O SOL E A AMANTE

Os dias nascem pela incontrolável mecânica do sol,

que se despe da luz e esconde-se no brilho, como a

amante pudica, presa de inconfesso desejo, lasciva,

anda atrás dos montes, atrás dos carros, atrás das máscaras,

atrás de si.

Amo ao sol e à amante ! Um me queima a paixão a

outra me consome a chama, um me acalanta a outra

me espanta, todavia, aumentam, ambos, a minha fome de viver o prazer da luz, que me dá esta cruz da alma pulverizada, amada e afastada, lúcida e eloqüente, envolta e desesperada.

Assim construo minha solidão, de muito amor e espanto,

de muito horror e acalanto; repito o pranto, renego a dor,

sou a flor, a cor, o ato de carinho e o assédio do espinho,

sou completo de mim e a mim não basto, por isto arrasto

meus olhos no céu branco do amanhecer, extasiado ante o corpo estático no altar, corpo morto, como a poesia herege do luar.