A minha Máscara
A minha Máscara
por JOSÉ RIBEIRO ZITO
Saio à rua metido dentro de mim, tão alheio ao que se passa a meu lado que, assim embrulhado nos meus pensamentos, dou por mim a entrar no café da esquina. Lá dentro, encontro um amigo que pergunta se não quero colocar uma máscara de carnaval. Sem surpresa de mim, respondo-lhe nada hesitante que não.
Não!
Já tenho o bastante com a máscara que me deixavam pôr, de pessoa absolutamente normal. Com esta máscara, tenho as portas do mundo da normalidade abertas. Ela esconde a contento os cristais da loucura transparente que não pode entrar nos salões dos concertos afinados.
Fechado em casa,deixo o meu ser que espera por mim até ao meu regresso. Deixo lá amargurada a pessoa tomada pela confusão das dúvidas, o idealista espantado dos mundos perfeitos, o carregador das sombras mesquinhas das gulas desvairadas, o sofredor das dores interiores, o mensageiro das palavras silenciosas das dores dos outros, o habitante das estrelas que salta de estrela em estrela a montar cometas de utopias, o pintor de amores perfeitos que só existem na invenção da alma.
E assim deixo fechado a sete chaves o poeta que está dentro de mim e que estremece nos trigais dos sentimentos.Que faz versos ao ritmo das moagens dos grãos da vida. Fica lá,arrumado dentro das gavetas da casa, guardado nos armários, encaixotado na despensa, suspenso em qualquer cabide de solidão.
Neste abandono, ponho a máscara de pessoa normal que tem de trazer na boca as palavras que o coração rejeita e nos olhos, as luzes artificiais que a mente não olha, pois têm as tremuras dos brilhos que não alumiam.
Vivo mascarado, para que não digam na rua que dentro da minha pele vai alguém a afrontar a normalidade do mundo. Se eu deixar cair a máscara, alguém poderá ferir os seus olhos nos reflexos das minhas afrontas, por se desnudar igual das misérias que se desprendem dos meus reflexos, por se ver tão contingente e frágil, tão pequeno e ignorante quanto eu.
Assim, trago-a colada no rosto para enfileirar-me aos seres supostamente normais. Ela,afinal, não choca de vergonha a consciência das coisas tidas como razoáveis e decentes.
Mas eu já vou cansado de parecer aquilo que não sou.Recuso-me, portanto, a pôr mais uma máscara.
Tenho é absoluta necessidade de me livrar urgentemente de imposições, de convenções,de negações. É que eu trago uma dor tamanha, aberta na incompreensão das sombras da noite e não preciso de mais sombras adensadas para revelar a profundidade da escuridão dos meus mistérios ensombrados.
Já que me perguntam se quero uma máscara, respondo que necessito de saber como posso livrar-me da minha, para nunca mais colocar outra ainda mais encobridora dos meus sentidos.
Nota: Zito é jurista,poeta e amigo português.Escreve muito,mas engaveta.Espero que gostem de seu texto,a fim de estimulá-lo à publicação.Obrigada!)