É ESTE O MEU CANTO!
Senhoras e senhores, estou farta de toda esta babugem!
Recuso-me a cantar a tempestuosa mesmice dos mitos opressivos,
a farsa das elocubrações intelectualóides sofismáticas,
a hipocrisia da opinião alheia que estigmatiza,
o medo ilógico, irracional, do diferente,
a falta de sentido de tantas convenções estúpidas,
a deslavada mentira das manipulações ilusórias!
Recuso-me a cantar a entediante, repetitiva, história involutiva
das guerras, violências, humilhações, competições, disputas de
poder, drogas, sexo objetificante, dinheiro, terrorismos, tiranias,
e todos os alienantes e banais lugares-comuns de sempre!
Eu canto a solidão da ausência de afinidades,
a dor dos monólogos e das portas fechadas.
Eu canto a tristeza da inteligência e dons desperdiçados,
do equilíbrio ultrajado, das lutas e ideais abandonados,
das paisagens, gentes e valores degradados.
Eu canto as lágrimas da comunicação desintegrada, dos corações machucados, do grito mudo dos excluídos e espoliados de todos os direitos, da vida pisoteada e do Amor caçoado e não amado.
Eu canto o cativar, a sensibilidade e o senso de humor.
Eu canto o espontâneo e maduro diálogo.
Eu canto o autêntico, o original Encontro, no mútuo, singelo e confiante desnudamento, repleto de delicadeza e amorosa proteção.
Eu canto o pensar, o profundo, o impossível, a ousadia da resistência pacífica,o sonho de uma humanidade realmente fraterna e livre
em todos os seus membros, a descoberta que renova,
a canção criativa, a beleza da simplicidade comovedora.
Eu canto os anjos, a Rainha, vozes e olhares inigualáveis.
Eu canto a esperança, a alma transcendente e o/a Deus/a
que nela habita.
Eu canto um mundo de cores, perfumes, gestos amigos e paz,
terra de poesia, ternura, outonos e asas.
Ainda que, no ritmo de minhas enormes imperfeições e fragilidades,
por vezes, eu erre o tom, ou me atropele, ou desafine,
é este o meu canto!
E ainda que não me ouçam, ou que zombem de mim,
é este o meu canto!