Velha infância
Caro amigo, minha infância foi
Mágica, carrinhos de pau, pega-pega,
Pique - esconde, vivemos intensamente.
Aprendi a respeitar os mais velhos
E a ser descente, caso não obedecesse
As orelhas ficavam quentes.
Lembro com nostalgia da velha infância
Das cantigas de roda, ciranda e
Mandrake, onde tudo era motivo
De brincadeira. Futebol com Bola de
Meia era coisa séria, Dado, Nem, Nilsão,
Cada um trazia a sua meia, enrolávamos
Tudo em uma e começava a brincadeira.
Teve um dia que assaltamos um defunto,
Suas meias cheiravam a nova, era um
Pecado elas Irem para debaixo do chão
Fechado num caixão.
Assaltávamos mangueiras, goiabeiras
E siriguela, era tudo diversão, até
Correr do cachorro e ouvir pega ladrão.
Ao chegarmos a casa o chinelo
Já estava preparado, notícia era coisa
Ligeira, era um corre-corre uma suadeira.
A cada dois anos ganhava um chinelo novo
Com ele tinha todo cuidado, no dia seguinte
Já servia de trave para o futebol campeão.
Um belo dia troquei uma camisa De algodão
Novinha que ganhei da minha avó,
Por um por gato, de quebra
Cinco bolas de gude, naquele dia senti-me
Muito esperto, no outro dia descobri
Que o bichano era cego e pulguento.
Em outro tempo queríamos ser milionários
Colhíamos limões na rua de baixo,
Uns trazia açúcar, outros bacias e copos
E todos faziam limonada, a intenção era
Comercializar o doce refresco, mas no final
De cada tarde os próprios sócios tudo bebia.
“Vá varrer o quintal” aos sábado ouvia,
A preguiça era de lascar, mesmo assim
Fui atender o mandado, logo depois chegam
Os amigos e me chamam para brincar,
Agora não posso tenho trabalho a fazer,
Minha mãe me deu um batom garoto para a
Tarefa terminar, se vocês e me ajudarem
Ele te dou. Enquanto eles trabalhavam
Na barrinha de chocolate escondido me
Lambuzava. Trabalho realizado, hora
Do pagamento. Daquele dia não me esqueço,
Não foi nada bom ser desonesto
Fiquei com o olho roxo, mas a lição aprendi,
Lá para de tardezinha já éramos
Novamente bons amigos.
Caro amigo, falta-me páginas para
Encher, com as travessuras nos finais de
Tarde onde Íamos para o rio nadar,
Outras vezes vendendo picolé na caixinha
De isopor, negociando o concerto da bola
De capotão com o velho Sú, ô sujeito
Mal encarado e enrolado, mas era
Um único artesão das redondezas.
Fabricava e concertava bolas como ninguém.
As aventuras nas ruas, beira de rio
E entulhos A procura de tampinhas de
Manteiga foi uma febre naquele tempo,
Batman, super-homem, mulher-maravilha
Que saiam nos gibis, foi antes da TV.
Teve também tampinhas de refrigerantes
Premiadas, fotos de jogadores que ouriçavam
A molecada. Como era bom ir ao cinema pra
Ver mulher pelada, o bilheteiro era subornado,
E lá dentro e o cheiro de q-boa subia.
Caro amigo, a vida mudou, hoje sou pai de
Duas pimpolhas. Tenho pena, vivem
Trancadas. A TV, Internet, jogos eletrônicos
e o escambal são diversões prediletas
A violência, drogas fazem isso com a gente
Somos dominados pelo caos.
Já não bastasse tanta aberração
Vem o governo dando pitecos
De como melhor criar nossos filhos,
Palmadas e cascudos são proibidos,
Enchendo-os de direitos. Não estou
Defendendo a violência doméstica,
Mas às vezes se faz necessário uns
Bons puxões de orelha.
A caixa de isopor foi aposentada,
Não se vê mais entregador de jornais,
Lavador de carros de araque, mensageiro,
Vendedor de cocada e limonada, o estado
Tudo proibiu como se isso fosse escravidão,
O menino hoje cresce sem noção da vida
E do que vão enfrentar lá fora.