Mártir

O cortejo avança, ganhando os primeiros degraus.

O Sol oculta suas faces douradas,

Em cúmulos encastelados,

Contrito pelo confronto covarde;

O Cadafalso agiganta-se, ao alto,

Lúgubre e ávido por sua vítima;

No primeiro patamar irreversível

Afronta o Negro Gigante

Impávido semblante descorado.

Da vida exuberante, em seu fim inevitável;

Da morte, em implacável espera,

Antagônicos sentimentos acirrados

Ao sabor da inquieta hoste:

Aproxima-se a última hora!

O mártir, silente, olhos fulgurantes,

Passeia os pensamentos, em frações menores,

Sobre a multidão esfaimada de emoções:

Gritos, impropérios...

O mártir está só!

O Cadafalso abre seus braços odientos

A receber o dócil cordeiro;

A Turba, em frêmitos aviltantes,

É um mar encapelado, a sorver o nobre destino.

Último adeus!

Onde os sectários dos mesmos ideais?

Emudece a voz, sem os ecos da constância.

Última hora!

O cordame úmido fecha suas garras

Sufocando pranto, silêncio e dor:

Tomba o Monumento, sem a solidez da esperança.

O Negro gigante, saciado em obscura vindita

Adormece em silêncio de nova espera;

A Noite, caindo o cair da licença

Tinge o cenário com a cor da monotonia;

O mártir, de despojos ignorados,

Lança-se ao rol dos esquecidos.

Uma pequenina gota do sangue heroico,

Em discreto saltitar,

Lançara-se, porém, à relva úmida.

O Tempo apagou os vestígios do holocausto

Somente não apagou a semente

Que, brotando a seu tempo,

Desfraldou ao Celeste Observador

O verde emblema da vitória!

(A todos os mártires, de todos os tempos)