Barulho
O barulho das águas é tão infinito quanto aflito.
Em dias em que somos calor, nos tornamos excentricamente vapor.
Enquanto que o beijo é armazenado em cápsulas num invólucro de tesão.
E o gosto do meu corpo se iguala a salmoura que tu compõe sobre minha pele.
Essa pele fraca, fétida de amor e ódio de vinho e vinagre.
Nosso calabouço onde repousam pobres refúgios que regurgitam sementes de amor e ódio.
Onde o carrasco sexo trepa sobre nossas ancas extirpando a fundo nosso fôlego.
Pedindo, exclamando suspiros, desejando gemidos e implorando um minuto mais.
Cada gota que escorre da nuca e morre em minhas costas são memórias.
Lembranças do calor que sucumbe e se transforma no vapor do teu inferno-corpo.
Meu copo vazio de sede, meu corpo esgotado da noite passada.
Nossa vida imaginaria é ilusória.
Como se pudesse ouvir o som das águas.
Como se pudesse ouvir o som das drogas.
Aquele barulhinho bom que só os ouvidos podem decantar de um lado para outro.
Um barulhinho porreta que só aumenta o desejo de nunca mais ouvir o mundo, de nunca mais a morte.
Num segundo ser o fast-food do prazer e nunca mais o medo.
Num segundo, por um único instante ser o barulho infinito e aflito das águas.