Hábito Franciscano
Desde primeira vez que te vi,
Ainda que nos braços de outro,
Por ti, logo me apaixonei.
Não tinhas beleza,
Eras pálida e cheia de cicatrizes,
A vida com o tempo te gastou.
Mesmo assim, por ti me enamorei.
E com todas as minhas forças eu te desejei.
Fui atrás de ti...
Procurei te conquistar.
Por cinco anos, vi-te a andar com outros.
Mas, o tempo passou.
Chegou a minha vez de receber-te em meus braços.
Na iniciação de uma nova vida,
Por ti fui revestido.
Tu eras nova, cinza, da cor do chumbo e da penitência.
Tu me identificavas.
Simbolizavas a minha busca.
Sem falar com os lábios,
Testemunhavas o Reino eterno e transcendente,
Em meio a este mundo transitório e imanente.
Contigo eu me sentia um recém-casado.
Levava-te comigo para todos os lados.
As pessoas, ao me olharem contigo,
Torciam o nariz e meneavam a cabeça
E me desdenhavam e me chamavam de louco.
Mas, eu nem ligava.
Tu eras o símbolo do meu tesouro encontrado no campo.
Tu eras o sinal da posse da pérola mais preciosa do mundo.
Mas, o tempo passou...
Fui ficando velho.
Perdi a candura, a pureza e o vigor da juventude.
Tu, apesar do tempo e das cicatrizes,
Estavas cada vez mais alva, bela e irradiante.
Porém, eu cego não mais te enxergava e via.
Os jovens te desejavam;
Olhavam além de ti
E viam o que minhas pupilas não mais contemplavam.
Releguei-te a um canto escuro da minha vida,
Pois de ti me envergonhava.
Não mais queria que te vissem comigo.
Cheguei até a enrubescer,
Por ter um dia te desejado e caminhado contigo.
Tu, porém, continuas lá,
No seu canto escondida.
E sem me dizer uma palavra falas do amor de outrora;
Dos tempos de minha mocidade agraciada no deserto;
Do vigor do passado que insiste em questionar-me.
Tu, vida nova, eu, homem velho.
Vinho novo exige odres novos...