JOGO DA DESONRA
(Samuel da Mata)

Entrei no jogo já em final de partida. Uma dama branca, que depois entendi ser a peça chave do tabuleiro. Uma torre branca, que de longe estava de olho no castelo do rei branco e quiçá no do preto. Um peão preto, estúpido e preguiçoso, mas navegando garbosamente sob os paparicos do rei preto. Uma torre preta que acenava à dama branca sua bandeira rota de boas vindas.

Eu, cavalo branco, escolado na vida por duras caminhadas, me achando sabedor de todas as regras, lutava para dar um fim glorioso a partida; tipo aqueles: “xeque mate em cinco lances”. Foi aí que descobri qual era realmente o jogo: Os reis branco e preto estavam mancomunando as escondidas, com propósitos diferentes mas igualmente sórdidos. A torre branca, à sombra dos bispos, abrira há muito as portas da fortaleza para encontros furtivos da dama branca com o peão preto. O rei preto já havia reservado um cubiculo para recber a dama branca, que de fato já não era mais dama e nem branca, pois há muito jogava pelo time adversário. Foi aí que percebi que eu já não era mais o cavalo e sim o burro - pulei fora do tabuleiro e abandonei o jogo antes que eu fosse parar no xadrez.

 
Samuel da Mata
Enviado por Samuel da Mata em 27/10/2013
Reeditado em 03/11/2016
Código do texto: T4543710
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