DEIXAR-ME-ÁS ENLAÇAR TEU PESCOÇO ?

Uns/mas dizem que tu não existes, que és ilusão, crendice, fantasia de imaginações doentias, criada por religiões não sadias, que exploram as carências humanas com esperteza e hipocrisia. Outros/as dizem que tu és de todas as dimensões Rainha, que és Mãe de Deus e minha, que és santa e te chamas Maria - maior Obra-Prima Divina.

Mesmo estes/as, porém, em sua maioria, não te conhecem nem parecem se interessar por isso como deveriam. Fazem-te de múmia, dizem que és apenas resignação e silêncio, como se não pensasses, não tivesses vida própria, não pudesses dizer e dissesses e digas o que bem quiseres, como se fosses feita da mesma substância das imagens com que te representam e anunciam. Depois, colocam-te num pedestal distante - como se não fosses humana nem uma de nós - para que de lá olhes para nossos problemas, satisfaças nossas vontades o quanto antes, atendas nossos pedidos e rompantes e, junto a Deus, sejas nosso "quebra-galhos".

E tem ainda aqueles/as que afirmam seres, sim, uma de nós, mas uma "mulher qualquer, comum, que apenas cumpriu a vontade de Deus", sem muita escolha, e sem ter nada de diferente ou excepcional nem prerrogativa alguma - como se não tivesses tido sempre que escolher, e como se Deus/a apenas a usasse como a um vaso qualquer, negando todas as maravilhas que Ele/a realizou na Obra magnífica que tu és. Ah, e ainda garantem que mesmo que todos/as nós possamos orar e interceder uns pelos outros diante de Deus/a, tu, mesmo sendo a Mãe, Amiga e Obra sem precedentes, não pode.

É um tal de discursarem, falarem, polemizarem e escreverem sobre ti, encerrados/as em tantos lugares-comuns e "grandes idéias" e certezas nascidas de seus próprios umbigos convenientes, sempre imaginando que tu giras em torno de nós... Quase ninguém pergunta quem tu és realmente, o que deseja de nós, o que sonhas, do que é que gostas e do que não gostas, qual o tom da tua voz, o motivo de nos teres aceito por filhos/as e alunos/as, a causa de até hoje nos suportares, quais teus filmes, musicas, livros, quadros preferidos, quais tuas dores e alegrias, o que te toca e emociona, o que te faz rir e o que te faz chorar, em que gostas de refletir, como é que sabes voar, como é tua vida, o que costuma ser e fazer além de nos aturar...Ninguém pergunta o que é que ainda não conheces, o que ainda te falta aprender, como podes ter um intelecto tão gigantesco e um coração maior ainda, como consegues ter bom humor mesmo em meio ao sofrimento, como consegues ser tão assombrosamente senhora de ti mesma, como consegues ser sempre tão educada e suave mesmo com as mais irritantes e grosseiras criaturas, de onde vem tua incalculável e ardente ternura, de onde vem tanta coragem e firmeza quando enfrentas o mal e onde arranjas tão imenso poder para colocá-lo a correr... Não perguntam qual a razão de, nesta guerra, ao invés de ficares sentada em teu trono, estares incansavelmente à frente de teu exército de amor e luz, nem quem é que te fez assim, de qual Artista és a maior expressão, quem é que te enlouquece de Amor...

Não, nada te perguntam! E como podem dizer que te amam se não te conhecem ? E comigo, o que é que acontece ? Como foi que me invadiste com esse teu jeito por demais gentil ? O que foi que com meu ser fizeste quando me chamaste, hein minha valente Rainha ? Por que meu coração não se enganou ? Por que sou diferente ? Por que como a maioria não sou ?

Ah, Maria, Maria... Diante de Ti, não sei o que pensar. Fico sem palavras. Fico sem ação. Diante de Ti sou totalmente indefesa. Diante de Ti sou como uma precoce bebezinha que não sabe andar ainda, mas que de seu berço segue a mãe com o olhar, procurando adivinhar-lhe os gestos, conhecer-lhe o rosto, entender o que com ela se passa, desejando ser pega no colo, desejando enlaçar-lhe o pescoço...

Não me basta saber que és minha Mãe. Quero ser tua filha, ter ao menos alguns de teus traços, ser contigo em algo parecida. Não me basta que sejas minha Mestra, quero ser uma aluna de quem possas te orgulhar pelo menos um pouco, e que não te dê tanto trabalho... Não me basta que sejas minha Amiga, a melhor delas e a mais querida, quero poder corresponder, quero também tua amiga ser. Alguém com quem possas partilhar o que quiseres e não apenas o que nossas limitações não obstruem ou impedem. Não me basta saber que és a Rainha de todas as dimensões. Quero servir-te, e que reines também no meu coração tantas vezes disperso... Não me basta saber que és o tabernáculo inigualável do Sagrado, o maior e mais puro coração, a mais genial mente, o mais iluminado espírito dentre todas as criaturas, a mais poderosa intercessão diante do Verbo, o mais perfeito equilíbrio, a Obra máxima de das Mãos Divinas! Desejo saber mais, desejo conhecer-te de verdade. Conhecer tua loucura por Deus/a. Saber dos instantes em que tuas emoções foram deslumbrantes ou devastadoras e mais fortes que ti...Saber sobre teus outros lados, conhecer teu lado moleca, teu lado artista, teu lado pensante e audaz, teu lado libertador, teu lado lutador por tuas irmãs e por todos/as os oprimidos/as, massacrados/as, ignorados/as, violentados/as, esquecidos/as, explorados/as, esteriotipados/as, perseguidos/as, agredidos/as, humilhados/as, invisibilizados/as, teu sorriso divertido, teu olhar perspicaz, tua criatividade inesgotável, teu conhecimento infindável, teus corajosos e ousados vôos, tuas inteligentíssimas indagações, tuas sábias e assombrosas lições sobre tudo o que possamos perguntar e descobrir e sobre o que ainda não podemos sequer imaginar...

Ah, minha Senhora, amo-te tanto! Mas não quero ver-Te através dos esteriótipos que fazem de Ti, não quero amar-Te através de falsas ou parciais imagens...Por que sou diferente ? Por que como a maioria não sou ? Como foi que me invadiste com esse teu jeito por demais gentil ? Por que, quando me chamaste, minha mente não se enganou, hein minha comovente Rainha ?

E por que, amando-Te tanto, tanto, tanto, não consigo imitar-Te, não consigo aprender o que me ensinas, sou tão pequena e miserável ? Será que, mesmo assim, um dia me pegarás em teu colo e me deixarás enlaçar teu pescoço, hein minha amadíssima Mãe, Mestra, Amiga, MARIA ?