ANTITÉTICO

não quero eu ser o antitético, não ouso aproximar estranhos ou unir inimigos, as vendetas somente se encerram com sangue, os ciclos somente acabam pela inércia, aprendemos que os diques sempre se rompem, os maremotos se erguem, a terra se treme, a carne treme muito mais, suor, exaustão e satisfação, onde queremos chegar? levados pelo vento do sul ou do norte? a favor ou contra a correnteza? à certeza do fim ou de vida após a morte? movimentos intensos que ocorrem sem um único sinal de tensão nos tempos, nas entranhas somos um vulcão aceso, um sol jovem, uma paisagem dantesca, somos o alimento do amor adolescente, a ira do homem doente e sem cura, impotente segue a lida, consola quem não tem o seu dissabor, somos todas as auroras que nascem em meio às tempestades, outrora bicho hoje gente, descremos da evolução, da anunciação, da ressurreição. descendemos das criaturas do Olimpo, poderosos e vingativos, altivos, inconseqüentes, nossa sina é rir e fazer chorar, desaguamos nossos rios nas almas secas, invernos perenes, astros insones, o que nos move faz um mundo parar...

antagônicos somos sem o merecer, na mente nasce a lembrança de ser feliz mas o fazer não a alcança, somos inquietos, incompletos, insatisfeitos, o mundo cai em nossas mãos, em nossos ouvidos as lamentações, nossas pernas correm para trás, nosso olhar é intransigente, somos dementes? o que seria o homem sem nós? bicho, ainda, sem ter consciência da morte, mais que hoje, quando não se conscientiza da vida. quero gritar paradoxos, quero me chamar Antônimo, quero ser contrário, refratário, retardatário, eu que tanto fui vanguarda tive as costas manchadas, hoje quero empurrar e não mais puxar, quero o devaneio e não o zelo, quero tanto querer e o que faço? escrever...

acho que me perdi, no texto, no caminho, no olhar, no ser... tudo tão rubro e eu amarelo, tudo em conjunção e eu em paralelo, tudo é um todo e eu desgarrado, suprimido, exaurido, dorido, quanto mais plácido é o horizonte mais tortuoso é meu semblante, vou sair, vou parir uma ave que não saiba pousar, vou repousar nestes vales devastados, a dor alheia é meu balsamo, a luta alheia é minha paz, a vontade alheia é meu desafio... por um fio, uma linha, um telefonema, estou pendurado no tempo fazendo planos para ontem, não nasci, não... eu sou só um morto que gosta de brincar, de viver, de pensar.

e o paradoxo se fez, houve um encontro no descaminho, e um final sem ponto...