A Queda II

Sentado na sacada de um edifício,

Contemplando a micro-cidade,

Avistei pássaros e pensei num amigo,

Esperei o sol se por, não queria claridade.

A noite chegou sedutora,

As luzes artificais tomaram conta,

Senti uma brisa acolheadora,

Me levantei e fiquei de pé por afronta.

Deixei o corpo pender para frente,

Pude captar o momento da projeção,

Ima forte lufada de vento de repente,

Estava caindo veloz, direto ao chão.

A memória se tornou viva,

Tanta coisa passou na mente,

Aqueles segundos eram uma alegria,

Duravam a eternidade do instante presente.

As imagens dispersavam com rapidez,

Só via borrões, algo fora de foco,

Acompanhei a linha que a engenharia fez,

Me sentia num verticalismo insólito.

Nunca saltei de pára-quedas,

A resistência do ar é excitante,

Que sensação boa e angustiante era essa,

Os olhos lacrimejaram e secaram num instante.

De braços abertos tentei voar,

Como Ícaro eu só caía,

Abri a boca e comecei a gritar,

O solo chegava, eu via.

Os diversos sons misturados,

Causaram um silêncio auditivo,

O barulho da pressão do ar, fantástico,

Seguia a trajetória do declínio.

Cheguei ao meu desejado destino,

O impacto do corpo no asfalto,

A dor de milésimos de segundo, ou nem isso,

Um pote estilhaçado, morto num salto.

Uma menina que olhava uma vitrine,

Ficou impressionada pelo barulho do impacto,

Depois, a visão do homem era triste,

Partira os membros, o tórax foi separado.

Muito choro, sirenes, gente se aglomerando,

Um senhor disse com piedade: - Um suicida.

Logo os restos foram recolhidos, notícias circulando,

Um ano e foi esquecido, hoje na sacada, um casal se confraterniza.