir
e a idade nunca é o ponto
nem a recompensa pra descansar.
A desgraça não foi plantada
nem semeada por sua cabeça, preto.
Está nas mentes mais poderosas,
nas mesas de jantar mais altas.
Veio das sociedades mais caras.
Semeada na tua vida...
Teus cabelos é que te salvam.
Cultive-os longos!
Madeixas em cachos, trançados,
turbinados por cremes
ou até acomodados
em lenços e turbantes.
Eles te podam por medo;
Veem as asas e a força
de teus braços.
Eles te tolhem ou empalam.
Querem te ocultar
sem misturar
na miscigenação.
Teus cabelos te salvam
e te dizem diferente.
Fora do contexto das senzalas,
fazendas e fábricas,
te fazem independente.
É isso ou a idiotização
do corte reto, da navalha,
da máquina 1 ou zero,
pro elogio sincero do patrão
sem nenhum desespero.