Lamento De Morte

É quando a morte se apresenta majestosamente lívida, afável e macilenta, exercendo sua função primordial como célebre condutor universal, que avaliamos tudo o que já vivemos. O que ganhamos, o que perdemos. Os amigos que conquistamos, os que não conquistamos. O amor. Será que realmente conhecemos o verdadeiro amor?

A morte me sorri. Sua energia rebela-se em meu peito. Meu coração ainda bate, mas o sinto morrendo.

Morrerei?

Deixarei simplesmente de existir?

Ainda tenho meus planos, meus projetos... Há coisas que ainda não fiz. Quero me desculpar com os que magoei, me declarar a quem sempre amei. Sinto escorrer sobre a minha face minhas últimas lágrimas aliviando meus anseios nesta semi-morte.

Será meu último pranteio?

Eu preciso chorar!

Ouço suave e envolvente música; encantadora ciência que o homem descobriu para tocar a abstração da alma.

A morte ainda me sorri, porém, agora, refletida em meus olhos, ela alcança-me suas mãos confortadas em uma pluma incandescente de luz.

Penso nos que ficam. Sinto-me muito bem, mas a derradeira hora é iminente. O velho e o novo revelam-se diante da minha morte. Assim como segui os passos de quem aqui passou, deixo a você, meu amado filho, e teus momentâneos irmãos humanos, as marcas dos erros e dos acertos que aqui cometi.

A vida é forjada pelo espírito, não pela carne. Agora isso torna-se bem mais claro para mim. Não sinto nem frio nem calor. Estou perdendo minhas propriedades físicas, mas anseio em saber para onde vou. É uma estranha sensação, entretanto, o conhecimento implícito me atrai.

Sinto-me agora totalmente envolvido por ela. Continuo a chorar, mas pela alegria sem proporções que transborda em mim. Minhas lágrimas agora escorrem pela face da alma.

Minha existência!?

Sei que ela não chegou ao fim, mas sinto que não pertenço mais ao cotidiano dos humanos.

Ela me abraça e voamos. Ouço, no caminho ao próximo mundo, suas suaves palavras. Apenas ouço, e morro...