Minha minúscula lista de legítimos esteriótipos
o rei das possibilidades perdidas;
o verme sem a carteirinha do clube dos vermes elegantes;
o atleta do esporte baseado no ócio;
o ingrato aplaudindo mecanicamente os silêncios;
o melancólico sem a a glamourosa rabugentice dos poetas;
o assassino que culpa-se por ter sonhado que estrangulava o vazio;
o místico assombrado com o inacreditável e doloroso toque de, talvez, deus;
o preguiçoso acordando pela madrugada para cumprir o compromisso de encontrar-se com sua falta de vontade;
o intolerante ouvindo amenidades e estúpidas generalidades e ainda tentando manter dormindo sua úlcera de dentes podres;
o curandeiro abençoando todos os fiéis dignos do vazio nosso de cada dia;
o gentil cavalheiro escarrando escondido da visão das múmias que vêem milagres em simples arrotos reprimidos;
o terrorista sonhando com ilhas paradisíacas, com o dia em que a justiça encontrará a América e com os orgasmos prometidos pelas suas humanas vontades de ilusões;
o bêbado tropeçando em todos os obstáculos sóbrios e imateriais que contrariam sua lucidez;
o endividado que finalmente paga o preço de sua culpa com cédulas falsas;
o apaixonado rebaixando-se a uma adolescência bem tardia;
o mentiroso descobrindo que suas farsas podem muito bem possuírem outros lados;
o réptil desprovido de membros que envergonha as serpentes;
o sensato lacônico que violenta o oxigênio;
o professor monótono que ensina aventuras dormindo;
o vendedor de sonhos dentro de sonhos dentro de sonhos, cruéis e caros;
o ator charlatão atuando escondido num filme destinado a um público de um só cinéfilo;
o arquiteto influenciado pelos passos apressados das pedras poetisas;
o obscuro profeta que negou-se a divulgar suas visões do futuro;
o galã cuja beleza vanguardista ainda não pode ser alcançada pelas visões de hoje;
o mendigo orgulhoso que distribui moedas invisíveis mas em alta no mercado;
o solitário convicto que fez amizade com o fantasma tímido;
o médico condecorado que tem sérias restrições em relação à cura;
o funcionário meticuloso que deixa tudo pela metade, abandona e esquece
e, por fim, o mais perfeito esteriótipo dos seres amantes da incoerência.
20/04/2012