PARALELAS
- Fátima Irene Pinto -
 
 Tu és o sótão e eu o porão.
        
        Tu és a cumeeira e eu o alicerce oculto.
        
        Tu és a parte exposta do iceberg.
        
        Eu sou a metade submersa.
        
        Tu és o zênite e eu o nadir.
        
        Tu és a cara da moeda e eu a coroa.
        
        Eu te conheço porque és a outra parte de mim.
        
        Tu me conheces porque sou a outra parte de ti.
        
        Para que possas ser a metade exposta,
        
        É preciso que eu seja a metade implícita.
        
        Para que possas declinar versos angelicais,
        
        É preciso que eu derrame versos abismais.
        
        Eu não minto e nem tu mentes jamais.
        
        Escolhes falar da luz por opção.
        
        Escolho rasgar abismos por oposição.
        
        Caminhamos paradoxalmente na mesma direção.
        
        Para que possas suportar-te na cumeeira,
        
        Faço-me a base segura e obscura do teu altar.
        
        E nesta junção milenar,
        
        Somos quais duas linhas paralelas,
        
        Fadadas a andar lado a lado,
        
        Sem jamais poderem se encontrar.

         
      No livro "Palavras para entorpecer o coração"
Maio de 2004
fatimairene.prosaeverso.net