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Não me lembro bem quando comecei a andar
O tempo é um enganador
Faz a gente esquecer como tudo começou,
Mas é nele que se fincam as raízes de nossa dor.
Não me lembro quando comecei a pensar,
Pensar é esquecer-se,
Todavia
Aquilo que nos tira da realidade,
São pensamentos que tivemos
Nossos ou não
Em algum momento da nossa caminhada,
Que não lembramos quando começou,
Estamos certos que um dia ela termina,
Devagar ou depressa,
A gente vai, querendo ou não,
Entrando mais profunda e paulatinamente
Naquele mundo para onde nos rouba a solidão...
A gente não lembra quando começou a pensar
A gente apenas pensa
E cada pensamento é formado
Por milhas de outros
Muito antigos
De há muito tempo atrás
De um tempo que por mais que nos esforcemos,
Não lembramos mais, nunca mais.
E cada pensamento que temos
Sendo bom ou não
Leva de cada um daqueles uma pincelada,
E destes que vieram nos estigmatizando ao longo do caminho,
Um desafeto de amor,
Uma humilhação,
Um aperreio
Falta do que comer,
Falta do que dar ao filhos para comer...
Dificuldades tantas,
Misturadas a sonhos coloridos,
Sonhos muito, muito antigos,
Daquele tempo lá atrás,
E a muitos outros também,
Cada emoção arquivada,
Lembremos dela ou não,
Formam uma imensa, imensa construção.
E lá vive fantasmas,
E sombras,
E gritos,
E sorrisos estridentes,
E raivas,
E vontades autênticas
De matar,
De morrer,
De parar,
De continuar,
De ignorar,
De ter coragem,
Mais um hálito de força
Para começar,
Para terminar,
E os nossos sonhos
São também sonhos de outros
De filhos
De amigos
De mães e pais
De conhecidos, e desconhecidos
Que oram antes de dormir
Oram pela gente sem nos conhecer...
Sim, cada pensamento que temos,
Que invade sem explicação a nossa essa outra realidade
Da qual gostaríamos de ter alguém que não existe
Para quem pudéssemos dela falar-lhe noite adentro,
Madrugada a fora,
Cada um deles,
Não apenas dos que nos damos conta,
Não apenas dos que surgem quando falamos,
Mas daqueles que surgindo,
Ato contínuo, já cai diretamente
Nos mais profundos e ermos calabouços
Da grande nossa construção,
Feita sem régua, nem compasso,
No entanto a cada minuto e segundo, continuamente,
Sem que possamos controlar
Como ela vai se alastrando,
Que campos está invadindo,
A que altura está chegando,
Nem a forma de seus cômodos
Nem sua silhueta fraquital,
Não, mas é assim mesmo.
Cada pensamento que temos
É num átimo
Construído por muitas mãos,
Os muitos tentáculos daqueles
Que habitam a construção
Cada um tem 999 mãos,
E em cada mão tem 999 dedos,
E em cada dedo tem 999 unhas aduncadas
De todas as cores
De todas as épocas
Ávidos por deixarem sua assinatura
Naquilo que pensamos
Seja este pensamento a da imagem de uma flor
Ou da confusão
Quando nos vir e a vemos também,
A morte, cheios de pavor,
Sem lógica de pensamento,
Como se lá no interior da construção,
Nos seus arredores
E poços de prisão
Houvesse um empurra-empurra
Para vem quem
Daqueles que habitam lá
Pudesse, no ultimo momento,
Na pupila do nosso estático olhar,
Deixar uma unhada,
Uma porrada,
Pois os pinceis nuanceantes,
Devido à inesperabilidade do que vai haver
A cada passo que damos,
Seja nas ruas da cidade,
Seja nas ruas da cabeça,
De repente, tudo é de repente,
E o de repente gera a algazarra,
E vêm todos eles e elas,
Doces e amargos
Antiguíssimo, doutras eras,
E novíssimos,
Flores e pedras,
Porretes e espumas
Cada um vem querer assinar
Já cientes
Pela ultima vez
Colocar o ultimo tijolo
De pedra ou de pão
Na construção sem fim
Que por fim vai, em fim,
Ruir e cair...
E nós?
Nós?
O eu não existe
O nós é formado por eu’s...
O ENTULHO jogam na Estrada do Arroz,
Imperatriz-Mentirão.