ESCREVI ALGUMA COISA?
Numa dessas tardes encardidas de inverno
eu curtia essa coisa temerária do tempo.
Não do tempo de chuva ou de frio,
mas do tempo passante.
E pensava que, se tivesse um poder supremo,
como faria para estancá-lo de vez?
Se não entra na conta das coisas do universo,
então não haveria mal algum em deletá-lo.
Mas como seria viver sem envelhecer?
Nunca vi uma alma normal. Uma de rugas então,
impossível!
Porquê, então só o corpo sofre com o vilão?
Almas não batem recordes e nem vencem promissórias.
Parece que entendo que tudo seria eterno, sem o tempo.
Sem passado, nem presente e nem futuro, não haveriam
também nem verbos.
Minha avó seria sempre o que nunca foi.
E eu não estaria aqui escrevendo isso.
Escrevi alguma coisa?