Intermitências da Vida: um tear furta-cor
Ora, eu me pergunto: o que dizer a uma vida que já não se mostra tão amedrontadora quanto fora até então? Sim, pois já não quero mais deixar-me enveredar em mortalhas, deixar de dizer o quanto a vida se mostra clara e bela aos meus olhos. Para cada respirar um novo perfume, para cada direção um novo caminho, para cada olhar uma nova realidade. Tudo ali, dando-se a cada segundo um desfrutar magnifico, sem nada cobrar.
É por isso que desperto a cada amanhecer, sedenta das cores inesperadas que preencherão o dia. E quando cada detalhe me acena com mãos pequeninas de uma criança sapeca que brinca de esconde-esconde, esperando que eu a vá encontrar, penso que a vida é muito mais do que qualquer ser humano jamais cogitou, ou pretendeu saber.
Ora, mas e a angústia dessa incerteza? Bom, é certo que nada é perfeito nem está sob nosso controle. Mas imagino que é justamente ai que reside o pó mágico com que a vida nos salpica: a criança-fada que acena das intermitências da vida nos pergunta “e precisa mesmo ser assim?”
Pois é, no fundo não precisa mesmo. Basta dar um crédito às coisas ao redor. Então eu paro para ouvir o vento simplesmente passar, as crianças que brincam na rua, o sorriso de quem eu quero bem, ou mesmo de um desconhecido, e também as cores com que o sol pinta a realidade quando está de bom-humor, logo pela manhã, ou ao fim da tarde.
Porque tudo fica pequeno quando sinto que dentro de mim há uma vontade de viver que é maior que o mundo. Porque não quero ver passar mais um dia sequer sem dizer que amo, sem saber que vivo, sem andar nas nuvens, sem escalar picos.
No fim das contas, eu queria mesmo é que as palavras pudessem expressar mais do que já fazem em seu prodígio. Quem sabe assim a vida represada aqui pudesse escorrer e pingar nos fios com que a Vida-fada tece a face da realidade, para que eu pudesse presentea-la com esse lindo furta-cor.