APENAS UM SER HUMANO

Se alguém perguntar sobre mim, diga que sou uma amiga, que fala de amor, de laços fraternos, de asas no vento e que está presa no espaço, num planeta que não é sua casa, e no tempo.

Se alguém perguntar onde vivo, diga que vivo na lua, no sonho, na ternura, no coração de quem me aceita e me ama como sou.

Se alguém perguntar por onde ando, diga que ando por aí, a observar pássaros, lágrimas, dores disfarçadas, gestos de afeto, gente louca do avesso, risos e instantes impagáveis.

Se alguém perguntar onde estou, diga que isso não importa muito. O que importa é que, onde quer que eu esteja, meu coração está aberto, pra quem quiser conhecê-lo e entrar, minha mente está aberta pra aprender, buscar, pensar, minhas asas estão dispostas a voar ainda que por vezes feridas, e minha alma continua sempre desejando iluminar, mesmo que com luzinha de vaga-lume ou de um fósforo.

Se alguém perguntar se eu amo, diga que cedo apaixonei-me irremediavelmente pelo Amor, e mesmo imperfeita e pequenina, busco praticar o que ele me ensina. Que amo, amo sim, com amor sem fim, uma estrela diamante meteoro indescritível, a mais esplêndida de todo o Universo! Ah, e que há tanta gente linda e também imperfeita no meu coração que até já perdi a conta.

Se alguém perguntar onde está minha voz, diga que está gritando num deserto de surdos/as e indiferentes, diga que é acusada de insana, utópica, idiota, exibida, radical, subversiva, doente, ofensiva, e sabe-se lá mais o quê. Diga que está sempre do lado de ovelhas negras e coloridas, sempre na direção contrária da maior parte dos sistemas e convenções hipócritas, absurdos, injustos, sempre junto das criaturas oprimidas, desrespeitadas, violentadas, perseguidas, espoliadas, exploradas, discriminadas, invisíveis, alienadas, estigmatizadas. E diga que chora. Voz que chora. Não só por todas essas coisas existirem e se perpetuarem há tanto tempo, mas principalmente por tantas de suas vítimas continuarem a fingir que nada disso existe ou é tão real assim, continuarem a não fazer nada, a se alienarem, a não se acharem valiosas o suficiente, e a agredirem vozes como a minha, combatendo-as furiosamente, tentando amordaçá-las, ou atacando-as de formas cruéis e descabidas, ou satirizando-as ou desmerecendo-as, ou invisibilizando-as.

Se alguém perguntar meu nome, diga que pode me chamar de amiga, ou de irmã, ou de lunática, ou do que bem quiser, menos de “inimiga”, porque isso não sei ser, nem desejo jamais sabê-lo.

E se alguém perguntar quem sou, diga para perguntar diretamente a mim, diga para ter a audácia de descobrir, de se interessar em conhecer, de se aventurar em dialogar, de me cativar. Diga que consinto que me surpreendam, e que não é preciso armaduras nem escudos para isso, só abertura, só sinceridade, só confiança, só expor a si de verdade, só reconhecimento do que se é de bom e não tão bom, sem medo de rejeição nem de monstros que não existem, porque aqui só há outra criatura também vulnerável tentando viver do melhor modo que consegue. Só isso. Nenhum bicho papão. Apenas um ser humano como qualquer outro.

Gisele De Marie
Enviado por Gisele De Marie em 10/01/2013
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