COISAS DO SERTÃO DE ANTES

Sou do tempo que Fanta era remédio.

Sabonete presente de aniversário.

Rapa de juá era xampu.

Que sandália havaiana era chinela japonesa.

E quando velha tinha apetrecho uma correia de outra cor ou

Um arame amarrando o pitoco do cabresto.

Sou do tempo que banheiros eram de palhas de coqueiros

Que as casas eram de taipas.

E a sala enfeitada com fotos de candidato pregado com sabão.

A cisterna um tambor no oitão da casa.

Do tempo em que bica era de lata de óleo.

E as telhas da cozinha pretas da lenha queimada no fogão.

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Sou do tempo que toda casa tinha um pote de barro

E um coador d’água.

Dois baldes e um pau de galão.

Um palanque, um banco e uma lamparina.

Um pinico debaixo da cama.

Um inspeto, uma foice e um facão.

Do tempo que toda casa tinha um pulêro.

E um motorrádio sintonizado na rural, Cabugi ou Araruna.

Do tempo em que moía o milho para fazer o pão.

Sou do tempo que prato era lata de goiabada.

Do tempo que cafeteira era bule.

Que vidro de desodorante era enfeite.

Que o pão era enrolado em papel.

Que leite de aveloz era cola.

Que menino novo vinha de avião

E bicho papão pegava menino.

Do tempo em que passava álcool em catapora.

Que arrancava dente com linha de algodão.

Do tempo que bandaid era cuspe em folha de mato verde.

Sou do tempo dos repentistas.

Da época das tertulhas e assustados.

Que o lanche da hora era refresco com Dalila e pão doce.

Que caminho era vareda.

Que vassoura era de vassourinha.

Que menino sujo era grudento

Quando cheirava mal fedia a tampo.

Que se esfregava com caco de telha.

Que facheada era com piraca.

Que concha era de quenga de coco.

Do tempo que copo era caneco.

Sou do tempo que soltar pum era peidar.

Que condicionador para cabelo era óleo de coco.

Que creme para os sovacos era limão.

Do tempo em que espantava muriçoca

Queimando bosta de gado ou bucha de coco.

E Que toda vacina era injeção.

Que cabaré era curral de jumenta.

Que prótese dentária era chapa.

Do tempo que o colégio era grupo.

Que o aveloz era banheiro coletivo.

Do tempo que diarréia era caganeira

Que papel higiênico era sabugo

No tempo em que se guardava roupa em mala e baú.

Que se escrevia bilhete.

No tempo que beijo chamava cheiro;

Amar era querer bem;

Flores eram rosas.

Traição era chamego.

Que sexo era cabimento, transar era pimbar.

Do tempo em que fumo era de rolo e cigarro era brejeiro.

Que brinquedo bom era cavalo de pau.

Que brincadeira de criança era tô no poço e garfo marfim.

E carro de brinquedo era feito com lata de sardinha.

E os pneus com chinela japonesa.

Do tempo que elástico era de liga de câmara de ar.

Que banho era de cuia.

Que se insabuava com Sabão de coco

De ferro a brasa

Que mingau era de araruta.

Que se guardava água em cabaço.

Que homem mal era malfazejo.

Que lixeiro era monturo e cisqueiro.

Que cama era de vara e o colchão de junco.

Que lençol, pano de prato, toalha e coador de café

Eram de sacos de açúcar.

Sou do tempo do voto de favor.

Do tempo que burro tinha valor.

Que andava com caçuar, barrie, cambite, cangaia e rabichola.

Sou do tempo de bacurau e arara.

Andando com uma árvore nas costas acompanhando a passeata.

Do tempo das frentes emergenciais.

Do feijão duro na queda e do burgô.

Sou de um tempo que as roupas tinham remendos.

Que passavam pernas de veado pra os meninos andar ligeiro.

Dava água de chocalho pra falar rápido.

Que as meninas cresciam os peitos passando cebola

E alguns meninos andavam nu até aos 10 anos.

Que rapaz chique andava com pente e espelho no bolso;

Do tempo que no São João o forró era de sanfona.

E as fogueiras queimavam até o outro dia.

Depois de ter assado muito milho e feito alguns batizado.

Tempo em que se usava chapéu de palha.

E as Roupas eram de chitas.

Que nos pés o calçado era umas apragatas de sola

Que se debulhava feijão no cacete,

Que menino novo tomava banho em aguildar.

Sou do tempo de metiolate e confeito xaxá

De lobisomem, fulorzinha e saci pererê.

E que todo sapo era cururu.

E que a hora era marcada pelo sol

Sou de um tempo em que havia respeito.

Que as crianças respeitavam os pais.

Que os professores eram autoridades.

Que se tomava a benção aos mais velhos.

E que na escola só passava quem merecesse.

Eu sou de um tempo que não volta mais.

LINOSAPO

CACHOEIRA DO SAPO/RN

alinosapo@yahoo.com.br

Lino Sapo
Enviado por Lino Sapo em 01/03/2011
Reeditado em 17/12/2013
Código do texto: T2821765
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