Uma Lágrima
Estar diante de um pranto,
Aquela torrente lacrimosa,
Algo que nos causa espanto,
Parecendo causa calamitosa.
Mas quando nos deparamos,
Com uma única lágrima,
Nasce na face, num canto,
Feito tristeza fragmentária.
Causa espanto ver aquela gotícula.
Miuda e tão expressiva de símbolos,
Sua solidez se apresenta bruta,
Orvalho que congela sem motivo.
E ela resiste e não cai,
Se fossem muitas não resistiriam,
Mas a só ousadamente retrai,
As enxurradas não a moveriam.
Um diamante aquoso da melancolia,
Duro por seu caráter introspecto,
Lapidado no suco lacrimal de onde surgira,
Se faz de pingo deveras seleto.
O expectador interroga-se mentalmente,
Aquele olho misterioso trouxe ao mundo,
Aquele choro que age egoisticamente,
Causando em chorosos um pensar absurdo.
Pior, ela não escorre,
Fica ali até secar na fronte,
O poro ela entope,
Não se permite ir adiante.
Se recusa brotar dos dois olhos,
É o supremo ego liquefeito,
Não se divide jamais em dois corpos,
Única, esse é seu íntimo desejo.
Sua base arredondada não se faz de estalactite,
Presa num prolongamento de si diminuto,
Reflete como pedaço de espelho em riste,
Gota que perturba, um indesejável intruso.
Nem classificam de um choro real,
Uma simulação atribuem,
Só por não ter acompanhamento lacrimal,
Sofrimentos assim diminuem?
Ela se faz muito mais misantrópica,
Recusando-se um transbordar vulgar,
Uns pretendem fazê-la bucólica,
Microcosmo que o olho vem revelar.
Uma andorinha só aqui faz inverno,
Nem o autor sabe esse enigma decifrar,
Sem razão, esse soro de gosto indigesto,
De onde vem, como está, onde amanhã estará?
Um pingo que não pinga para não se findar,
Brota na cara de um sujeito atônito,
Análogo ao que o crocodilo manifesta ao devorar,
De uma violência que não permite sinônimo.